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Distribuidora americana fará campanha por Sonia Braga e "Aquarius" no Oscar

Carlos Helí de Almeida

Colaboração para o UOL, em Brasília

26/09/2016 17h41

Esnobado pela comissão do Ministério da Cultura que escolheu o candidato brasileiro ao Oscar de melhor filme estrangeiro, “Aquarius”, de Kleber Mendonça Filho, vai fazer campanha para concorrer em outras categorias do prêmio da Academia. Quem está por trás da estratégia, que terá a atriz Sonia Braga como principal trunfo, é o americano David Shultz, diretor da Vitagraph Films, a companhia encarregada de distribuir o longa-metragem nos Estados Unidos, onde ele estreia no dia 14 de outubro, depois de ser exibido no Festival de Nova York.

“O que posso dizer sobre o filme do Kleber nesse ponto é que ele representa o zeitgeist (espírito da época) do momento em que vivemos. Ele fala sobre o que está acontecendo no Brasil, mas também em todo o mundo, inclusive nos Estados Unidos”, diz Shultz, explicando o alcance internacional da história de “Aquarius”, sobre uma escritora e jornalista aposentada que luta sozinha contra o assédio de uma empreiteira que planeja derrubar o prédio onde ela mora para construir um arranha-céu.

“O americano, mais do que ninguém, conhece histórias de pessoas que perderam seus imóveis para empresários gananciosos. E um deles está concorrendo à presidência dos Estados Unidos, não é?”, ironiza o executivo, referindo-se ao magnata Donald Trump, o postulante republicano à Casa Branca. “É importante que as pessoas lembrem de seu passado, e do que pode acontecer com suas crianças”.

Polêmica

Um das produções brasileiras mais elogiadas dos últimos tempos, “Aquarius” saiu elogiado do Festival de Cannes, e rapidamente se tornou o favorito para representar o Brasil no Oscar. Mas foi preterido em nome de “Pequeno Segredo”, de David Schurmann, depois de um processo polêmico, envolvendo um dos integrantes da comissão de seleção, o comentarista de cinema Marcos Petrucelli, que havia feito críticas nas redes sociais ao protesto da equipe do filme contra o impeachment da presidente Dilma Rousseff em Cannes.

Ato contínuo, diretores de outros concorrentes à vaga, como Gabriel Mascaro, de “Boi Neon”, e Anna Muylaert, de “Mãe Só Há uma”, retiraram suas candidaturas em solidariedade a “Aquarius”, e em protesto contra a parcialidade e contra como o que identificaram como tentativa de sabotar o filme.

“O engraçado é que ontem conversei com David Weisman, produtor de “O Beijo da Mulher-Aranha” (Hector Babenco, 1985), um dos filmes brasileiros mais conhecidos aqui nos Estados Unidos, e ele considera ‘Aquarius’ é um filme especial, e que se há alguém querendo barrá-lo, isso só o tornará mais especial no coração das pessoas que o assistirem”, diz o distribuidor americano.

Coprodução com os Estados Unidos, “O Beijo da Mulher-Aranha” estreou no Festival de Cannes daquele ano, onde conquistou o prêmio de melhor ator (William Hurt) e acabou concorrendo aos Oscar de melhor filme, direção, roteiro adaptado e ator no ano seguinte, onde Hurt repetiu o feito do festival francês. O longa tem Sonia Braga em papel coadjuvante. “O filme está sendo muito recebido no Brasil, e se o governo brasileiro está tentando prejudicá-lo de alguma forma em relação a prêmios internacionais, é importante que o americano o conheça e o apoie também. Trata-se de uma retaliação contra um filme de arte”, completa Shultz.

Campanha

A ideia de Shultz é fazer uma turnê promocional do filme pelos Estados Unidos ao lado de Sonia Braga, radicada no país desde o final dos anos 1980. “Não somos uma empresa rica, mas trabalhamos em associação com a Angelika Film Center, uma rede de cinema de arte, com salas em Nova York, Wahsington, Dallas e San Diego (California). Vamos vender a Sonia como potencial candidata ao Oscar de melhor atriz e, no processo chamar a atenção dos votantes da Academia para outros aspectos do filme, como direção e roteiro. Para isso é preciso que o filme tenha uma carreira significativa nos cinemas daqui. O papel de Sonia nesse processo é importantíssimo”.

A Vitagraph Films gravou um depoimento que a atriz fez no Angelika Film Center de Nova York e o exibirá junto com o trailer de “Aquarius” nos cinemas americanos. A campanha terá início daqui a duas semanas, com um jantar promocional em Los Angeles.  “Não quero insultar nenhum outro ídolo brasileiro, como Pelé, mas Sonia é um tesouro nacional. É assim que a vemos aqui nos Estados Unidos. Nossa vontade é que ela esteja pessoalmente em algumas cidades-chaves do lançamento. É uma forma de disseminar a mensagem do filme, e Sonia é o melhor instrumento que temos para fazer isso”.

Mendonça Filho está animado com os planos de Shultz. “Tem tudo a ver com as iniciativas recentes da Academia para aumentar a diversidade do Oscar”, ressalta o cineasta pernambucano, que ministrou uma palestra sobre direção de filmes nesta segunda-feira (26) no 49º Festival de Brasília. “A decisão de ter Sonia como principal promotora do filme nos Estados Unidos é perfeita, porque ela é bem mais conhecida do que eu lá, e o público americano acolherá as palavras de alguém que lhe é mais familiar”.

Em abril, após críticas a falta de atores não-brancos entre os indicados na categoria de interpretação nas últimas edições do prêmio, a presidente da Academia, Cheryl Boone Isaacs, anunciou medidas para aumentar o número de mulheres e representantes de minorias étnicas entre seus membros. Em junho, convidou 683 novos integrantes para seus quadros, incluindo os brasileiros Anna Muylaert, Alê Abreu, Rodrigo Teixeira e Lula Carvalho. Entre os novos membros, 46% eram mulheres, e 41% não-brancos.

Shultz reconhece que Sonia terá concorrentes fortes. A mais visível delas é a francesa Isabelle Huppert, protagonista de “Elle”, de Paul Verhoeven, representante da França no Oscar de filme estrangeiro. “A Isabelle é uma queridinha dos críticos americanos. Então é muito importante que 'Aquarius' seja bem-sucedido em seu lançamento nos Estados Unidos, e que o seja tendo Sonia como figura chave nesse campanha, explicando pessoalmente por que o filme é importante para as pessoas”.