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Aos 28 anos, filho de Clint Eastwood sonha ser protagonista de filme do pai

Eduardo Graça

Do UOL, em Los Angeles

30/04/2015 06h00

A sensação de déjà vu se dá na segunda metade de “Uma Longa Jornada”, adaptação para o cinema do livro de Nicholas Sparks, em cartaz no Brasil a partir desta quinta-feira (29). O mocinho está casmurro, sentado na varanda da fazenda de sua família. O sol se põe, e o que fica é a silhueta de um perfil que pode ser imediatamente reconhecido pelos cinéfilos: Clint Eastwood. Só que não. 

A semelhança física de Scott Eastwood, 28 anos, com o pai --o diretor, ator, político e lenda viva do cinema Clint, 84-- é de arrepiar. Em seu primeiro papel como protagonista de um filme comercial de peso, Scott é, disparado, a principal atração do longa, centrado na tortuosa história de amor entre Luke, um campeão de rodeio,  e Sophia, uma universitária apaixonada pelo mundo das artes plásticas, vivida por Britt Robertson (“A Primeira Vez”).

"Sabe que não pensei nisso quando filmamos? Na minha cabeça, o que se passava era esta seqüência de ideias: o filme não é um faroeste, também não é exatamente um filme de caubói. É, em sua essência, uma história romântica sobre opostos que se atraem e as dificuldades que precisam ser superadas em algumas grandes histórias de amor. Ou seja, era sobre sacrifício. Aí segui refletindo: papai já fez algum personagem no universo dos rodeios? Não. Juro que não pensamos, eu, Nicholas, o diretor, a produção: ‘bora’ colocar o Scott com uma arma na mão e um chapéu de caubói, afinal, ele é filho do homem!", garante o ator de pouco mais de 1,80 m, calça jeans justa, camisa de gola solta no corpo, e o xerox de Clint quando este despontava para o estrelato na virada dos anos 1960 para o 1970.

Ainda assim, a cena em que lembra seu pai de forma impressionante tem algo a ver com o futuro profissional que mais o tenta: "Ser a cara de meu pai não é algo central na minha vida. Veja bem, quero que ele tenha orgulho de mim, como qualquer filho, claro, mas é isso. Meu sonho é, um dia, ser protagonista de um filme dele. Isso seria muito, muito importante para mim. No momento, ele decidiu dar um tempo, está colhendo os louros do sucesso comercial de 'Sniper Americano'. E o velho está mais do que certo. Mas quem sabe em um futuro próximo? Não custa sonhar, né?".

Do Clint diretor, ele ama “Os Imperdoáveis”, “As Pontes do Rio Madison” e “Sobre Meninos e Lobos”. Do ator, “Josey Wales - O Fora da Lei” (que Clint também dirige) e, especialmente, “Três Homens em Conflito”. “Foi quando tudo começou para ele, né? Este eu posso ver todo dia que jamais me cansará.”

Scott é um dos dois filhos de Clint com a aeromoça Jacelyn Ann Reeves. Ele nasceu durante o período em que o ator e diretor ainda vivia com a atriz Sondra Locke. Além da irmã mais nova, a também atriz Kathryhn, 27, Scott tem outros cinco irmãos, de um total de quatro relacionamentos do pai. A mais velha, Kimber, tem 51 anos, e as mais novas, Francesca (que ele chama, carinhosamente, de Franny) e Morgan, têm 21 e 18 anos. Os outros irmãos são o músico de jazz Kyle, 47, e a designer, atriz, modelo e diretora Alison, 43.

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  • Reprodução/Divulgação

    Ser a cara de meu pai não é algo central na minha vida. Veja bem, quero que ele tenha orgulho de mim, como qualquer filho, claro, mas é isso. Meu sonho é, um dia, ser protagonista de um filme dele.

    Scott Eastwood, ator e filho de Clint Eastwood (na foto, comparação entre pai e filho)

Trabalho duro

Mesmo com a extensa família, Scott foi criado pela mãe, mas próximo do pai, em Carmel, no norte do Estado da Califórnia, cidade comandada pelo prefeito Clint durante três anos, na década de 1980. Ele jura, no entanto, que não recebeu qualquer empurrão –ou ajuda– do pai para iniciar a carreira no cinema.

"Fui um adolescente típico, com uma diferença: sendo criado por ele, sempre sonhei, claro, em ter uma arma na mão e ganhar a mocinha no fim da história. Cresci no meio do cinema, adoro tudo, do atuar à direção, passando pela produção e a decisão de se contar uma bela história. Mas não houve privilégio algum. Com todos os filhos, papai sempre seguiu a mesma cartilha: ele precisou ralar muito para conseguir o que queria na vida e não iria ser diferente com suas crias. E, olha, hoje vejo o quão importante isso foi para o meu caráter, para me transformar no homem que sou. Trabalho duro compensa, sim, me dizia seu Clint, com razão", conta o filho orgulhoso do pai.

Scott ri sozinho ao lembrar que, nos tempos de faculdade, que ajudava a bancar com um trabalho de garçom em restaurantes da cidade californiana de Santa Bárbara, tomou coragem e ligou certa vez para “seu Clint” com um plano bem armado: queria comprar um jipe Land Rover e pediu um empréstimo de US$ 10 mil a serem pagos assim que ele saísse da faculdade –um bacharelado em artes--  e conquistasse o primeiro emprego. Do outro lado da linha, o pai taciturno murmurou um ‘mas que maravilha, hein, filho?’ e desligou o telefone. Para  nunca mais tocar no assunto.

"Pensei, ‘uau’, isso é o que de melhor vai acontecer nesta história. Deixei quieto e ralei muito para comprar o carro", diz.

Depois de se mudar para San Diego, quase na fronteira californiana com o México, e de entrar na sociedade de um bar local, o jovem Eastwood começou a participar de testes de elenco, usando, no início, o nome da mãe. Ele diz que queria provar para si mesmo a possibilidade de avançar na carreira sem usar o sobrenome famoso. Mas não adiantava: lá estava o xerox estampado para reafirmar a filiação.

Trailer de "Uma Longa Jornada"

"Relaxei ao perceber que haviam muito mais fatores do que eu imaginava na hora da escalação de um elenco: a idade, a química, a aparência física, a voz. E rapidamente retomei o Eastwood. E relaxei tanto que fui trabalhar com papai", conta.

Foram cinco filmes, de “A Conquista da Honra”, de 2006, quando ainda usava o Reeves no sobrenome, até “Curvas da Vida”, seis anos depois.

"No início, acho que ele era mais duro comigo do que com o restante do elenco. Papai, diretor, sabe exatamente o que quer. E assim que consegue fazer o que imaginou, vira a página e parte para a próxima cena, sem jamais olhar para trás. É um homem de poucas palavras e ação certeira. O principal conselho que me deu foi 'siga seus instintos sempre e tente encafifar o mínimo possível sobre os papéis que você vai fazer'. Mas o mais especial para mim foi ter tido a oportunidade de ter trabalhado com ele. Serão, para sempre, algumas das memórias mais marcantes de minha vida", diz.

Rodeio e nu

A exposição em “Uma Longa Jornada”, com sua imagem em destaque nos pôsteres do filme mundo afora, não o assusta. Scott Eastwood confessa que só viu duas das outras nove produções finalizadas a partir de livros de Sparks –“Uma Carta de Amor” e “Diário de Uma Paixão”, sendo que o último o “fez chorar” – e que não é, exatamente como Luke, um fã ardoroso de arte contemporânea “ou balé”. Do universo dos rodeios –o estúdio teve de brigar para que ele deixasse os dublês fazerem algumas das cenas mais perigosas no lombo de touros bravios–, no entanto, é um conhecedor de fato, apaixonado pelo esporte.

"É como papai diz, um meio que não é para os fracotes. Tem de ser durão para montar num bicho daqueles. Aliás, fazer este filme me deu mais vontade ainda de um dia conhecer o Brasil, que tem uma cena sensacional de rodeios. Já tinha uma aproximação natural com o país por conta do jiu-jitsu, que pratico há quatro anos, e que é um xadrez para a mente ao mesmo tempo em que me deixa em forma. E tem as mulheres, lindas, né?", diz, abrindo outro sorriso nada "Clintniano".

Se seu pai foi um conquistador de primeira grandeza –além das quatro mães de seus filhos e do conturbado e longo relacionamento com a atriz e diretora Sondra Locke, ele teria namorado, entre outras, Catherine Deneuve e Jean Seberg–, Scott acha graça dos comentários em torno de sua beleza física. E das cenas de nu que recheiam “Uma Longa Jornada”, mais ousadas do que o padrão Sparks de adaptação cinematográfica.

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  • Grant Lamos IV/Getty Images

    Cresci no meio do cinema, adoro tudo, do atuar à direção, passando pela produção e a decisão de se contar uma bela história. Mas não houve privilégio algum. Com todos os filhos, papai sempre seguiu a mesma cartilha: ele precisou ralar muito para conseguir o que queria na vida e não iria ser diferente com suas crias.

    Scott Eastwood, sobre a filosofia do pai, Clint Eastwood

"Ficar pelado não foi difícil para mim. Não tenho grandes encucações em ficar nu, e a Britt ser linda ajudou muito. Eu acho sexy ficar nu com ela ao meu lado", diz.

Britt Robertson conta que dividir o set com Scott foi uma ‘aventura’, “especialmente por conta de sua espontaneidade. Você não o doma, jamais. Um belo dia ele chega e diz ‘e aí, vamos para Bora Bora?”. Você responde: 'Um dia, seria legal, né? Que sonho!' E ele, de bate-pronto: ‘sonho, nada, vamos agora’. E se você bobear, já está indo”, conta.

"Sempre fui assim, desde muito jovem. Adoro aquela frase em 'Um Sonho de Liberdade': 'ou bem você se ocupa em viver ou em morrer'", diz o ator.

Snowden e Mulher Maravilha

Depois de “Uma Longa Jornada”, Eastwood volta às telas, ainda este ano, em “Mercury Plains” e no faroeste “Diablo” (em que vive os protagonistas), além de participar do novo filme de Oliver Stone, a biografia de Edward Snowden, que estreia no Natal.

Em seguida, ele trabalha novamente com o diretor David Ayer, em “O Esquadrão Suicida”, e se rende de vez ao mundo dos super-heróis em “Mulher Maravilha”, que chegará às telas em 2017. Ayer, com quem ele trabalhou no filme de guerra “Corações de Ferro”, é, segundo o ator, “um gênio, um de meus heróis, um cara que observei o tempo todo durante as filmagens, seguindo o conselho de meu pai: ator bom não fica no trailer jamais”.