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Malick busca respostas existenciais em "A Árvore da Vida"

11/08/2011 13h24

SÃO PAULO (Reuters) - Em sua interrogação cósmica sobre a origem do universo e o sentido da vida humana, "A Árvore da Vida", vencedor da Palma de Ouro em Cannes em 2011, nunca esconde suas altas ambições.

Não há nada de se estranhar, recordando-se que o diretor Terrence Malick ("Além da Linha Vermelha") é formado em Filosofia pela Harvard e lecionou essa matéria no não menos prestigiado MIT, o Instituto de Tecnologia de Massachussets.
 
É um tipo de pensamento filosófico, portanto, que guia este roteiro, assinado como sempre por Malick, que situa em seu centro o personagem Jack (interpretado na maturidade por Sean Penn e na adolescência pelo excelente Hunter McCracken).
 
A narrativa, em boa parte, é uma viagem às memórias de Jack, que visitam particularmente a infância passada em Waco, Texas - não por acaso, o local onde cresceu o diretor, embora haja controvérsias se ele nasceu mesmo lá ou em Ottawa, Illinois.
 
Nessa infância, os protagonistas são a mãe (Jessica Chastain), o pai (Brad Pitt) e os irmãos menores, um dos quais morreu adolescente.
 
Essa morte do irmão assombra Jack e é um dos motores a levá-lo a uma indagação maior sobre o sentido do mundo e a existência de Deus, pois é certamente num mundo impregnado de cristianismo que ele cresceu.

Trailer de "A Árvore da Vida"

Mas, dentro de seu coração, lutam os dois caminhos que o filme aponta desde o começo como as margens do curso da vida: o caminho da graça (encarnado pela mãe) e o da natureza (simbolizado pelo pai).
 
Este microcosmo representado por esta família, que é um protótipo da América dos anos 50, mas não só - pode ser vista como um modelo de família de qualquer parte do mundo ocidental - é inserido no macrocosmo do mundo natural.
 
Assim, as imagens de "A Árvore da Vida" levam não só Jack como todos os espectadores a visualizarem uma viagem no tempo, à origem da vida no planeta, com direito à passagem dos dinossauros (que são os melhores e mais vívidos que o cinema já mostrou, superando com muitas vantagens os de "O Parque dos Dinossauros" de Steven Spielberg).
 
Em sua parte central, o filme divaga por esplêndidas imagens de natureza, como uma erupção do Etna, as geleiras da Antártida, os oceanos e diversos animais - que alguns jornalistas descreveram ironicamente como "momento National Geographic".
 
Ironia à parte, essas imagens fazem sentido dentro daquilo a que a história se propõe, reavaliar a trajetória de um homem, um homem qualquer, por suas perguntas sobre si mesmo e sobre a vida. Coisas que um Stanley Kubrick faria, e que Malick executa com maestria semelhante, embora numa chave bem distinta.
 
Se há um perigo a respeito de "A Árvore da Vida" é ser interpretado como um filme religioso, o que não é - muito embora Malick situe-se em território bem mais espiritualista do que Lars Von Trier e seu "Melancolia".
 
Sem dúvida, a religião faz parte da própria formação dos personagens - e não se esqueça que Waco foi o palco de uma tragédia de fundo religioso em 1993, culminando com a morte de 76 integrantes de uma seita fundamentalista cristã liderada por David Koresh.
 
Entretanto, se o filme de Malick tem algum fundo espiritual, ou seja, anseia explorar além da matéria, é muito mais filosofia do que religião. Mas sempre haverá quem pense o contrário, especialmente numa sequência em que Sean Penn revê os personagens de seu passado numa praia. Aí, porém, a psicanálise parece uma referência melhor.
 
"A Árvore da Vida" é um filme belo, intenso e raro, pelo arco que se dispõe a atravessar, pelas camadas de sentido que suas imagens quase hipnóticas conseguem desdobrar a cada visão - ao mesmo tempo que cria personagens de uma densidade impressionante, capaz de torná-los simbólicos e transcendentes, universais ao menos no hemisfério ocidental.
 
Uma façanha difícil de igualar, que justifica os longos anos gastos pelo recluso diretor em sua elaboração. (Neusa Barbosa, do Cineweb)
 
*As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb