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"Jimmy's Hall" resgata ativismo apaixonado do diretor Ken Loach

Do Cineweb, em São Paulo

05/08/2015 16h45

Voltando à Irlanda, agora em 1932 (dez anos depois do período retratado no drama "Ventos da Liberdade", que lhe deu a Palma de Ouro em Cannes em 2006), o diretor inglês Ken Loach entregou uma crônica fluente e encharcada de paixão não só pela ação política, como pelo gozo da vida em "Jimmy´s Hall". O filme estreia nesta quinta (6).

Era para ser a despedida do diretor inglês do cinema mas ele mesmo já avisou que repensou a ideia. Ainda bem. Porque o cinema mundial, e até o mundo mesmo, precisam da continuidade do trabalho de alguém como ele, um cineasta atento ao que é profundamente humano.

Em "Jimmy´s Hall", ele parte da história real do irlandês James Gralton (interpretado com energia por Barry Ward), uma mistura original de ativista socialista e pró-independência da Irlanda, fazendeiro e líder de um pequeno salão de danças comunitário.

O enredo decola em 1932, quando Jimmy volta à Irlanda, depois de alguns anos nos EUA, para cuidar da fazenda da família e da mãe. Seu irmão morreu enquanto ele esteve fora. É um tempo de desemprego, depois da quebra da Bolsa de Nova York em 1929.

Houve uma guerra civil na Irlanda, entre os partidários e os adversários da independência irlandesa, mas este é o momento depois do acordo, que parece promissor. Nesse contexto, Jimmy é estimulado pelos jovens de seu distrito, Leirim, a reabrir seu salão de danças que funciona em sua fazenda como um centro cultural, com cursos de dança e literatura, e também de organização política.

Esta ilha de convivência e liberdade incomoda o padre local, o velho pároco Sheridan (Jim Norton), que, como uma Inquisição regional, move uma implacável campanha a partir do púlpito contra o salão de danças e contra Jimmy que ele classifica como "comunista" e "anti-Cristo". 

Essa cruzada fundamentalista não é meramente religiosa. Trata-se de poder, já que a poderosa igreja irlandesa era um dos pilares da ordem dominante então, ao lado da polícia, da justiça, dos grandes proprietários de terra, dos nobres e do governo pró-britânico. A beleza do roteiro do habitual parceiro de Loach, Paul Laverty, está na maneira cristalina como desvenda esses mecanismos de poder, sem tirar nenhuma gota do brilho dos seres humanos neles envolvidos, dos dois lados.

Os personagens de Loach são de carne e osso e geram simpatia para que se possa torcer genuinamente por eles, como por Jimmy, sua amada Oonagh (Simone Kirby) que se casou no longo período em que ele viveu fora—, sua mãe, seus amigos e mesmo inimigos.

Os diálogos entre Jimmy e o padre Sheridan são duelos de pensamento entre dois adversários de respeito. Não há maniqueísmo aqui. Além disso, os pontos de contato daquela época com a nossa, pós-crise de 2008, são evidentes.

Não faltam o prazer, a alegria da música. Não só as melodias tradicionais irlandesas ecoam na tela, como o jazz, que veio na bagagem de Jimmy, trazendo discos e um gramofone às vezes, parece que se está num filme de Woody Allen. Mas é Ken Loach no seu melhor.

*As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb