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No que "Blade Runner" acertou e errou ao prever os nossos tempos

Em "Blade Runner", Harrison Ford interpreta um homem conhecido por caçar androides no planeta Terra - Divulgação
Em "Blade Runner", Harrison Ford interpreta um homem conhecido por caçar androides no planeta Terra
Imagem: Divulgação

Do UOL, em São Paulo

01/10/2017 04h00

Clássico da ficção científica, “Blade Runner - O Caçador de Androides” (1982) está enfim ganhou sua sequência, o que vem causando comoção entre fãs do filme e do gênero. Não por acaso. O longa inspirado no romance do norte-americano Philip K. Dick lançado em 1968 influenciou gerações de cineastas e cinéfilos, exercendo forte influência no conceito e implicações da chamada "pós-modernidade".

Parte disso deve-se ao intrincado universo distópico desvelado na história original, que se passa em 2019 e lança mão de uma série de previsões tecnológicas e obscuras. Nem todas se concretizaram. Já que estamos a apenas dois anos do momento retratado, mostramos abaixo no que o cineasta Ridley Scott acertou e errou ao vislumbrar o futuro nos anos 1980.

Acertou

Cena de "Blade Runner" - Reprodução - Reprodução
Imagem: Reprodução

Chuva ácida

O fenômeno aparece com frequência em "Blade Runner". A chuva ácida já havia começado a ser estudada anos antes do filme, mas, até início dos anos 1980, era assunto praticamente restrito à pesquisa científica. Ela é causada pela presença de gases ricos em enxofre e azoto na atmosfera. A queima de combustíveis fósseis, que corresponde a 90% da poluição atmosférica nos Estados Unidos, é um agravante. O país hoje governado por Donald Trump, que recentemente saiu do Acordo de Paris sobre alterações climáticas, está tornando a chuva ácida uma ameaça real e ainda mais perigosa.

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Engenharia genética

Considerando os replicantes como clones, já que são produzidos a partir de tecido orgânico, o filme acertou ao prever que o homem um dia poderia reproduzir outros seres vivos. Após inúmeros testes, a materialização da clonagem veio em 1997, com o anúncio da ovelha Dolly. Com diversas implicações morais e religiosas, a reprodução do DNA humano é hoje uma realidade. Especula-se, inclusive, que já existam clones como você vivendo por aí. Com os avanços da engenharia genética, implantes cerebrais como os mostrados no filme também já são possíveis, visando estimular o sistema nervoso e aumentar a memória.

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Inglês perdendo espaço

A Los Angeles de "Blade Runner" é uma megalópole multicultural apinhada de imigrantes europeus e asiáticos, que tornaram correntes diversas línguas. O inglês perde espaço como idioma local (e global). Isso realmente está acontecendo hoje na cidade, principalmente com o aumento exponencial do número de pessoas que falam espanhol. Estima-se que mais de um terço da população de LA seja ou tenha origem latina, com mais de 4 milhões de falantes, contra 1,5 milhão em 1980. Nos EUA, eles já são cerca de 41 milhões.

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Reconhecimento de voz

Ao investigar o paradeiro de uma replicante, Deckard utiliza um escâner de imagem que funciona a partir de sua própria voz. Para analisar minuciosamente uma foto, ele não precisa de mouse. Basta dizer as palavras-chave que a máquina aproxima e distancia o foco, indo parar em qualquer direção desejada na imagem. Isso seis anos antes do lançamento do rudimentar Paintbrush. Atualmente, os comandos de voz são utilizados em diversos softwares de diversas plataformas, na televisão ao celular. O aplicativo Siri, o iPhone, é um dos mais populares do gênero. Essa tecnologia também já aparece na automação residencial, permitindo controlar luzes, portas e aparelhos eletrônicos por processamento sonoro.

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Fragilização das relações

O filme anteviu um mundo claustrofóbico e artificial, onde as relações —humanas ou não— encontram-se fragilizadas. A decadência ambiental catalisou uma grande transformação na forma como as pessoas se entendem. Relacionamentos como o dos personagens Deckard (Harrison Ford) e Rachael (Sean Young) são imprevisíveis, construídos de forma superficial. Trata-se de um amor virtual, quase como um consolo, incapaz de inspirar transformações pessoais e sociais. Sobreviver é mais importante. Alguma semelhança com a dinâmica dos nossos tempos?

Errou

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Carros voadores

Este é um sonho antigo do ser humano. Em “Blade Runner”, o detetive Rick Deckard utiliza um carro híbrido: ele pode rodar na rua e no ar. A maioria dos prédios possui seus helipontos (carropontos?). O investimento da indústria automobilística em carros voadores jamais acompanhou o ritmo da ficção científica. A previsão é que esse tipo de tecnologia comece a sair dos protótipos apenas a partir da próxima década, e não é garantido que a produção seja feita em grande escala. Há ainda limitações técnicas, científicas e legislativas. A Aeronáutica dificilmente permitiria que cada um pilotasse o próprio carro-avião, como é mostrado no filme.

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Colonização interplanetária

No cinema, uma catástrofe ambiental obrigou os humanos a deixarem a Terra em busca de uma vida minimamente digna. Os primeiros a zarpar foram os mais endinheirados, deixando para trás uma “escória” humana. Nessas colônias interplanetárias, os replicantes são usados como escravos. Tal colonização pode até não ser mais tratada como ficção por cientistas e astrônomos, mas ainda está muito longe de acontecer. O ser humano nem sequer pisou em outro planeta. Além disso, essa "mudança de ares" demandaria uma quantidade incalculável de dinheiro investido em pesquisa e tecnologia. A Terra precisaria estar sob risco iminente de extinção.

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Apogeu da inteligência artificial

Embora os replicantes de “Blade Runner” não sejam exatamente robôs, mas “humanos sintéticos”, a ideia de inteligência artificial é, sim, explorada no longa. Exemplo disso é o teste Voight-Kampff, que detecta se o ser é ou não “fake” a partir da dilatação da pupila após perguntas envolvendo empatia. Apesar do esforço dos cientistas e do notável sistema Watson, da IBM, ainda não há nada próximo disso. Provavelmente só existirá quando houver uma máquina que combine comportamento, linguagem e sentimento à mecânica do movimento humano.

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Megalópole americana/asiática

Los Angeles é retratada como uma megalópole asiática, repleta de grandes e inabitados edifícios e imensas propagandas de marcas estrangeiras em neon. A confusão nauseante de referências dá vida a uma espécie de Hong Kong do terceiro milênio. A violência está em cada esquina e, se você dominar só o inglês, terá dificuldade quando sair de casa. A poluição é tão forte que a luz solar simplesmente custa a aparecer durante o dia. Quando surge, ela é fosca e alaranjada. Apesar dos muitos problemas urbanos de LA, como o trânsito e a seca, a cidade não virou esse fim de mundo, assim como nenhuma outra nos Estados Unidos.

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Jornais impressos populares

Em um mundo sem o fetiche dos telefones celulares, Rick Deckard lê tranquilamente um jornal que noticia planos para a instalação de uma rede mundial de computadores. Como sabemos, a internet veio bem antes de 2019. Mas outro fato chama atenção na cena: o de o detetive buscar primeiramente a informação em um veículo impresso, formato que atualmente enfrenta a pior crise de sua história e que, segundo especialistas, deve desaparecer em uma década.