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Cine PE ocupa buraco deixado pelo cancelamento do Festival de Paulínia

João Miguel e Dira Paes em cena do filme "A Beira do Caminho" (2012) - Divulgação
João Miguel e Dira Paes em cena do filme "A Beira do Caminho" (2012) Imagem: Divulgação

Sérgio Alpendre

Do UOL, em São Paulo

26/04/2012 07h00

Começa nesta quinta-feira (26), em Recife, a 16ª edição do CinePE - Festival do Audiovisual, evento que deve esquentar ainda mais a capital pernambucana.

O CinePE é um dos festivais que, como o de Brasília, estão um degrau abaixo da frivolidade dos tapetes vermelhos, representada principalmente pelo suspendido Festival de Paulínia e pelo tradicional Festival de Gramado.

Se nos últimos anos sua programação deixou a desejar, talvez pelo excesso de festivais no calendário brasileiro, e pela falta de filmes que supram esses festivais com um mínimo de qualidade, neste ano a seleção se beneficiou da indefinição que acometeu Paulínia desde o começo do ano, culminando com sua suspensão oficial agora em abril.

Pelo menos dois dos longas em competição eram talhados para o evento do interior paulista: "À Beira do Caminho", de Breno Silveira, que será o filme de abertura, e "Paraísos Artificiais", de Marcos Prado. Claro que entramos aqui no terreno perigoso da especulação. Afinal, não temos bola de cristal para saber o que estaria em Paulínia caso o festival existisse neste ano. Mas é o que podemos supor pelas programações dos dois festivais em suas últimas edições.

Os dois longas acima refletem mais um desejo de cinema industrial, algo normalmente abraçado por Paulínia e sua estrutura exagerada. Breno Silveira tenta se recuperar do fiasco com "Era Uma Vez", filme que sucedeu o popular "Dois Filhos de Francisco". Já Marcos Prado vem de produzir o vitorioso "Tropa de Elite 2 - O Inimigo Agora é Outro" para dirigir seu primeiro longa de ficção, após o badalado documentário "Estamira".

Dos sete longas-metragens que irão competir pelo prêmio principal, dois outros pertencem a uma vertente que revela um desejo autoral: os pernambucanos "Estradeiros", de Sérgio Oliveira e Renata Pinheiro; e "Na Quadrada das Águas Perdidas", de Wagner Miranda e Marcos Carvalho.

É sintomático, aliás, que dois filmes pernambucanos estejam na competição deste ano, já que os filmes do estado eram quase ausentes nos anos anteriores, possivelmente por questões de gosto pessoal da curadoria. Não há nada errado com isso, mas não deixa de ser curiosa a seleção justamente neste ano em que um festival de peso foi limado do circuito.

"Estradeiros" já passou pela Mostra de Tiradentes, onde foi elogiado pelos jornalistas que cobriam o evento. O casal que assina esse longa vem do ótimo e premiadíssimo curta "Praça Walt Disney" (que por sinal ficou fora da competição do CinePE de 2011), o que garante no mínimo o interesse de quem acompanha o progresso desses diretores.

"Na Quadrada das Águas Perdidas" mostra Matheus Nachtergaele em uma "odisseia" (palavra que está no release) pela caatinga nordestina. O que podemos esperar de tal premissa é um mistério que só será elucidado durante o festival. Ou não. Seja como for, é uma aposta arriscada, e por isso mesmo interessante.

A competição de longas ainda reserva algumas obras esperadas. Flávio Frederico leva seu "Boca", sobre o bandido Hiroito que atuava na famosa Boca do Lixo paulistana nos anos 1950 e 60. É um diretor que ainda não acertou em cheio, mas já demonstrou potencial para tanto.

Será exibido também o documentário "Jorge Mautner - O Filho do Holocausto", de Pedro Bial e Heitor D'Alincourt, sobre o músico e poeta carioca que sempre esteve longe de ser uma unanimidade. O espectador pode lembrar de Bial só pelo Big Brother Brasil, mas ele já realizou dois filmes interessantes, "Outras Histórias" e "Os Nomes de Rosa". Agora aposta no prolífico filão dos documentários musicais. Veremos como se saiu na empreitada.

Completa a seleção de longas em competição a incógnita "Corda Bamba, História de uma Menina Equilibrista", filme sobre uma menina que nasceu no circo, dirigido por Eduardo Goldenstein. Filmes sobre circo costumam conjugar singeleza com sorrisos de aprovação. Não sabemos se é o caso aqui, mas a ambientação faz boa parte do interesse.

O CinePE ainda presta homenagem a três nomes do cinema brasileiro. Os irregulares cineastas Carlos Diegues e Fernando Meirelles (este, na verdade, está sendo homenageado mais como produtor), e o ótimo ator Ney Latorraca. Diegues até que tem uns bons filmes no currículo ("A Grande Cidade", "Joana Francesa", "Bye Bye Brasil" e sobretudo "Chuvas de Verão"), mas o festival preferiu homenageá-lo com um dos inúmeros longas problemáticos que realizou, o insosso "Xica da Silva", que apesar de contar com a sublime Zezé Mota no papel principal, é um filme histórico pesado e enfadonho.

Meirelles é homenageado com o recentíssimo "Xingu", que está em cartaz em diversas capitais do Brasil. Não se sabe porque não há sinal de sequer um filme em homenagem a Latorraca. Talvez ainda pinte algum de última hora. Poderiam passar o ótimo "O Gerente", do recém-falecido Paulo Cezar Saraceni. Caso isso não aconteça, perderão uma bela oportunidade de abrilhantar a programação.