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Britânico "I, Daniel Blake" vence Palma de Ouro; "Aquarius" sai sem prêmios

Thiago Stivaletti

Colaboração para o UOL, em Cannes (França)

22/05/2016 14h57Atualizada em 23/05/2016 09h50

Foi um balde de água fria. Aclamado pela crítica internacional quando estreou no Festival de Cannes, o brasileiro “Aquarius” saiu sem nenhum prêmio da cerimônia de premiação neste domingo (22). A derrota brasileira já podia ser sentida antes de a cerimônia começar. Nem Sonia Braga nem o diretor Kleber Mendonça foram vistos no tapete vermelho para a cerimônia.

A Palma de Ouro foi para o drama social britânico "I, Daniel Blake", de Ken Loach, sobre um operário doente que não consegue receber seu seguro-desemprego devido à imensa burocracia do sistema social no Reino Unido.

Loach aproveitou para criticar o crescimento dos governos de direita pelo mundo. “A política neoliberal trouxe a miséria, da Grécia a Portugal, com um pequeno número de pessoas que enriquecem com isso”, afirmou. “Defendo um cinema de protesto, que coloca os fracos contra os poderosos. Um outro mundo não é só possível, mas necessário”. É a segunda vez que o diretor britânico vence a Palma de Ouro –a primeira foi com “Ventos da Liberdade”, há dez anos.

O diretor de 79 anos havia declarado recentemente que ia parar de filmar, mas voltou atrás. Poucos diretores venceram a Palma de Ouro duas vezes: Francis Ford Coppola, o austríaco Michael Haneke, os belgas Luc e Jean-Pierre Dardenne e o sérvio Emir Kusturica.

A filipina Jaclyn Jose, do drama “Ma’Rosa”, tirou as chances de Sonia Braga levar a Palma de melhor atriz. Ela vive a mãe do título, uma mulher que vende drogas para sustentar os filhos e acaba indo presa.

Surpresas

Foi inesperado o Grande Prêmio do Júri (segundo melhor filme da competição) para o canadense Xavier Dolan, 27, com o drama “Juste la Fin du Monde” (Apenas o Fim do Mundo), sobre um rapaz que volta para casa depois de muitos anos longe para anunciar à família que vai morrer em breve. Menino-prodígio criado por Cannes, com cinco de seus seis filmes exibidos no festival, ele já havia sido premiado com um Prêmio do Júri por "Mommy" (2014).

“Prefiro a loucura dos pacientes à sabedoria dos indiferentes”, disse Dolan, ao receber o prêmio.

O prêmio mais polêmico foi o de direção para o francês Olivier Assayas pelo suspense “Personal Shopper”, com Kristen Stewart, muito vaiado em sua primeira sessão. A vaia se repetiu na sala de imprensa quando o prêmio foi anunciado.

O prêmio de direção foi dividido com o romeno Cristian Mungiu, por “Graduation” –o diretor já ganhou a Palma de Ouro por “4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias”. O cineasta alertou para o pouco espaço dado ao cinema de autor no mundo hoje.

“American Honey”, com Shia Laboeuf, sobre jovens americanos que vendem revistas viajando os EUA numa van enquanto levam uma vida selvagem de sexo e drogas, levou o Prêmio do Júri.

O iraniano “The Salesman”, de Asghar Farhadi – o mesmo de “A Separação”, vencedor do Oscar –, que foi incluído por último na Competição, levou dois prêmios: melhor roteiro e ator para o iraniano Shahab Hosseini pelo professor que precisa lidar com uma provável tentativa de estupro da mulher.

Brasil

O Brasil, que tinha muita expectativa de levar algum prêmio com o longa “Aquarius” na disputa pela Palma de Ouro, levou um prêmio menor, uma menção especial do júri (um segundo lugar) para o curta “A moça que dançou com o diabo”, de João Paulo Miranda Maria. A Palma de Ouro na categoria foi para um curta espanhol, “Time Code”.

Antes do início da cerimônia, o júri deu a entender que a decisão dos prêmios foi difícil e cheia de discordâncias. “Foi muito difícil. Mas aqui estamos”, disse o dinamarquês Mads Mikkelsen, da série “Hannibal”. “Não foi muito fácil”, declarou o húngaro Laszlo Nemes, diretor de “O Filho de Saul”.

A cerimônia de premiação tentou imitar o Oscar e apresentar números musicais, mas tudo muito chato e quase constrangedor. Na apresentação, um grupo de músicos no palco tocavam músicas da trilha sonora de filmes vencedores da Palma de Ouro, como “Pulp Fiction” e “Dançando no Escuro”.

O brasileiro João Paulo Miranda Maria, vencedor de uma menção do júri pelo curta "A moça que dançou com o diabo", contou que não teve patrocínio para rodar o filme, que teve um orçamento limitado de cerca de 100 dólares. Na entrevista coletiva, ele aproveitou seu pouco tempo para se alinhar à equipe de "Aquarius" contra o impeachment de Dilma Rousseff. "Vivemos momento perigoso no Brasil, em que uma sociedade conservadora perigosa está voltando ao poder. Isso é uma ameaça à liberdade de expressão."

Palma de Ouro
“I, Daniel Blake”, de Ken Loach (Reino Unido)

Grande Prêmio do Júri
“Juste la Fin du Monde” (Apenas o Fim do Mundo), de Xavier Dolan (Canadá/França)

Melhor diretor
Olivier Assayas, por “Personal Shopper” (França), e Cristian Mungiu, por “Graduation” (Romênia) (empate)

Melhor atriz
Jaclyn Jose, por “Ma’ Rosa”, de Brillante Mendoza (Filipinas)

Melhor ator
Shahab Hosseini, por “The Salesman”, de Ashgar Farhadi (Irã)

Melhor roteiro
Asghar Farhadi, por “The Salesman” (Irã)

Prêmio do Júri
“American Honey”, de Andrea Arnold (Reino Unido/EUA)

Prêmio Caméra d’Or (melhor primeiro filme)
"Divines", de Houda Benyamina (Afeganistão)

Melhor curta-metragem
"Time Code", de Juanjo Gimenez (Espanha)

Menção especial – curta-metragem
"A Moça que Dançou com o Diabo", de João Paulo Miranda Maria (Brasil)

Palma de Ouro Honorária
Jean-Pierre Léaud, ator dos filmes de François Truffaut como “Os Incompreendidos”