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Com foco no visual, novo "Caçadores de Emoção" esculhamba história original

James Cimino

Colaboração para o UOL, em Los Angeles (EUA)

27/01/2016 06h00

Em 1991 foi lançado um filme que se tornaria nos anos seguintes um daqueles sucessos da “Sessão da Tarde”. “Caçadores de Emoção”, estrelado por Patrick Swayze e Keanu Reeves, mostrava o conflito ético de um agente do FBI (Reeves) que tem de prender uma quadrilha de assaltantes a banco liderada pelo personagem de Swayze.

A dificuldade toda é porque ambos são surfistas, e Bodhi (Swayze) é uma espécie de ídolo do agente Johnny Utah (Reeves). Na verdade, os dois vivem no filme algo que hoje se chama “bromance” (espécie de amor platônico entre homens). Para piorar tudo, o mocinho e a namorada do bandido se apaixonam.

Podia ser só mais um dramalhão de Hollywood, não fosse a sensível direção da ainda não tão famosa Kathryn Bigelow, primeira mulher a ganhar um Oscar de melhor direção por “Guerra ao Terror”. Além disso, naquela época o surfe começava a deixar de ser “esporte de hippie maconheiro” para ganhar o mainstream dos grandes circuitos mundiais. Retratar toda sua beleza cinematográfica era algo que fazia conexão com o espírito daquele tempo. E esta é a única conexão sólida que a nova versão, que chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (28), faz com o original.

O “Caçadores de Emoção” de hoje é estrelado por Édgar Ramírez (no papel de Bodhi), pelo australiano Luke Bracey (Johnny Utah) e por Tereza Palmer — que deveria completar o triângulo amoroso do filme original, não fosse a péssima história, que tenta fazer a conexão entre as incríveis cenas de esportes radicais (cerca de 70% do filme).

Aliás, é o que vale a pena no longa. As cenas de esqui na neve, skydiving, surfe em alto mar etc receberam um tratamento impecável, especialmente para se ver em 3D. Para executá-las, primeiramente o diretor Ericson Core dispensou a computação gráfica. Em seguida, chamou campeões de cada categoria esportiva retratada, em vez dos tradicionais dublês, o que deu ao filme uma aura de documentário do canal pago “Off” e um profundo realismo. E nada disso foi gravado em estúdio, ou seja, a equipe viajou para 11 países diferentes para usar locações e eventos reais.

É possível perceber ainda que o diretor se inspirou na estética das câmeras GoPro, muito usadas de forma amadora para filmar esse tipo de esporte. “Não usamos as GoPros porque a qualidade delas para um filme HD não é boa, mas aprendemos muito vendo como os praticantes usam essas câmeras em seus registros” disse o diretor ao UOL.

Caçadores de Emoção - Diculgação - Diculgação
Keanu Reeves e Patrick Swayze em cena do "Caçadores de Emoção" original, de 1991
Imagem: Diculgação

Outro acerto foi mostrar toda a aura que cerca esse tipo de competição nos dias de hoje. Se em 1991 o surfe e a gangue Bodhi conservavam uma aura bicho grilo, tocando violão ao redor de uma fogueira e vivendo sem luxo, na versão atual eles são financiados por um jovem investidor que adora dar festas de música eletrônica em alto mar, em um iate cheio de modelos e de “coxinhas”.

De resto, nada faz sentido. O filme falha em construir entre Bodhi e Johnny Utah uma conexão sólida o suficiente para que o público acredite que aquele agente do FBI tem algum motivo para não prender aquele anarquista dos esportes radicais.

Durante entrevista coletiva de lançamento do filme em Los Angeles, o diretor disse à reportagem que pretendia fazer um filme completamente diferente do original. O problema é que, nesta tentativa, Ericson Core acabou eliminando as principais característica do filme: contar uma história sobre conflitos morais, sobre paixão pela vida, sobre se apaixonar pela mulher de um cara que você admira, sobre ter que prender esse cara que você ama e admira.

Questionado por que a relação dos protagonistas e da personagem feminina é tão superficial, Core respondeu que a personagem feminina foi mudada, de vítima e objeto de disputa, para governanta da gangue, que mal participa das sequências de ação.

“A outra personagem [de 1991] era uma vítima, era sequestrada… Não era uma personagem forte como queríamos. Agora ela é um tipo de personagem que é a mais esperta de todos. Ela vê o grupo, atende as necessidades deles, cozinha para eles. É uma personagem mais forte”, diz o diretor.

Para a atriz Tereza Palmer, sua personagem não parece tão espetacular, já que disse à reportagem que “sentia muito” pelo fato de não participar das principais cenas de ação. E disse, ainda, que as cenas do triângulo amoroso chegaram a ser gravadas, mas não entraram na edição final.

Portanto, quem espera alguma sombra do filme de 1991, melhor aproveitar o que “Caçadores de Emoção - Além do Limite” oferece de melhor: sequências de 3D em que o recurso é explorado em sua plenitude.