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Mostra sobre Othon Bastos em Brasília exibe o raro "Sol sobre a Lama", de Alex Viany

O ator Othon Bastos em "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (1964), filme do diretor Glauber Rocha - Divulgação
O ator Othon Bastos em "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (1964), filme do diretor Glauber Rocha Imagem: Divulgação

NEUSA BARBOSA

Do Cineweb

01/02/2011 10h00

Um capítulo importante - ou vários - do cinema brasileiro estão guardados na memória de Othon Bastos. O ator baiano, de 77 anos, que atuou em mais de 40 longas, imprimiu sua marca a diversos clássicos nacionais, como o Corisco de "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (1964), de Glauber Rocha, o Homem de "Os Deuses e os Mortos" (1970), de Ruy Guerra, o fazendeiro Paulo Honório de "São Bernardo"(1972), de Leon Hirszman, o padre Antônio Vieira de "Os Sermões" (1989), de Julio Bressane.

Estes quatro títulos e outros nove fazem parte de uma retrospectiva que o Centro Cultural do Banco do Brasil em Brasília realiza da obra do ator, a partir desta terça (1°), intitulada "O Cinema de Othon Bastos", com curadoria de Davi Kolb. O próprio Othon participa, já na noite de abertura, de um debate no CCBB, ao lado do curador e do cineasta Vladimir Carvalho. A mostra estende-se até 13 de fevereiro.

Integram a retrospectiva verdadeiras raridades, como a estreia do ator em cinema, "Sol sobre a Lama" (1963), de Alex Viany - o único título que será projetado em DVD, no sábado (5) e na quinta (10), devido à precária qualidade da cópia em película existente.

Falando por telefone ao UOL Cinema, o ator relembra: "Foi o primeiro filme que fiz na vida. A filha do Alex (Viany) me arrumou uma cópia em DVD, fiquei até emocionado. Eu estreei no cinema fazendo um chofer de caminhão, quando eu nem sabia sentar no banco. Eram 20 pessoas da pesada empurrando o caminhão para eu dirigir. Numa cena, eu tinha que jogar o caminhão em cima de alguns passantes. Mas quem estava ao volante era o dono do caminhão, senão eu teria matado todo mundo (risos)".

Quarenta e cinco anos depois do filme de Viany, curiosamente, Othon repetiu o papel de caminhoneiro em "Central do Brasil" (98), de Walter Salles - outro título integrante da mostra do CCBB. "Mas aí eu já sabia dirigir o caminhão", esclarece.

  • Divulgação

    Os atores Othon Bastos e Isabel Ribeiro em cena de "São Bernardo" (1971), de Leon Hirszman

O "Quarteto de Alexandria"

Falando de quatro filmes da mostra do CCBB, "São Bernardo", "Deus e o Diabo na Terra do Sol", "Os Sermões" e "Os Deuses e os Mortos", o ator define-os como o seu "Quarteto de Alexandria" - uma alusão ao clássico da literatura de Lawrence Durrell, publicado nos anos 60 do século 20.

O ator explica a preferência: "Evidentemente, fiz outros filmes ótimos, mas falo desses porque me enchem os olhos. Como ator, bebi dessas fontes e me preparei para as outras. Depois deles, podia ficar 40 dias em jejum no deserto".

Em seguida, Othon especifica melhor a predileção: "Deus e o Diabo na Terra do Sol", segundo ele, "foi a primeira vez que se fez um estudo brechtiano no cinema". Na época, Othon - que não foi a primeira escolha para Corisco, e sim Adriano Lisboa, que acabou atuando em "O Crime do Sacopan", de Roberto Pires - fazia teatro. E era justamente uma experiência baseada em Bertolt Brecht que ele conduzia no grupo Teatro dos Novos, na Bahia. Quando Lisboa saiu do elenco de "Deus e o Diabo...", Glauber foi buscar Othon, que o diretor já conhecia.

No roteiro, como lembra Othon, havia um flashback do cangaceiro Corisco, seu personagem. Então Othon fez sua sugestão brechtiana: "Por que não fazer Corisco narrando a própria história e não um flashback?". Glauber aceitou, o que merece elogios do intérprete ainda hoje: "Glauber, que na época tinha seus 22, 23 anos, e fazia seu primeiro grande filme, teve a coragem e a generosidade de aceitar essa experiência".

Da mesma forma, o primeiro ator escalado para atuar em "Os Deuses e os Mortos" por Ruy Guerra era Walmor Chagas. Na véspera da filmagem, contraiu hepatite.

O produtor, o também ator Paulo José, procurou Othon, que na época atuava na novela "Super Plá", escrita por Bráulio Pedroso. Othon e Paulo José foram falar com ele. O autor não só aconselhou vivamente o ator a aceitar o convite como logo se dispôs a escrever uma cena em que o personagem de Othon na novela viajava para um congresso. "Era a primeira vez que trabalhava com Ruy, um diretor ótimo,que é ator também e deixa você livre", comenta.

