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Também fui uma criança muito peculiar, diz Tim Burton sobre seu novo filme

Eduardo Graça

Colaboração para o UOL, em Londres (Inglaterra)

29/09/2016 06h00

Quando os produtores de “O Lar das Crianças Peculiares”, a partir de amanhã nos cinemas, compraram os direitos de adaptação para a tela grande do primeiro tomo da trilogia criada pelo escritor americano Ransom Riggs em 2011, já o fizeram com um diretor na cabeça: Tim Burton.

"E você consegue imaginar alguém diferente? Li o livro, li o roteiro, e parece que foi o Tim que escreveu, chega a ser estranho. Ele foi um diretor, digamos assim, peculiar", diz o protagonista Asa Butterfield, conhecido do público pelo personagem-título de “A Invenção de Hugo Cabret”, em entrevista em vídeo (assista no topo da página).

Tim Burton - Evan Agostini/Invision/AP - Evan Agostini/Invision/AP
O diretor Tim Burton, 58
Imagem: Evan Agostini/Invision/AP

No filme classificado de “aventura sombria” pelo diretor de “Edward Mãos de Tesoura”, o Jake de Butterfield descobre realidades alternativas e crianças com habilidades fantásticas em uma casa localizada nos cafundós do País de Gales que um dia serviu de refúgio para seu avô, vivido por Terence Stamp. A localidade é comandada pela Senhora Peregrine, vivida pela francesa Eva Green, musa de Burton desde a comédia de humor negro “Sombras da Noite”.

“'O Lar' é um filme que ecoa os primeiros filmes do Tim (Burton), centrado na ideia do que é não saber ao certo seu lugar no mundo, se achar um ‘gauche’. E, claro, em se tratando dele, os personagens acabam encontrando um lugar em que estas singularidades, as suas ‘esquisitices’, são celebradas e não criticadas", diz a atriz.

Burton conta que a relação entre Jake e o avô do menino, recheada de histórias mágicas e cumplicidade, levou o diretor a se lembrar de sua relação com sua própria avó (“ela era a única que me deixava à vontade, com ela eu sabia que estava no meu lugar certo, também fui uma criança muito peculiar”) e a decisão de filmar a primeira parte da história em Miami o lembrou, na linha da viagem de volta a seus primeiros trabalhos apontada por Green, de um de seus clássicos, “Edward Mãos de Tesoura”, com o compadre Johnny Depp.

"Foi a primeira vez que voltei àquelas locações desde as filmagens na virada dos anos 1980 para 1990 e foi emocionante. As árvores estão imensas, o que, no fim, são prova do quão mais velho estou. De fato me emocionei.

Duas décadas e meia depois do lançamento de “Edward” o cenário não é tão convidativo para filmes timburtonianos, aventuras mais ou menos inclassificáveis centradas na fantasia e na criação de universos próprios e sombrios, com influência dos contos de fada, mas clara assinatura do autor. “O Lar” não é, frisa o diretor, nem um filme de super-heróis, embora a roteirista, Jane Goldman, seja a mesma de “X-Men: Primeira Classe”, e nem um novo take de um mundo mágico similar ao de um Harry Potter, com os vilões aqui representados por criaturas sombrias, canibalescas, comandadas pelo Barron de Samuel L. Jackson.

"Veja bem, as crianças todas do Lar não têm exatamente superpoderes, mas habilidades especiais, sem função específica. Por exemplo, um dos personagens tem abelhas vivendo dentro dele, outro tem uma boca na parte traseira da cabeça, não são poderes secretos. Mas eles aprendem a usar estas peculiaridades em benefício próprio, com a ajuda de Jake.

Burton apelidou a comandante do Lar, não por acaso, de uma “Mary Poppins assustadora”. Green diz que a mulher capaz de se transformar em um pássaro (novamente, sem grandes óbvias possibilidades de usar tal feito na batalha contra os vilões) é uma combinação estranha.

"Ela pode ser dura, seca, dá medo, é disciplinadora com as crianças, mas há uma razão de ser, já que se eles não repetirem todos os dias os mesmos eventos nas mesmas horas estarão expostos a perigos mortais".

Brasil

A trilogia nasceu da paixão de Riggs por fotos estranhas que encontra em lojas de antiguidade e exposições de colecionadores mundo afora. O paralelo com o universo cinematográfico de Burton é mesmo impressionante. O diretor, que preparou um livro caprichado com o registro das filmagens, das locações e de suas impressões sobre os personagens (inclusive seus celebrados desenhos de cenas), brinca que sua paixão pelo surrealismo foi muito bem alimentada este ano no Brasil. Ele esteve no início do ano no Rio, para um dia de Carnaval, e em São Paulo, por conta de sua exposição “O Mundo de Tim Burton”, que ficou em cartaz até junho no Museu da Imagem e do Som (MIS).

"Foi minha primeira vez no Brasil e me senti como se estivesse em um de meus universos, mais peculiar impossível. Além da energia das pessoas, os cenários foram todos mágicos. Em São Paulo, o grafite me deixou de queixo caído. Ao contrário de nossa fixação em limpar tudo, passar água, nos EUA, senti uma celebração da arte popular, genuína, nas ruas da cidade. Realmente adorei".