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Com cinema indie de confeitaria, Wes Anderson cai nas graças do Oscar

Tiago Dias

Do UOL, em São Paulo

26/01/2015 12h26

Com uma queda por personagens caricatos, grande apuro estético e a pecha de cineasta indie e esquisito, Wes Anderson caiu nas graças da Academia após mais de 20 anos de carreira. Seu último trabalho, “O Grande Hotel Budapeste”, conseguiu proezas inéditas para sua filmografia independente. Não é apenas seu trabalho de maior sucesso –com bilheteria de mais US$ 170 milhões no mundo, quatro vezes mais do que seus filmes costumam arrecadar, mas também lidera a corrida para o Oscar com nove indicações, empatado com o franco-favorito “Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)” (Alejandro González Iñárritu).

Aos 45 anos, Anderson também viu seu último filme ser eleito o melhor do ano no Globo de Ouro, na categoria comédia ou musical, desbancando o próprio “Birdman”. Na premiação, ele subiu ao palco de gravata borboleta e agradeceu, irônico, aos jornalistas estrangeiros votantes, “como Dagmar, Jean-Paul, Helmut” e “muitos outros com nomes igualmente cativantes”.

Um jornal do Estado americano do Alabama resumiu bem: “Sabíamos que o diretor de ‘Três É Demais’ e ‘Os Excêntricos Tenenbaums’ tinha um futuro brilhante, mas o reconhecimento do 'mainstream' para uma lenda do cinema independente com um filme merecedor como ‘O Grande Hotel Budapeste’ é um sonho se tornando realidade para os fãs de longa data’”.

No time dos maiores diretores dos Estados Unidos, Anderson se destaca por não abrir mão de sua "mise-en-scène" teatral, as paletas de cores e o tom de fábula --o que muitas vezes lhe rendeu a acusação de ser um mero confeiteiro, sem se preocupar com a história. 


Nascido em Houston, no Texas, ele estudou filosofia e saiu do curso com um amigo, o ator Owen Wilson. Juntos, fizeram o curta “Bottle Rocket”, que mais tarde se tornaria o longa "Pura Adrenalina" (1996). O filme não só ajudou Wilson a se tornar um ator reconhecido, mas também fez com que virasse um constante parceiro do diretor.

Após seu segundo filme, “Três é Demais” (1998), Anderson juntou um elenco inacreditável para um novato no cinema. Com Gene Hackman, Anjelica Houston, Gwyneth Paltrow, Bill Murray, Danny Glover e Ben Stiller, além dos irmãos Luke e Owen Wilson, ele lançou “Os Excêntricos Tennenbaums”. A história sobre uma família desregulada e estereotipada causou burburinho, e ele e Owen Wilson foram indicados a melhor roteiro original no Oscar em 2003.

Owen, porém, que também é coautor dos roteiros de "Pura Adrenalina" e "Três É Demais", foi apenas um dos atores revelados em filmes de Anderson. Jason Schwartzman também debutou em “Três É Demais” e até o cantor brasileiro Seu Jorge tornou-se conhecido no exterior ao interpretar um marinheiro que faz versões acústicas de David Bowie em “A Vida Marinha com Steve Zissou” (2004). Desde então, além de trabalhar quase sempre com o mesmo elenco –Bill Murray participou de quase todos seus filmes--, Anderson desenvolveu sua assinatura: o movimento de câmera para a direta, a fotografia em estilo filtro do Instagram, uma direção de arte impecável, a obsessão pela simetria e pelo enquadramento perfeito. Vieram então a comédia dramática “Viagem a Darjeeling” (2007), a animação “O Fantástico Sr. Raposo” (2009) e a comédia juvenil “Moonrise Kingdom” (2012).



“Budapeste”, no entanto, foi acolhido como nunca pela crítica e pelo público, por trazer, embaixo de todo o confete, um drama cômico histórico, com a Segunda Guerra Mundial e a perseguição nazista como pano de fundo, sobre Gustave H., gerente de um hotel na ex-república ficcional de Zubrowka, na fronteira oriental da Europa.

Filmado em locação na Alemanha, especialmente na cidade de Görlitz e no Studio Babelsberg. Wes Anderson revelou que a história baseou-se em dois livros de escritor austríaco Stefan Zweig, que morreu no Rio de Janeiro: “Coração Impaciente” e “Êxtase da Transformação”. Os traços do próprio Zweig compõem o personagem de Gustave, interpretado por Ralph Fiennes.

“Wes Anderson está entrando no território de Woody Allen. Estabeleceu uma marca e pode chamar atores do primeiro time para papéis pequenos. O público vai ao cinema porque sabe que terá um refresco dos blockbusters de sempre”, opinou Phil Contrino, vice-presidente do site BoxOffice.com, que analisa as bilheterias americanas.