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"Trabalho Interno" disseca crise de 2008 e disputa Oscar

17/02/2011 12h08

Se alguém procura um mapa da crise econômica mundial que, em 2008, sacudiu mercados, sugou trilhões de dólares em riqueza, causou a falência de grandes instituições financeiras, o desemprego de milhões de pessoas e uma instabilidade sem precedentes em vários países, ele está no documentário "Trabalho Interno", de Charles Ferguson. O filme entra em cartaz em São Paulo e Rio de Janeiro.

Premiado com o troféu de melhor roteiro de documentário pelo Sindicato dos Roteiristas dos EUA e concorrente ao Oscar de documentário, o filme chama a atenção, desde o início, pela solidez de sua pesquisa. Lidando com um tema complexo, diversas entrevistas e materiais de arquivo, o filme consegue ser claro e incisivo ao mesmo tempo.

Autor de outro documentário igualmente contundente, "No End in Sight" (2007), que abordou as razões do governo George W. Bush para a guerra do Iraque, o intelectual, ex-palestrante de universidades como Berkeley e o MIT (Instituto de Tecnologia de Massachussets), e milionário da indústria do software desde os anos 1990, Ferguson mostra-se um entrevistador altamente preparado - e não raro corrosivo para desavisados, como o ex-assessor de George W. Bush, Glenn Hubbard.

TRAILER DO FILME "TRABALHO INTERNO"

Conciso, didático e detalhado, o filme explica como diversos bancos norte-americanos promoveram agressivamente o financiamento e refinanciamento de hipotecas, mesmo para aqueles que claramente não podiam pagá-las, ao mesmo tempo em que especulavam em cima desse não-pagamento, com lucros astronômicos.

Enquanto crescia a bolha da ciranda financeira, lobistas se empenhavam junto a políticos para que não se aprovasse nenhuma legislação dificultando seus movimentos - mantendo a desregulamentação iniciada nos anos 1980, com o presidente republicano Ronald Reagan, mantida pelo democrata Bill Clinton, na década de 1990.

Não por acaso, negaram entrevistas ao cineasta alguns dos arquitetos e defensores do modelo especulativo que quebrou bancos como Goldman Sachs e Lehman Brothers - caso dos ex-secretários do Tesouro Larry Summers, Robert Rubin, Henry Paulson e Timothy Geitner, vistos apenas em imagens de arquivo.

É ouvido também um dos poucos a ter enfrentado os mega-especuladores, o ex-procurador geral e depois governador de Nova York, Eliot Spitzer.

Por muitas razões, "Trabalho Interno" é um filme realisticamente sombrio. Primeiro, porque denuncia que os idealizadores destas operações de alto risco fizeram-no deliberadamente - o que constitui crime, ainda não punido. Segundo, porque vários deles continuam assessorando o governo atual de Barack Obama.

Finalmente, porque a universidade, que deveria oferecer um contraponto crítico, ao invés disso foi cooptada, com vários de seus eméritos professores aceitando cargos em conselhos diretores das empresas especuladoras, como consultores do governo ou palestrantes pagos regiamente com milhares e milhares de dólares.

(Por Neusa Barbosa, do Cineweb)

* As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb