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Sob batuta de Ben Affleck, "Argo" reproduz tensão de resgate "cinematográfico" no Irã

Cena de "Argo", filme dirigido e estrelado por Ben Affleck - PictureLux/Brainpix
Cena de "Argo", filme dirigido e estrelado por Ben Affleck Imagem: PictureLux/Brainpix

Mário Barra

Do UOL, em São Paulo

08/11/2012 21h54

Um agente da CIA com sobrenome espanhol resgata diplomatas norte-americanos aprisionados no Irã durante uma operação que glorifica o Canadá. O que poderia ser o enredo de uma novela transcontinental resultou no filme “Argo”, terceiro longa dirigido pelo ator Ben Affleck, que estreia nesta sexta-feira (9) nos cinemas brasileiros.

Mas a salada de frutas de nações envolvidas não é o maior trunfo da história. Mais incrível ainda é ela ser baseada em fatos reais, ocorridos em 1980, pouco depois da invasão da embaixada norte-americana no Irã por revolucionários, durante o auge da revolução que levou o aiatolá Khomeini ao poder.

Com o país sob constante vigília dos novos detentores do poder, avessos a qualquer ligação com os Estados Unidos, um grupo de seis diplomatas norte-americanos conseguiu escapar com a ajuda de Tony Mendez, um especialista em resgates que escreveu um livro a respeito da operação, que permaneceu em segredo por intervenção da agência de inteligência norte-americana até o mandato de Bill Clinton, quando a história foi revelada em 1997.

De acordo com o livro que dá nome ao filme, os boicotes do governo norte-americanos pouco surtiram efeito na posição política rígida do Irã no início da Revolução. Desligada de compromissos assumidos em acordos internacionais, a nação asiática era encarada como um caso "alienígena" pelos diplomatas norte-americanos: era um mistério o caminho para negociar com um grupo político sem medo de embargos comerciais, quedas nas vendas de petróleo e nem mesmo da ameaça de intervenção militar por parte dos Estados Unidos.

Se a sensibilidade iraniana não é abalada sequer pelo imponente exército norte-americano, o que esperar da piedade dos governantes locais quando um grupo de seis diplomatas se vê "perdido" no país, sem a perspectiva de resgate, salvos da perseguição política por se abrigarem na casa do embaixador canadense? Tony Mendez recorreu a Hollywood para sanar a questão. Ele não procurava algo para sensibilizar as autoridades iranianas. Pelo contrário, o agente queria um plano para tirar os compatriotas a salvo do Irã, sem serem notados.

A solução não poderia ser mais engenhosa: disfarçar o grupo a ser resgatado como produtores de cinema, todos membros de um filme falso chamado "Argo", uma produção com roteiro de naves espaciais e alienígenas.

A lógica de Mendez era sofisticada, apesar de simples. Os iranianos poderiam descobrir qualquer outro tipo de plano de camuflagem e colocar a vida de todos -- inclusive do agente da CIA -- em risco. Para convencê-los, era necessário algo extraordinário, que os revolucionários não conseguiriam decifrar. O que seria melhor que isso do que o comportamento extravagante da indústria cinematográfica de Hollywood.

Com a ajuda do produtor Lester Siegel (Alan Arkin) e do maquiador John Chambers (John Goodman), Mendez conseguiu montar a estrutura necessária para se fazer um filme. Até anúncio na revista especializada "Variety" o trio conseguiu emplacar.

TRAILER LEGENDADO DE "ARGO", FILME DIRIGIDO POR BEN AFFLECK

A interação entre os iranianos, civis ou militares, e os diplomatas disfarçados como produtores do filme rende os momentos mais interessantes e tensos do longa. O nervosismo pelo risco do disfarce cair por terra ou mesmo o choque de culturas e realidades são retratados com riqueza no filme, embora seja possível notar algum traço de caricatura no retrato dos iranianos, sobressaltados demais durante o filme inteiro.

O visual é outro trunfo do longa, com destaque às costeletas e bigodes típicos da cultura da época, mas sem exageros. O próprio Affleck disse em entrevista que este era um dos objetivos ao recontar a história camuflada pela agência de espionagem norte-americana até 1997, durante o mandato de Bill Clinton.

Affleck parece ter alcançado a maturidade como diretor, após assinar os filmes "Medo da Verdade" (2007) e "Atração Perigosa" (2010). Com um filme que mistura uma boa dose de tensão com um retrato político adequado para o objetivo do filme, o ator lança um filme capaz de concorrer à 85ª edição do Oscar e que já recebeu elogios da crítica especializada e boa recepção em festivais de cinema como o do Rio de Janeiro e o de Toronto, no Canadá.