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Ney Matogrosso diz que sentiu falta de ser mais exposto no filme "Olho Nu"

Carlos Minuano

Do UOL, em Manaus

08/11/2013 06h30

"Tinha desejo sexual pela plateia, queria transar com aquela gente toda". A declaração apimentada é uma entre várias outras presentes em "Olho Nu", documentário que desnuda o artista multifacetário Ney Matogrosso, um dos ícones mais irreverentes da música brasileira. O filme de Joel Pizzini, coprodução do Canal Brasil e Paloma Filmes, foi a principal atração do 10º Amazonas Film Festival, em Manaus.

O ator e cantor de 72 anos acompanhou a exibição no evento, recebeu aplausos em cena aberta e foi ovacionado ao final da sessão. "É uma fatia da minha história e do meu pensamento", definiu Ney Matogrosso ao UOL. O longa chegará aos cinemas no início de 2014 e vai virar uma série que deve ir ao ar, também, no ano próximo ano, pelo Canal Brasil.

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"Olho Nu" é uma evocação poética ao universo e da arte de Ney: são fragmentos selecionados em 300 horas de material em formatos diversos --16 mm, Super 8, Betamax--, guardados pelo artista, que gravava tudo o que fazia para a televisão. Do acervo pessoal surgiram registros raros, entre eles Ney se maquiando antes de ir ao palco com o Secos e Molhados na década de 1970, e uma entrevista concedida ao ator, comediante e cantor Grande Otelo.

40 anos de estrada

Ney comemora 40 anos de estrada e o trabalho mais recente, o show "Atento aos Sinais", chega em CD ao mercado em meados de novembro. E o cantor ainda quer renovação. "Sou outra pessoa. Não tenho mais ímpeto de transformar as coisas, mas ainda tenho vontade de transgredir. O mundo está cada vez mais 'careta', impossível eu me adequar a isso".

Outras 200 horas foram produzidas especialmente para o longa, com gravações realizadas no Rio de Janeiro, parte delas no sítio do artista em Saquarema, outra em sua residência no Leblon, e em Bela Vista, no Mato Grosso do Sul, onde nasceu em 1941. O filme extrapola seu personagem principal, que se entrelaça a períodos marcantes da história politica e cultural brasileira, como a bossa nova, o tropicalismo, a luta contra a censura e o movimento popular Diretas Já, que teve expressiva participação da classe artística entre 1983 e 1984.

A ideia de digitalizar o acervo, segundo Ney, foi do amigo e parceiro de longa data Paulo Mendonça, diretor do Canal Brasil e autor de canções do Secos e Molhados, como "Sangue Latino", "Medo Mulato" e "O Doce e o Amargo". Da ideia inicial até o filme pronto, foram cinco anos de trabalho. "Quando começamos a digitalizar esse material, ainda antes de ter a ideia de fazer o filme, me deparei com a vida de Ney e sua incrível coerência. É como se ele tivesse dado sempre uma única entrevista", observou Paulo Mendonça.

Em tempos de acaloradas discussões sobre biografias não autorizadas, Ney ressaltou que não vetou nada no filme e se declara a favor de que as biografias sejam liberadas. Entretanto, defendeu que, quando visar lucro, o biografado deve ser remunerado. E reforçou ainda que direitos precisam ser garantidos. "Se eu me sentir ofendido, que a Justiça seja célere".

Para Ney, tanto a mídia quanto o público pegaram pesado com os artistas do grupo Procure Saber (entre eles Caetano Veloso, Gilberto Gil e Chico Buarque), contrário às biografias não autorizadas, e que acabam de sofrer uma baixa de peso: Roberto Carlos, um dos pilares da discussão, optou por abandonar a aliança de artistas que pleiteavam a permanência da legislação atual, que ampara a autorização prévia.

"Na internet todo mundo se acha com direito de julgar, então caíram de pau, matando mesmo. Mas não é uma democracia, c******? Todo mundo tem que ter direito à sua opinião", enfatizou.

Trailer de "Olho Nu"

LSD, Cazuza e Santo Daime
Em "Olho Nu", Ney garantiu que não teve restrições e disse que até sentiu falta de ter sido mais exposto no filme. Seu próprio relato das experiências com drogas foi uma das ausências sentidas pelo artista. "Acho que o Joel quis limpar a minha barra, mas não há necessidade disso. Nunca escondi, sempre transitei com muita liberdade pela vida", disse. A droga em questão é o LSD, e o documentário esconde a afirmação dele de que foi uma experiência positiva. "Não tomava isso para ficar doido e dançar em boate. Eu ia para Búzios, vestia roupa branca, é outra situação. Era uma busca. Hoje em dia não é isso".

O trecho sobre o alucinógeno aparece no filme com três vozes sobrepostas, o que dificulta o entendimento. Segundo o diretor, foi um recurso sonoro utilizado com o objetivo de contextualizar o tema com pegada psicodélica. De ato, "Olho Nu" não se restringe ao formato de cinebiografia. É um filme-ensaio, um autorretrato em que o artista visita a si mesmo, suas memórias, história, amores, ideias, desejos, delírios, sonhos e contradições. "Esse não é um filme 'sobre', mas 'com', ou 'através' de Ney Matogrosso", definiu o diretor Joel Pizzini.

Há outros temas evitados em cena. As experiências do artista com a bebida indígena amazônica ayahuasca, na década de 1980, não aparece em nenhuma parte do documentário. No Brasil, o chá psicodélico é usado em rituais religiosos sincréticos, como o Santo Daime. Embora ainda classificada como alucinógeno, para Ney Matogrosso não se trata de uma droga. "O Daime me fez ver meu real tamanho, e entender que não sou mais importante do que um grão de areia ou uma flor. E isso não foi ruim, me ensinou a amar", disse.

O relacionamento com Cazuza também é relegado a apenas duas cenas na história. "Antes dele [Cazuza], a única coisa que oferecia a qualquer pessoa era meu corpo. Meus sentimentos eu não liberava, por traumas de pai e mãe", contou. A partir do cantor, Ney viu que era possível oferecer algo a mais. "Foi [ele] quem abriu essa porta. Havia um amor entre a gente que perdurou até a morte dele".
 

 

5 Comentários

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Giovanni Scarpa Grion Zappile

divoooooooooooooooo

Thomaz2010

Ney, grande sempre. maior show man nacional, acredito até que ao lado de Freddie Mercury.... temos os dois maiores do mundo. Sempre verdadeiro, honesto, Ney não se acovarda diante da própria vida. Merece o sucesso.... Meu abraço!!!! E meu prazer sempre em vê-lo nos shows, e ouvi-lo em casa.

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