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Walter Carvalho lança "Brincante" e diz que cinema não é para ganhar Oscar

2.out.2014 - Walter Carvalho ganha mostra no Caixa Belas Artes, em São Paulo  - Pedro Pontes/Divulgação
2.out.2014 - Walter Carvalho ganha mostra no Caixa Belas Artes, em São Paulo Imagem: Pedro Pontes/Divulgação

Mariane Zendron

Do UOL, em São Paulo

03/10/2014 08h25

Walter Carvalho, que se consagrou na direção de fotografia de filmes como "Carandiru", "Central do Brasil" e "Amarelo Manga", diz que começou a se aventurar como diretor, há pouco mais de dez anos, por "medo". "Quanto mais eu adquiria experiência como fotógrafo, mais medo eu tinha de ser diretor. Um dia resolvi enfrentar esse medo, mas ele persiste até hoje", disse Walter ao UOL.

Neste ano, o cineasta, que estreou como diretor em "Janela da Alma" (2001), apresentou dois frutos desse temor. Depois de dividir a direção da minissérie "O Rebu" com José Luiz Villamarim, ele divulga o filme "Brincante", que estreia no Festival do Rio neste sábado (4), mesmo dia em que será anunciado oficialmente como parte da programação da 38ª Mostra de São Paulo, que acontecerá de 16 a 29 de outubro. 

"Brincante" desvenda a obra do pernambucano Antônio Nóbrega, bailarino, músico e pesquisador que há 40 anos se dedica à cultura e à arte popular. Carvalho conta que, na primeira vez que viu Nóbrega no palco, no Rio de Janeiro, na década de 1990, isso o levou de volta à sua infância na Paraíba, povoada pelas imagens dos tradicionais caboclos de lança. "Quando eu o vi no palco, fiquei chapado. Pensei que gostaria muito de trabalhar com ele."

Anos depois, Carvalho estava dirigindo as gravações dos DVDs de três espetáculos de Nóbrega, lançados entre 2004 e 2010, período em que também surgiu a ideia do filme, meio documentário, meio ficção. "Encarnando seus personagens, Antônio faz uma viagem pelo Brasil no filme. Tem muito do artista, então não é ficção, mas também não é um documentário."

Nóbrega tem uma trajetória interessante. De formação musical erudita, ele começou a se envolver com a música popular por incentivo de Ariano Suassuna. "Mas não suportaria contar sua história por meio de um documentário clássico, por isso imaginei Nóbrega em uma viagem pelo Brasil, a bordo de sua fubica [camionete antiga]."  

Brincante ameaçado

O título do filme é também o nome de um espetáculo e do espaço cultural que Nóbrega gerencia há 22 anos. Localizado na Vila Madalena, o espaço Brincante corre o risco de fechar as portas depois de o prédio onde funciona ter sido vendido a uma incorporadora, que pretende derrubá-lo para construir outro edifício no local. Uma petição pública pede a paralisação do projeto de demolição. "O poder público não se interessa pelo assunto porque só quer o poder. A ignorância não permite perceber que cultura poderia dar retorno. Esse poder que permite que ali seja construído um prédio deveria estar cercando o local para isso não acontecer. Ali é um espaço sagrado da epifania humana".

Com o filme, Carvalho quer que as pessoas conheçam o trabalho do artista e sua dedicação a mostrar e a ensinar cultura popular. "O Antônio se dedica à matéria dele cedo da manhã até tarde da noite. Esse criador criativo é fascinante porque Antônio recriou a arte popular, não se limitou a replicá-la."

Cinema para as pessoas

A conversa de Walter Carvalho com o UOL aconteceu na tarde desta quinta-feira (2), no recém-reinaugurado Cine Belas Artes, que exibe, até o dia 15 de outubro, uma mostra com vários filmes fotografados e dirigidos por ele. Em frente à janela do segundo andar do prédio, enquanto falava com a reportagem, o cineasta observava as pessoas que esperavam o ônibus na rua da Consolação.

"Queria que essa fila de gente pudesse conhecer a obra do Antônio Nóbrega. As pessoas não sabem que podem se emocionar com ele porque talvez não o conheçam. O cinema é feito para chegar a essas pessoas e não para ganhar Oscar", afirmou, continuando a usar o exemplo das pessoas à espera do ônibus para falar de cinema e do seu filme. "Aquela mulher ali, de blusa listrada, tenho certeza que ela gostaria de ver o 'Brincante'. Queria fazer um filme para essas pessoas, queria que o Antônio fizesse o espetáculo dentro daquele ônibus."

Para Carvalho, Nóbrega é tão importante para o público entender o Brasil quanto Caetano Veloso e Chico Buarque. "De três pontos diferentes do Brasil, esses três extrapolaram as barreiras da música. Para compreender o Brasil, tem que escutar Caetano, Chico e Antônio", diz ele. "Brincante" estreia em circuito comercial no dia 20 de novembro.