Já "Os Sermões", lembra Othon, foi filmado em 15 dias. E o diretor Julio Bressane, para ele, "é o mais cult de todos".  O ator menciona que os irmãos Haroldo e Augusto de Campos "iam ao set discutir Antônio Vieira com a gente. Você ia se preenchendo daquela cultura toda".

Leon Hirszman, diretor de "São Bernardo", segundo Othon, "ensaiava muito". E prossegue: "O roteiro era o próprio livro (de Graciliano Ramos). Depois do jantar, o Leon reunia as pessoas para discutir as sequências que ia filmar no outro dia. No dia seguinte, ensaiávamos quatro horas. A gente não podia errar. Não havia dinheiro, nem filme. Era uma lata de filme para cada sequência. E tínhamos que aproveitar a luz, o sol, tinha que ser naquele momento".

Comparando os diretores, Othon define: "Leon (Hirszman) era a própria razão, tudo era muito bem pensado. O Glauber (Rocha) era o contrário, era o vulcão. O Ruy (Guerra) é uma mistura dos dois, ele adora uma improvisação (risos)".

Novos filmes

Mas nem só do passado vive o ator, muito ativo no cinema. Ele acaba de filmar "Heleno", ficção sobre o jogador Heleno de Freitas, de José Henrique Fonseca, contracenando novamente com Rodrigo Santoro, com quem não atuava há 10 anos, desde "Bicho de Sete Cabeças", de Laís Bodanzky (que também integra a mostra do CCBB).

  • Divulgação

    Cássia Kiss e Othon Bastos em cena do filme "Bicho de Sete Cabeças", de Laís Bodanzky

Torcedor do Botafogo "desde 1948", como faz questão de frisar, Othon viu o verdadeiro Heleno jogar. No filme, interpreta Carlito Rocha, diretor do clube que foi amigo do jogador.

O ator também finalizou o drama "Ponto Final", do diretor Marcelo Taranto. E tem ainda dois novos convites: um, para fazer Giovanni Improtta, num filme dirigido por José Wilker baseado no personagem da novela "Senhora do Destino"; e também "Coleção Invisível", estreia na ficção de Bernard Attal, baseado num conto de Stefan Zweig.

"Meu personagem aqui é extraordinário: um coronel do cacau que adorava arte, colecionava quadros, e fica cego. Mas todas as pinturas de que ele gostava estão na cabeça dele", antecipa.

O CINEMA DE OTHON BASTOS
Quando: de 1º a 13 de fevereiro de 2011. Sessões às 16h, 18h30 e 20h30
Onde: Cinema do Centro Cultural do Banco do Brasil Brasília
Quanto: R$ 4,00 e R$ 2,00
Informações: (61) 3310-7087 ou no site oficial

PROGRAMAÇÃO

Terça, 1º/02
16h - Brasília 18% - 102'
18h30 - O Engenho de Zé Lins - 80'
20h00 - DEBATE - com a presença de Othon Bastos, do cineasta Vladimir Carvalho e do curador Davi Kolb

Quarta, 02/02
16h - Policarpo Quaresma, Herói do Brasil - 123'
18h30 - Capitu - 105'
20h30 - Bicho de Sete Cabeças - 74'

Quinta, 03/02
16h - Os Deuses e os Mortos - 97'
18h30 - Os Sermões - 78'
20h30 - O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro - 100'

Sexta, 04/02
16h - Mauá, o Imperador e o Rei - 135'
18h30 - São Bernardo - 113'
20h30 - Deus e o Diabo na Terra do Sol - 125'

Sábado, 05/02
16h - Sol sobre a Lama - 90' (exibição em DVD)
18h30 - Bicho de Sete Cabeças - 74'
20h30 - Central do Brasil - 113'

Domingo, 06/02
16h - Policarpo Quaresma, Herói do Brasil - 123'
18h30 - Capitu - 105'
20h30 - Os Deuses e os Mortos - 97'

Terça, 08/02
16h - Mauá, o Imperador e o Rei - 135'
18h30 - Brasília 18% - 102'
20h30 - Os Sermões - 78'

Quarta, 09/02
16h - Central do Brasil - 113'
18h30 - O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro - 100'
20h30 - Deus e o Diabo na Terra do Sol - 125'

Quinta, 10/02
16h - Capitu - 105'
18h30 - O Engenho de Zé Lins - 80'
20h30 - Sol sobre a Lama - 90'(exibição em DVD)

Sexta, 11/02
16h - Os Deuses e os Mortos - 97'
18h30 - Brasília 18% - 102'
20h30 - Policarpo Quaresma, Herói do Brasil - 123'

Sábado, 12/02
16h - Bicho de Sete Cabeças - 74'
18h30 - Deus e o Diabo na Terra do Sol - 125'
20h30 - São Bernardo - 113'

Domingo, 13/02
16h - Os Sermões - 78'
18h30 - Central do Brasil - 113'
20h30 - Mauá, o Imperador e o Rei - 135'