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"A Estrada" adapta livro premiado de Cormac McCarthy

Cena do filme "A Estrada", com Viggo Mortensen no papel principal - Divulgação
Cena do filme "A Estrada", com Viggo Mortensen no papel principal Imagem: Divulgação

22/04/2010 17h59

SÃO PAULO (Reuters) - Produção norte-americana dirigida pelo australiano John Hillcoat, "A Estrada" mirou num apocalipse futurista, mas investiu muito de sua energia na relação de amor entre um pai (Viggo Mortensen, de "Um Homem Bom") e um filho (o adolescente australiano Kodi Smit McPhee). O filme estreia em circuito nacional.

O enredo baseia-se no livro homônimo, assinado pelo escritor norte-americano Cormac McCarthy (autor de "Onde os Fracos não Tem Vez", filmado por Ethan e Joel Coen) e que venceu o prêmio Pulitzer.

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A história combina uma dramaturgia máxima a um argumento mínimo. Num tempo futuro indeterminado, uma catástrofe ambiental de proporção planetária varreu a natureza. Terremotos, incêndios e temporais se sucedem, ao mesmo tempo em que a atividade econômica se interrompe, bem como toda vida social.

Ilhada nestes tempos obscuros, uma família, formada por uma mulher (Charlize Theron, de "Terra Fria"), um pai (Viggo Mortensen) e seu filho (Kodi Smit McPhee), sobrevivem como podem. Até que ela perde a esperança. Mais tarde, somente o pai e o filho são vistos juntos, perambulando por estradas devastadas e perigosas, infestadas de gangues canibais.

O destino da mãe só é revelado mais adiante. Com ecos de outros filmes mais ou menos recentes abordando diversos tipos de apocalipse - como "Extermínio", de Danny Boyle, "Eu Sou a Lenda", de Francis Lawrence, e "Ensaio sobre a Cegueira", de Fernando Meirelles - o filme de Hillcoat tem energia e personalidade, embora claramente não seja fácil de assistir.

A tensão que "A Estrada" produz no espectador é genuína. É o tipo de filme que se assiste com os sentidos acesos e o coração apertado. E sustenta com força sua única premissa - o que será deste pai e deste filho, procurando manter um mínimo de amor e de ética num mundo em que a sobrevivência se tornou o único desafio?

Uma outra atração está nas pontas de alguns atores conhecidos - caso do veterano Robert Duvall ("Os Donos da Noite") e do australiano Guy Pearce ("Amnésia"), quase irreconhecíveis debaixo de pesada maquiagem.

O próprio Cormac McCarthy, que costuma torcer o nariz para a maioria das adaptações cinematográficas de seus livros, deu sua benção a esta ótima versão, que nasceu de uma aposta arriscada. O diretor australiano Hillcoat ("A Proposta") e o roteirista Joe Penhaal, apesar de ser um dramaturgo premiado (pelo texto Laranja Azul, montado no Brasil), não eram considerados primeira linha em Hollywood.

O status da história também era, a princípio, bem mais low profile. Quando o roteirista Penhall começou a adaptar o livro para o cinema, ele sequer havia sido publicado. Um ano depois, com a produção pelo caminho, já havia se tornado popular o bastante para ser mencionado como obra de cabeceira da notória apresentadora Oprah Winfrey.

Uma condenação de McCarthy ao filme sepultaria, provavelmente, o futuro cinematográfico de diretor e roteirista. Penhall descreve, num saboroso artigo publicado em janeiro pelo jornal inglês "The Guardian", a expectativa que cercou a exibição prévia do filme para o escritor num estúdio, em Albuquerque.

Uma expectativa que só se desfez quando o escritor decretou: "É muito bom, mesmo." Segundo Penhall no mesmo artigo, McCarthy aprovou inclusive a narração em off, que havia sido tema de disputa entre Hillcoat, Viggo Mortensen - contra a narração - e o roteirista e Nick Cave, autor da trilha musical, os dois a favor.

Penhall venceu e, a bem da verdade, a narração é uma das raras do cinema moderno que não é redundante nem opressiva. Cai bem no contexto desesperançado da história, delineando a resistente ternura que permeia todo o relato.

(Por Neusa Barbosa, do Cineweb)

* As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb