Desculpa, mundo! Novo "Star Wars" é melhor que "O Império Contra-Ataca"
Bem escrito, bem dirigido, com um elenco afinado e efeitos impecáveis. Deixando de lado relativizações históricas ou paixões pessoais de cada um, não seria exagero dizer que "O Despertar da Força", sétimo episódio da saga "Star Wars" que chega nesta quinta (17) aos cinemas de todo o mundo, é o melhor que já foi feito. Ponto.
Melhor porque entrega ao espectador de hoje a experiência cinematográfica completa: enche os olhos com batalhas de sabre de luz ou combates aéreos de tirar o fôlego, intriga com uma história com objetivo claro e coerente, e diverte com tiradas bem-humoradas e muitas, muitas referências ao imaginário coletivo da saga endereçadas especialmente aos fãs de gerações mais velhas.
Para usar uma expressão cara a George Lucas, idealizador da série, ainda que não seu melhor condutor a julgar pelos três fracos episódios que comandou entre 1999 e 2005, "O Despertar da Força" é o poder do próprio mito em ação.
Se é possível dizer, sem medo, que o episódio VII é o mais redondo até agora, também é impossível não admitir que ele não funcionaria sem o estrago (no bom sentido) que os três capítulos daquela que é considerada a Trilogia Clássica - "Uma Nova Esperança" (1977), "O Império Contra-Ataca" (1980) e "O Retorno de Jedi" (1983) - fizeram na cultura pop nos últimos 30 anos.
Assim, o que o diretor JJ Abrams fez, nesta nova e bem azeitada aventura, foi revirar cada pedacinho de mitologia do material original guardado no inconsciente do público, assoprar a poeira e reposicioná-los em um tabuleiro novinho em folha - turbinado pela verba infinita da Disney, que desde 2012 é dona do espólio, e principalmente pelas possibilidades que o cinema digital tem a oferecer nesta segunda década do século 21.
Diferentemente dos filmes mais antigos que, vistos hoje, necessitam de uma dose de boa vontade para fazer vista grossa a criaturas mal-ajambradas ou "defeitos" especiais próprios da época, em "O Despertar da Força" não há saltos no escuro: com ajuda do 3D e uma sala de cinema com som poderoso, é possível imergir, espreitar-se e equilibrar-se nos cenários clássicos da saga, é possível sentar no cockpit de uma nave de combate X-Wing, é possível acreditar.
Outra vantagem "dos tempos" parece estar no próprio trabalho de atuação da novíssima geração. Mais uma vez, se no clássico "Império Contra-Ataca" o fã vibra com meia dúzia de frases mecânicas e mecanizadas de um vilão como Darth Vader - afinal, ele é meio-homem, meio-máquina, está dominado pelo lado negro da Força, blá-blá-blá... -, aqui não é preciso dar esse desconto para preservar nossa preciosa memória afetiva. Interpretado por Adam Driver (da série "Girls"), ator que é a cara da geração hipster da TV e do cinema atual, o novo vilão Kylo Ren tem mais coração, mais sangue correndo nas veias e, por isso mesmo, mais conflitos internos. Que a gente sabia que Vader também tinha, mas não necessariamente via na tela.
Não custa lembrar que o über-vilão da saga original levou 6 anos para tirar a máscara - e só o fez à beira da morte -, enquanto que Kylo Ren não pensa duas vezes antes de mostrar a sua verdadeira face diante da primeira provocação. Significa.
Espírito dos novos tempos
Também extremamente contemporâneos, os personagens Rey (Daisy Ridley) e Finn (John Boyega) são outro acerto indiscutível do novo longa. Ela, uma catadora de lixo aguerrida e obstinada, é a heroína sob medida para o novo feminismo que atrai e empodera meninas pelo Brasil e pelo mundo, das escolas e periferias ao mercado de trabalho e às redes sociais. Ele, um stormtrooper em crise de pânico (tão século 21!), que apesar de tudo tira forças para correr riscos e buscar algo pelo que lutar.
Se a grita de conservadores, misóginos e racistas já era grande diante dos primeiros trailers, antes da estreia do primeiro longa, podem apertar os cintos que essa dupla veio para ficar, causar e talvez incomodá-los ainda mais - no grande novelão que "Star Wars" também nunca deixou de ser, não seria de estranhar se eles formassem um lindo casal inter-racial.
Mas alto lá! Antes que os fãs mais antigos comecem a apontar os canhões de laser contra este texto, é claro, é óbvio, que o mérito da turma de 2015 não tira, em absoluto, a importância e o carisma dos personagens clássicos. Para quem viu os trailers, não chega a ser spoiler dizer que Han Solo (Harrison Ford) e Leia (Carrie Fisher) vão voltar, com cabelinhos brancos e algumas ruguinhas a mais, mas com a mesma química e familiaridade de sempre.
As primeiras aparições de cada um na tela foram recebidas com aplausos entusiasmados e até algumas lágrimas escorrendo pelos olhos do público de sortudos que conferiu a pré-estreia do filme, na noite desta terça (15), em São Paulo. O retorno dos icônicos androides C-3PO e R2-D2 e do wookie Chewbacca também vem em grande estilo, com participações fundamentais para o desenrolar da trama e diálogos em línguas incompreensíveis, mas entendidas, ruído por grunhido, por quem se deixa entregar à história.
Conhecedores mais profundos da saga --que não se encerra nos sete filmes, mas estende-se por décadas de quadrinhos, animações, livros, games etc.-- possivelmente vão encontrar pelos de wookie em ovos, mas realmente é difícil apontar um ponto negativo de "O Despertar da Força" a julgar pelo que se vê na tela. Depois dos altos e baixos de "Lost" e das adaptações apenas corretas de "Star Trek", JJ Abrams provou, de uma vez por todas, que tem a Força. É uma pena que ele já afirmou que não vai dirigir os episódios VIII e IX, mas deixou um belo ponto de partida para quem assumir o comando dessa nave daqui para a frente.
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