Filme sobre maconha medicinal acende debate sobre papel do cinema
"Só apoio a liberação da maconha se for pra legalizar tudo, uso medicinal e recreativo", afirmou o deputado federal, ex-BBB, reeleito na eleição deste ano Jean Wyllys. A declaração foi feita na noite desta sexta (31), em um debate realizado após a exibição do documentário "Ilegal", de Raphael Erichsen e Tarso Araújo em sessão especial da 38ª Mostra Internacional de Cinema, no auditório Ibirapuera, em São Paulo. O filme, produzido pela revista "Super Interessante", trata do uso medicinal da substância, proibida no Brasil.
Ao abordar uma disputa judicial em torno da maconha medicinal, envolvendo pacientes e governo, o documentário injetou combustível em uma mobilização que não para de crescer no País. “Filme é poderoso também por nos fazer perceber como o processo de fazê-lo já foi gerando mudanças”, disse o jornalista Denis Russo, diretor de redação da revista, que mediou o debate.
Para o jornalista, o documentário que foi exibido dentro da programação da Mostra Internacional de Cinema pode servir também à reflexão de como filmes e objetos de cultura ajudam a transformar as coisas. E de como a mobilização social tem haver com isso.
A realização do filme, segundo ele, aconteceu graças a uma conjunção de fatores. “A verba seria usada para uma campanha de marketing e, discutindo sobre o que queríamos dizer nessa ação publicitária, chegamos à conclusão que a ideia era mostrar que a revista é relevante. Optamos por fazer isso, produzindo conteúdo."
O evento reuniu, além do político e do jornalista, uma das mães protagonista do filme, Margarete Brito, o poeta Sergio Vaz, fundador da Cooperifa, o codiretor Raphael Erichsen, e Fernando Grostein, diretor do filme "Quebrando o Tabu".
O documentário foi inspirado em uma edição especial da revista que abordava o avanço da legalização da maconha no mundo. O especial sobre o tema, publicado no início deste ano, acabou encontrando a história de Katiele Fischer e sua filha, Emmy, garota brasiliense portadora de um tipo grave e incurável de epilepsia. O Canabidiol (CBD), extraído da maconha e ilegal no Brasil, trouxe benefícios a ela que nenhum outro medicamento conseguiu.
As convulsões que ocorriam a cada duas horas, 80 crises por semana, cessaram, chegando a zero. A menina virou símbolo de uma luta que desafia preconceitos. "Essa história não vai caber somente na revista", alertou Tarso de Araújo, editor da "Super Interessante, ao se deparar com a história que inspirou primeiro um curta e em seguida o longa. "Foi muito prazeroso ver essa campanha crescer", comentou o diretor da revista", Denis Russo.
A reportagem acabou desencadeando uma discussão sobre a ilegalidade desse tipo de tratamento e os entraves burocráticos que as famílias enfrentam para conseguir autorização judicial para importar a substância.
Somos todos ilegais
"Não passava por minha cabeça que as pessoas poderiam ser tratadas com maconha", declarou a mãe Margareth. "Mas depois percebi que é uma onda do bem". Para ela, já é tarde para a regulação. "Estamos discutindo o óbvio", disse.
O diretor Grostein destacou as contradições da lei. "Cigarro, que é liberado, é muito mais nocivo. Conheço gente que parou com a heroína, mas não consegue largar o cigarro." Segundo ele, o que determina a proibição não são as questões de saúde, mas interesses comerciais.
Poeta das quebradas e idealizador do sarau do Capão Redondo (zona sul de São Paulo), Sergio Vaz foi mais ácido sobre os entraves burocráticos envolvendo a medicação. "Mães vacilaram, deveriam ter trazido a erva de helicóptero", disse. "Brasil é um país ilegal."
Antes do debate, o documentário em vários momentos recebeu aplausos do público no Auditório Ibirapuera. Um deles foi quando uma das mães surge em cena reclamando do sofrimento que enfrenta por causa da lentidão no processo para conseguir o medicamento. Situação, segundo ela, agravada por ignorância. "Se desse na folha do abacaxi, a gente usava, mas não dá."
"Nunca vi droga", ressaltou. "Mas se está nela a salvação do meu filho, por que não? A indagação que dá o tom do filme "Ilegal" também norteou o debate.
O deputado Wyllys elogiou a ousadia do filme, que traz um relato dolorido sobre a batalha de inúmeras famílias que lutam para conseguir importar o remédio. "Cinema tem poder de trazer um novo olhar sobre questões relevantes para a sociedade, mas não teria o mesmo efeito sem a mobilização social das famílias."
O deputado, autor de um projeto que tramita no Senado pleiteando a legalização, não é tão otimista sobre o futuro. "Não vai ser fácil emplacar essa ideia." Wyllys reclamou do preconceito que enfrenta. "Eu me sinto na música do Cazuza: já me chamaram de bicha, porque sou mesmo, de ladrão, porque estou na política, e agora de maconheiro por causa desta luta", ironiza.
Mais otimista, o codiretor do filme Raphael Erichsen lembrou que a liberação judicial para a pequena Emmy saiu logo após a comoção gerada pelo curta, feito no início do ano. “Foi tudo muito imediato, isso deu forças para avançar.”
Ele informou ainda que o documentário, que acaba de estrear em 25 salas, em breve avançará em outra fase. "Depois dos cinemas, vamos levar o debate para outros espaços, em diferentes regiões."
Ainda esse ano, segundo ele, “Ilegal” será exibido em comunidades carentes do país. O Rio de Janeiro já tem sessão marcada no Cantagalo. E em São Paulo, no sarau do Cooperifa.
Antes da exibição, o público foi convidado a fazer selfies, em frente ao cartaz do filme, segurando uma placa com a palavra "ilegal". A ideia do diretor é que todos que apoiem a causa postem fotos no Facebook, no mesmo formato, com a hashtag #ilegalofilme", como forma de aderir à campanha pela liberação da medicação. As imagens serão publicadas no Instagram do filme.
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