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65o. Festival de Veneza - 2008

04/03/2006 - 13h01
Tempo de Oscar: Favoritos e azarões: façam suas apostas
AMIR LABAKI
Especial para o UOL

Tudo parecia avançar como a previsibilidade das premiações anteriores da noite quando o sardônico Jack Nicholson assombrou a festa ao anunciar "Crash - No Limite" como o grande vencedor do Oscar 2006.

O espanto que sacudiu o Kodak Theater espelhava a surpresa diante tanto do triunfo do drama polifônico de Paul Haggis sobre as tensões raciais na Los Angeles atual quanto da derrota do favoritíssimo melodrama "gay" "O Segredo de Brokeback Mountain", que acabara de valer a Ang Lee o Oscar de melhor diretor e a Larry McMurtry e Diana Ossana o de melhor roteiro adaptado.

A última grande surpresa na escolha da Academia para o prêmio principal
datava de 1999, quando o romântico "Shakespeare Apaixonado", de John Madden, batera o patriótico "O Resgate do Soldado Ryan". de Steven Spielberg. Mesmo lá não houve a superação de um favoritismo tão nítido.

Então por que "Crash" venceu? Os membros da Academia parecem ter ouvido os sons de seus cotidianos nas ruas de Los Angeles, onde está baseada a imensa maioria deles. "Crash" é um filme mosaico que acompanha um grande número de personagens de diferentes etnias unidos pela violência dos preconceitos cruzados e dos imensos desafios sociais para sobreviver na América de Bush.

Entre dois chamados pela tolerância com as minorias, os votantes da Academia reagiram na última hora em favor do mais amplo.

"Crash" representava ainda a única produção independente dos grandes
estúdios na disputa. Sua realização, que marca a estréia na direção do
canadense Haggis, um veterano como produtor e diretor de telesséries,
derrotado na disputa pelo Oscar como roteirista de "Menina de Ouro" no ano passado, só se tornou possível quando astros do porte de Sandra Bullock, Matt Dillon, Don Cheadle e Thandie Newton embarcaram no projeto aceitando co-estrelá-lo por frações de seus salários habituais.

Ecos de seu empenho se fizeram sentir um mês atrás quando "Crash" bateu "O Segredo de Brokeback Mountain" no prêmio de conjunto de elenco na Associação dos Atores. Foi seu isolado triunfo corporativo, com "Brokeback" vencendo os prêmios das associações de diretores e produtores. Seu favoritismo antes arranhado parecia firmemente restabelecido. Ledo engano.

O conjunto de indicações da Academia apontou uma forte preferência por
filmes de temas fortes e questões candentes, relegando ao plano secundário das categorias técnicas as enormes produções populares que sustentam os grandes estúdios hollywodianos. Também estas receberam seu justo reconhecimento, com os três prêmios para "King Kong" (efeitos visuais, mixagem de som e edição de som) e "Memórias de uma Gueixa" (direção de arte, direção de fotografia e figurino).

"Crash" e "Brokeback Mountain" também acumularam três premiações,
respectivamente, melhor filme, roteiro adaptado e montagem e melhor diretor, roteiro original e trilha musical. Mas o drama de Paul Haggis acabou sendo reconhecido como o título mais sintonizado com o chamado por conscientização política e social na pauta da hora da comunidade cinematografia americana.

Há ainda imensa ressonância poética entre a vitória do quebra-cabeças
dramático de Haggis e a entrega do Oscar honorário ao mestre dos mestres nessa estrutura fílmica fragmentada: Robert Altman.

As vitórias nas categorias de interpretação foram lógicas e justas: Philip Seymour Hoffman no papel de sua vida como "Capote" e a legalmente loira Reese Witherspoon, provando ter também voz dramática em "Johnny e June".

George Clooney mereceria mais que o Oscar de coadjuvante por "Syriana", mas abriu a festa recolhendo com charme seu prêmio e cumpriu pelo resto da noite, com o carisma habitual, o papel de grande símbolo da Hollywood
neo-engajada deste ano. Rachel Weisz, por sua vez, era a heroína do ano e fez por merecer seu prêmio de atriz coadjuvante em "O Jardineiro Fiel".

Tudo se eclipsou, contudo, frente à virada final. Um assalto à mão armada de que Paul Haggis fora vítima nas ruas de Los Angeles em 1991 provocou-lhe o pesadelo que catalisou em 2000 o roteiro de "Crash". Ontem o sonho ruim virou bom. Isto é Hollywood.
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