Topo

ESTREIA-"Órfãos do Eldorado" traduz fantasia e crítica da obra de Milton Hatoum

11/11/2015 15h56

SÃO PAULO (Reuters) - Drama humano, fantasia e crítica social sustentam "Órfãos do Eldorado", primeiro longa de ficção do documentarista premiado ("Fala Tu" e "PQD") Guilherme Coelho. Estrelado por Dira Paes, Mariana Rios e Daniel de Oliveira, em atuações bastante comprometidas, o filme é baseado no livro homônimo escrito por Milton Hatoum.

Coelho faz aqui uma adaptação (ou "interpretação", como prefere colocar o escritor) bastante vívida da obra, aproveitando não apenas o talento do elenco, mas também o ambiente paraense, mostrando o fulgor amazônico, tal como a rusticidade das populações mais pobres ou ribeirinhas de Belém e arredores.

A fotografia, assinada por Adrian Teijido (de "O Palhaço"), aproveita a esplendorosa luz natural, contrastada ao tom mais sombrio dos barracos na beira do rio.

É nessa costura que o diretor imprime na tela as angústias do romance, com mudanças importantes, justificadas por sua vontade de reduzir a atmosfera criada por Hatoum em duas horas de experiência cinematográfica.

Suprime personagens e, no ambiente, insere crenças e mitos amazônicos. Mas deixa as memórias e a sempre presente crítica social em segundo plano, temas caros a Hatoum na composição de sua escrita.

Na história, Daniel de Oliveira é Arminto, que volta a Belém do Pará, rememorando sua infância com Florita (Dira Paes), que fazia as vezes de empregada e segunda mãe. Ela sempre teve um relacionamento sexual com o pai do garoto (Henrique da Paz), que aparentemente enriqueceu com o ciclo da borracha, explorando os mais pobres.

Há segredos nessas relações que perduram até o regresso de Arminto, mas que passam a ser explorados a partir da morte do patriarca, deixando o espectador com os mistérios, alguns deles míticos, dessa família. Principalmente nas lendas indígenas que Florita contava para Arminto quando criança, que ganham força no terceiro ato do filme.

Há no desenrolar da projeção uma sensação de decadência, excitação e de enlouquecimento, também presente no romance, que opera, aqui, em tom fabular, apesar de ser um melodrama, cujo roteiro é coassinado por Coelho e os excelentes Marcelo Gomes (de "Era uma Vez Eu, Veronica") e Hilton Lacerda (de "Tatuagem").

Para aqueles que possam torcer o nariz para a versão do livro para os cinemas, vale lembrar que o escritor deu sua completa aprovação à obra, chegando a atuar na produção, em uma pequena, mas simbólica, participação especial. Ele é o pescador que oferece seu peixe ao amigo, tal como aquele que ofereceu sua literatura a Coelho.

(Por Rodrigo Zavala, do Cineweb)