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De segundo escalão a astro universal, conheça o caminho do Homem de Ferro para o estrelato

Roberto Sadovski

Do UOL, em São Paulo

22/04/2013 12h00

"Tony Stark tira onda que é cientista espacial". Por muito tempo, Tony Stark só fez isso: tirou onda. Criado por Stan Lee, Don Heck, Larry Lieber e Jack Kirby em 1963, Stark --ou melhor, o Homem de Ferro-- surgiu como uma mistura de James Bond com Leonardo Da Vinci. O playboy irredimível de mente brilhante --que viu o fruto de seu trabalho para os militares se voltar contra ele mesmo-- volta em sua terceira aventura, que estreia na próxima sexta-feira (26) com Robert Downey Jr. no papel principal.

Como parte da enxurrada criativa dos primeiros anos da Marvel (que também trouxe o Quarteto Fantástico, Hulk, X-Men e Homem-Aranha), o personagem também tinha uma origem trágica e uma fraqueza que o humanizava. No caso, um estilhaço de granada perto de seu coração, que obrigou Stark a passar a vida em sua armadura metálica. Ainda assim, o Homem de Ferro nunca esteve no primeiro time da Marvel.

No começo as estrelas eram o Quarteto Fantástico e o Homem-Aranha; com o tempo, os X-Men tomaram os leitores de assalto. A decepção com o "american way of life" pós-Vietnã dos anos 60 e 70 se tornou um certo cinismo na década seguinte. Personagens mais sombrios, como Wolverine e o Justiceiro, ganharam espaço, e o "bem contra o mal" ganhou outras nuances nas páginas da Marvel, criando uma enorme área cinzenta.

O "homem comum" cada vez mais era o protagonista --seja no eternamente azarado Homem-Aranha, no caos urbano do Demolidor, nos conflitos familiares do Quarteto Fantástico ou no subtexto racial dos X-Men. Enquanto isso, Tony Stark continuava associado à sanha militar ianque, mesmo que sua criação tenha sido uma resposta explícita ao intervencionismo dos EUA em países estrangeiros. Um dos clichês dos criadores de quadrinhos, por sinal, é: "se seu personagem não funciona, coloque-o em uma armadura".

E o Homem de Ferro estava longe de ser uma criação medíocre. No fim dos anos 70, a dupla criativa Bob Layton e David Michelinie encontrou o tom perfeito para dar mais profundidade ao personagem. Tony Stark foi relevado como alcoólico, ganhou uma galeria de coadjuvantes complexos e abriu uma discussão sem precedentes nos quadrinhos. Mas os aplausos nunca se traduziram em explosões de venda, e o Homem de Ferro não alcançou o patamar icônico que o Demolidor de Frank Miller, ou os X-Men de Chris Claremont e John Byrne. Por algum motivo, Tony Stark, gênio, playboy e super-herói, transmitia uma certa arrogância, uma barreira que afastava o herói.


Crise das HQs, heróis reinventados
A primeira medida drástica para mudar este status foi remover Stark da equação. Por um período, seu amigo, o piloto James Rhodes, passou a usar a armadura do Homem de Ferro. A volta de Stark marcou outra trama bacana, que escalou para uma cruzada pessoal e o levou a destruir cada pedaço de sua tecnologia roubada. A "Guerra das Armaduras" foi um sopro de criatividade e os fãs prestaram atenção. Mas daí chegaram os anos 90, e os quadrinhos americanos entraram em crise.

Foi uma época em que a forma era mais importante que a substância, e que a corrida para encontrar o novo desenhista superstar deixou marcas negativas em toda a indústria. O Homem-Aranha enfrentou seu clone em uma saga equivocada; os X-Men, espalhados em dezenas de equipes, perderam o rumo. E o Homem de Ferro, que então trocava de armaduras como quem troca de meias, encontrou-se na trama mais absurda, quando foi substituído por uma versão adolescente de si mesmo.

Na segunda metade dos anos 90, com a crise descansando e os heróis reinventados para a chegada do milênio, o Homem de Ferro ganhou peso --ao lado do Capitão América, Quarteto Fantástico e Os Vingadores-- quando a Marvel depositou confiança mais uma vez em seus artistas, e não em executivos. A idéia de levar com sucesso seus personagens para outras mídias teve uma ótima resposta com as animações dos X-Men e do Homem-Aranha. O cinema parecia a fronteira definitiva, mas nem de longe havia a tecnologia para dar vida ao Homem de Ferro.

E a Marvel acertou em cheio. Em parceria com estúdios consagrados, primeiro colocou X-Men nos cinemas (em 2000); depois, o Homem-Aranha (em 2002). Começou, então, uma ciranda para traduzir heróis de papel em personagens de carne e osso, de forma que a platéia do cinema pudesse ser apresentada a eles, sem que suas características dos quadrinhos fossem perdidas. Na segunda metade dos anos 2000, quando a Marvel finalmente conseguiu independência financeira para tocar seus projetos com total controle, o Homem de Ferro foi escolhido para ser o primeiro. Mas não por sua relevância.

Robert Downey Jr como salvador do herói
Os maiores personagens da editora, como o Homem-Aranha e os X-Men, estavam atrelados a outros estúdios e, cinematograficamente, não pertencem à Marvel. Interpretar visualmete a armadura do herói para o "mundo real" era outro desafio, mas quando o artista Adi Granov redesenhou a armadura de forma realista na série "Extremis", de Warren Ellis, o penúltimo pedaço do quebra-cabeças foi encontrado. O último, claro, foi a jogada de mestre em escalar Robert Downey Jr. para interpretar Tony Stark no filme que chegou aos cinemas em 2008. E aí, Stark parou de tirar onda...

"Homem de Ferro", dirigido por Jon Favreau, foi um sucesso retumbante. Em uma década de filmes da Marvel no cinema, sua bilheteria só encontrou paralelo na trilogia "Homem-Aranha" conduzida por Sam Raimi. O efeito nos quadrinhos foi imediato: nas sagas modernas da Marvel, o Homem de Ferro passou a tomar o centro do palco, e a personalidade de Stark abraçou a mesma arrogância que afastara o leitor em primeiro lugar --associado à figura de Downey, agora esse traço de sua personalidade era não só charme, mas também motor de sua interação com os outros personagens do universo Marvel.

O mesmo vale para o cinema. Com o plano ambicioso da Marvel em unir seus heróis em uma cronologia coesa, Tony Stark/Robert Downey Jr. serviu como cola para ancorar a atençào do público e conduzí-lo a este mundo novo. "O Incrível Hulk", "Thor" e "Capitão América: O Primeiro Vingador" --mais um segundo filme-solo-- pavimentaram o caminho para "Os Vingadores". Mesmo sendo uma aventura equilibrada com toda a equipe, é Tony Stark quem amarra a trama e quem experimenta suas primeiras consequências em "Homem de Ferro 3". A jornada do herói, na teoria e na prática, está completa.