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05/05/2008 - 09h00

"Queremos que José Saramago assista ao filme no dia 13 de maio", diz Fernando Meirelles

ALESSANDRO GIANNINI

Editor de UOL Cinema
Depois de muita especulação, notícias desencontradas e pressões veladas de todos os lados, na terça (30) confirmou-se o que o UOL Cinema antecipou na madrugada daquele mesmo dia: "Ensaio Sobre a Cegueira" vai abrir o 61º Festival de Cannes, no dia 14 de maio.

Folha
Julianne Moore e Alice Braga participam de filmagens de ''Ensaio Sobre a Cegueira'' no centro de SP
TRAILER DO FILME
FILMAGENS EM SÃO PAULO
MEIRELLES ABRE 61º FESTIVAL DE CANNES
BASTIDORES DO FILME
PARTICIPANTES DE CANNES
Meirelles sabia da notícia desde o sábado (26), mas por conta de um rigoroso embargo na divulgação de informações pelos concorrentes, não podia dizer nada enquanto a organização do festival não desse sinal verde. Isso aconteceu na tarde daquele dia.

As respostas a seguir foram enviadas por e-mail por Meirelles, que as respondeu em duas ocasiões: na terça mesmo, enquanto estava na sala de mixagem, e na sexta-feira (2), pouco antes de viajar para um merecido descanso antes da pedreira de Cannes. As respostas foram editadas para melhor compreensão do internauta.


Antes de a seleção oficial do Festival de Cannes ser anunciada, "Ensaio Sobre a Cegueira" era cotado como certo, enquanto "Linha de Passe", do Walter Salles, era apontado como dúvida. No anúncio, as expectativas foram invertidas. O que aconteceu?

Há quinze dias, houve um convite para o "Ensaio Sobre a Cegueira" abrir o Festival, mas para a minha surpresa o nosso distribuidor francês [Pathé] não aceitou. Ele achava que o filme deveria estar na competição, só que em Cannes, em geral, os filmes de abertura não competem. Instalou-se, assim, um impasse. O anúncio oficial não incluía nem "Ensaio Sobre a Cegueira" e nem o filme de abertura. O nó não se desfez. Finalmente, no sábado [26], foi aberta uma exceção e exibiremos o filme na abertura do festival e em competição.

Qual a importância de estar em Cannes com um filme multinacional ao lado de outro brasileiro, o Walter Salles, com um filme, "Linha de Passe" que tem uma cara mais nossa? Isso faz alguma diferença para você, já que muitos veículos e jornalistas tendem a comparar o trabalho e a carreira de vocês dois?

O Walter [Salles] e a Daniela Thomas são bons amigos e estou bem feliz de poder ir assistir "Linha de Passe" em sua première mundial. (...)Acho que dois filmes brasileiros em competição fazem um bom barulho e [isso] é bom para nosso cinema. Quanto a ser comparado com o Walter, só levanta a minha bola.

Houve muitas especulações sobre uma cena de estupro, que teria resultado na saída de quarenta pessoas da primeira sessão teste de "Ensaio Sobre a Cegueira". Confere? As mudanças que fez no filme de lá para cá foram no sentido de conferir mais agilidade ou de amenizar a violência para atingir a um público mais amplo?

Na verdade, não houve especulações. Eu mesmo contei isso no blog que escrevi sobre o filme. Como desde a filmagem vamos resolvendo as cenas de uma forma técnica e nos acostumando com elas, só quando vi 10% do público da primeira projeção se levantar e sair durante as cenas de estupro é que me caiu a ficha de que talvez tivesse passado do ponto. Fora este ajuste, o Daniel Rezende, montador, e eu, fizemos mais umas duas mil mudanças de lá para cá. Foram onze versões de montagem, até chegar ao que vai ser exibido. Acerto de ritmo entrou neste pacote também, claro. Acho que este é um processo normal, ao menos para mim, que adoro montagem.

Você disse em várias entrevistas que a disputa sobre a seleção ou não de "Ensaio Sobre a Cegueira" para o Festival de Cannes recaía sobre o fato de o filme abrir e ser concorrente. Foi só isso, realmente?

Até antes de nos convidarem, que eu saiba, seria o "Indiana Jones" que abriria o festival. Depois que a Pathé [distribuidora francesa de "Ensaio Sobre a Cegueira"] recusou o convite [para ser o filme de abertura], li em algum lugar que o filme do Woody Allen abriria e, depois, a cada dia, era uma notícia diferente. O convite para abrir e concorrer ao mesmo tempo nos pegou de surpresa.

"Ensaio Sobre a Cegueira" é um filme de muita pós-produção, justamente por causa do componente da tal cegueira branca, provocada pelo vírus que se espalha pelo mundo. Quem assistir ao filme em Cannes vai vê-lo pronto e acabado?

Pronto, acabado, sacramentado e tirado da minha frente! Acabamos a mixagem ontem [quinta, dia 1º]. Ninguém mexe em mais nada, se Deus quiser.

José Saramago foi quem alertou o produtor canadense que a adaptação deveria ser feita o quanto antes, já que o escritor estava com 80 anos. Ele assistiu a alguma dessas versões?

Estamos tentando levá-lo para Cannes no dia 13 para mostrar o filme pela primeira vez sem ter um grande público junto. Ele nunca viu nada. Estou ansioso para burro com essa projeção. Infelizmente, ele vai ter que assistir com legendas em francês, mas ele domina tanto o francês quanto o português. Pensando bem, talvez isso seja bom. Ver algumas de suas frases traduzidas para o inglês e voltadas para o português poderia não agradá-lo.

Você esteve entre os finalistas do Oscar e concorreu à Palma de Ouro. Não levou nenhum dos dois, mas esteve muito perto disso. Os dois prêmios têm importância e um significado maior para você, pessoalmente? Ou, como muitos diretores e cineastas, apenas se importa em fazer os filmes, os prêmios são conseqüência?

Com "Cidade de Deus", apesar de termos ficado na seleção oficial, não concorremos ao prêmio, entre outros motivos pelo fato de o amigo Walter Salles, co-produtor do filme, ter feito parte do júri naquele ano. Mas ali foi ótimo ter ficado fora da artilharia. Cannes ou Academia trazem vantagens diferentes. Prestígio ou cachês mais altos? Essa é a escolha. Mesmo assim, para ser honesto, preferia mil vezes que não existissem competições com filmes. É uma coisa tão subjetiva apontar um melhor. Bastaria uma seleção dos bons filmes do ano e pronto. Mas "nego" tem obsessão por ser o "primeiro" e fazer cinema parecer corrida de cavalo. Fazer o quê?

Você, como vários outros diretores, tem vários projetos em andamento. O que pretende fazer depois que a poeira baixar?

Começo a rodar dia 7 de julho uma minissérie para TV chamada "Som e Fúria". Mesmo com a poeira ao redor. É um projeto da O2 Filmes e estou dividindo a direção com cinco amigos. Projeto de turma.