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Filme estrelado por Tilda Swinton usa massacre em escola como pano de fundo para retratar mãe do assassino

CARLOS HELÍ DE ALMEIDA

Colaboração para o UOL, de Londres

17/10/2011 15h09

Massacres em escolas e universidades orquestrados por jovens e estudantes estão se tornando um tipo de tragédia comum nos dias de hoje. Mas a diretora escocesa Lynne Ramsey estava mais interessada em explorar outras questões que poderiam decorrer do fenômeno quando decidiu adaptar o best-seller “We Need To Talk About Kevin”, de Lionel Shriver, que descreve o estado mental de uma mulher que perdeu o trabalho, a família e o respeito da comunidade depois que o filho matou colegas da escola onde estudava. Estrelado por Tilda Swinton, o filme está na programação do Festival do Rio 2011 e tem sua última sessão na noite desta segunda-feira (17), às 20h10, no Estação Vivo Gávea 2.


“Vários outros filmes já tentaram entender as causas de tragédias semelhantes, como a ocorrida naquela escola da cidade de Columbine, nos Estados Unidos, livremente reconstituída em ‘Elefante’ (2003), de Gus Van Sant, ou mesmo em ‘Tiros em Columbine’, de Michael Moore. Dizem até que filmes como ‘Elefante’ inspiraram novos massacres. Mas o que me interessou no livro de Shriver foi a originalidade com que ela aborda o tema, porque ela fala sobre os sobreviventes desses crimes. Também fiquei fascinada pela natureza da história, que tem como protagonista uma mulher que nunca se sentiu preparada para ter filhos, e o seu primogênito vira um criminoso”, contou a diretora nesta segunda (17), durante a coletiva de imprensa do filme no 55º Festival de Londres, que acontece de 12 a 27 de outubro.

O peso da história recai sobre os ombros da atriz Tilda Swinton (ganhadora do Oscar de coadjuvante por “Conduta de Risco”, de 2008), que aparece em cada quadro do filme. “O envolvimento de Tilda foi essencial para a realização deste projeto, que tem um escopo financeiro muito modesto e ainda  foca em tema muito obscuro, difícil de ser vendido”, explicou a diretora, que começou a chamar a atenção dos festivais estrangeiros com “O Romance de Morvern Cellar”, seu segundo longa, exibido no Festival de Cannes de 2002. “A princípio, resisti um pouco diante da ideia de vê-la como a mãe de Kevin, pois a imagem que eu tinha de Tilda está ligada a papéis exóticos, como ‘Orlando’, ou coisas do tipo, nunca no papel de mãe de família. Ela acreditava na importância da história que queríamos contar, até se ofereceu para fazer testes, imagina! ‘Você é a Tilda Swinton, não precisa dessas coisas’, eu respondia”.

TRAILER DO FILME "WE NEED TO TALK ABOUT KEVIN"


Tilda interpreta Eva, uma mulher bem-sucedida no trabalho, que demonstra desconforto com a gravidez e imensa incapacidade de estabelecer uma ligação mais profunda com o primeiro filho. “O livro descreve uma maternidade falida. Nem todas as mulheres nasceram com o dom natural para a maternidade, e isso ainda é um tabu”, observou a atriz escocesa, que é mãe de duas gêmeas, durante o Festival de Cannes (maio), onde “We Need To Talk About Kevin” concorreu pela Palma de Ouro – Tilda não veio divulgar o filme em Londres por causa do aniversário das filhas. “A ideia de ter filhos sempre me encantou mas, até mesmo depois que tive as minhas filhas, cheguei a ter dúvidas se seria capaz de lidar com essa situação. Essa dúvida aterroriza até mesmo as mães natas”.
 
O filme é contado a partir de fragmentos da memória de Eva, já vivendo sozinha numa casa caindo aos pedaços, hostilizada pelos vizinhos. Enquanto reúne forças para arranjar um emprego em uma agência de turismo local – ela era uma empresária bem-sucedida no ramo antes da tragédia – ela relembra um pouco de sua história pessoal, tentando descobrir onde falhou, até o confronto final com o filho frio e distante, interpretado pelo americano Ezra Miller. “Kevin poderia ser um papel difícil para um ator que não fosse psicologicamente sombrio mas, para mim, foi facílimo, uma experiência fantástica”, brincou Miller em Londres. Por razões financeiras, o longa-metragem foi rodado nos arredores de Nova York. “O câmbio americano era mais favorável ao nosso projeto, que é ultraindependente. Mas é um caso que poderia ser ambientado em qualquer parte do mundo”, observou a diretora.
 
*O jornalista viajou a convite do Festival de Londres