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Festival de Cannes 2010

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18/05/2010 - 14h17

"Moradores da favela têm chance de construir sua identidade no cinema", diz Cacá Diegues sobre "Cinco Vezes Favela"

THIAGO STIVALETTI
Colaboração para o UOL, de Cannes
  • O diretor e produtor brasileiro Cacá Diegues

    O diretor e produtor brasileiro Cacá Diegues

Hoje foi dia de cinema brasileiro no Festival de Cannes. A sessão de imprensa de “Cinco Vezes Favela – Por Nós Mesmos”, exibido fora de competição, não atraiu muita atenção dos jornalistas estrangeiros - teve menos da metade da sala ocupada. O filme reúne cinco curtas-metragens realizados por moradores de favelas no Rio, selecionados a partir de oficinas de cinema ministradas a partir de 2007.

Num ato generoso, Cacá Diegues, idealizador e produtor do filme, não participou da roda de entrevistas com os diretores. Como no filme, deixou-os defenderem seus filmes. Mais tarde, comparou o filme com o “Cinco Vezes Favela” original (1962), que tinha curtas dele e Joaquim Pedro de Andrade, entre outros.

“Entre um filme e outro, há quase 50 anos. Muita coisa mudou: o mundo, o Brasil, o cinema e a própria favela. Nosso primeiro filme era um projeto generoso, antenado, mas feito por jovens de classe média. Este novo é uma visão de dentro, em que esses diretores tentam construir sua própria identidade”, explicou. Para isso, seu desafio foi dar a eles “as mesmas condições de produção que eu tenho para fazer meus filmes”.

Apesar de uma certa ingenuidade no jogo dos atores, os curtas trazem às tona questões vistas ou vividas pelos diretores: o jovem padeiro que passa na faculdade de Direito, não tem dinheiro nem para comprar os livros e é tentado a vender drogas para os colegas (“Fonte de Renda”, de Manaíra Carneiro, da comunidade de Heliópolis, e Wagner Novais, de Taquara); o menino que se vira para comprar um frango de presente de aniversário ao pai (“Arroz com Feijão”, de Rodrigo Felha, de Cidade de Deus, e Cacau Amaral, de Caxias); os amigos que vivem a infância juntos e passam para lados diferentes da lei, um traficante e outro policial (“Concerto para Violino”, de Luciano Vidigal, do Vidigal); a rivalidade entre quadrilhas de morros vizinhos (“Deixa Voar”, de Cadu Barcelos, do “Complexo da Maré”); a falta de luz na favela, que paralisa todas as atividades na comunidade (“Acende a Luz”, de Luciana Bezerra, do Vidigal).

“Como todo mundo está cansado de ver favela no cinema, eu quis humanizar os estereótipos que ainda existem sobre os moradores. Há um conflito entre os amigos, mas não um conflito de classes, não é uma história de ódio”, diz Luciano Vidigal, que atuou em filmes de Cacá Diegues como “Orfeu” e “Veja Esta Canção”. “Já vivi situações como ser obrigado a dar calote no ônibus. Mas meu personagem não podia ser depreciativo. Não é um cara de baixa autoestima, é um rapaz inteligente que não perde sua originalidade”, diz Wagner Novais sobre o personagem do padeiro que entra na faculdade.

Os jovens trocaram entre si experiências, atores e até locações entre suas favelas. Barcellos, morador do Complexo da Maré, precisava de um morro mais plano como locação e optou por filmar em Cidade de Deus. “É importante dizer que não somos só intuitivos, chegamos lá e fizemos o filme. A gente estuda, lê, vê filme, se prepara”, diz Novais.

“Cinco Vezes Favela” tem uma linguagem por vezes ingênua – afinal, seus diretores ainda são iniciantes. Ainda que o espectador brasileiro já esteja um pouco cansado dos filmes de favela e prefira outras temáticas, o projeto tem o mérito mais que louvável de trazer esse olhar de dentro, para além da visão de diretores de classe alta como Fernando Meirelles, Walter Salles e Bruno Barreto.

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