Alberto Ammann (Lope de Vega) e Sonia Braga em cena do filme ''Lope''
Foram quatro anos de dedicação quase exclusiva, durante os quais o carioca Andrucha Waddington mergulhou de corpo e alma no universo do poeta e dramaturgo Félix Lope de Vega (1562-1635), um dos mais prolíficos escritores da Espanha. Já exibido em Veneza e Toronto, o drama de época "Lope", o resultado desse esforço, ganha sua primeira projeção hoje, às 21h30, no Cine Odeon, como uma das sessões de gala do Festival do Rio.
"Fiz um trabalho de imersão para entender a obra deste dramaturgo, as características do chamado Século de Ouro espanhol e os costumes daquela época", lista o diretor de 40 anos, que tem em seu currículo títulos como "Eu, Tu, Eles" (2000) e "Casa de Areia" (2005). Com participações especiais dos brasileiros Selton Mello e Sônia Braga, "Lope" chega ao circuito comercial em 26 de novembro.
Por se tratar de uma coprodução com a Espanha sobre um artista espanhol, a nacionalidade de Andrucha chegou a causar certa polêmica. "Acima de tudo, Lope é um filme como tantos outros de língua estrangeira dirigidos por brasileiros", defende Waddington. "Minha nacionalidade é a nacionalidade do roteiro que estou trabalhando em determinado momento. E, como só trabalho com os melhores roteiros, sempre mostro o melhor de uma nacionalidade".
Embora menos conhecido que Miguel de Cervantes, Lope de Vega ficou famoso pela quantidade e abrangência de sua obra. O próprio autor de "Dom Quixote" o apelidou de "monstro da natureza" em função da assustadora energia produtiva do conterrâneo, que escreveu 800 peças de teatro, 300 sonetos, três romances, quatro novelas e nove poemas de fôlego épico. "Acho que o público brasileiro vai ter a possibilidade de conhecer um mundo distante da nossa cultura, mas com sentimentos extremamente universais e contemporâneos", analisa Waddington.
A paixão de Lope de Vega pelo trabalho só é comparável à sua reputação como conquistador de mulheres. Levou uma vida que poderia ser lida como um livro de aventuras. No filme, o soldado Lope de Vega volta a Madri e descobre-se interessado por teatro. Logo junta-se ao mais famoso grupo da cidade e se envolve romanticamente com Elena (Pilar López de Ayala), a filha do dono da companhia, que é casada.
O escândalo acaba com a estreia de sua primeira peça como autor e Lope foge para Lisboa com a amiga de infância Isabel (Leonor Watling), por quem nutre uma velada paixão. Uma primeira versão do roteiro foi apresentada a Waddington ainda em 2005 pelo roteirista Jordi Gasul e pela produtora Iona de Macedo, ex-executiva da Columbia Pictures do Brasil.
"Eles haviam assistido à ‘Casa de Areia’, meu filme anterior, no Festival de Berlim, e estavam procurando alguém que pudesse ver o personagem com olhar fresco, sem ideias preconcebidas sobre o mito espanhol", conta o diretor. O dramaturgo é interpretado pelo até então desconhecido ator argentino Alberto Ammann, que ganhou o Goya (o Oscar espanhol) de melhor ator deste ano pelo filme "Cela 211". " Buscávamos um rosto ainda não muito conhecido, porque Lope, no período em que o filme se passa, também não era famoso", explica.
"Lope" consumiu cerca de 13 milhões de euros (em torno de US$ 16 milhões) e foi rodado em locações na Espanha e na cidade de Essaouira, na costa do Marrocos. A projeção internacional é certa, mas Andrucha não pensa em investir numa carreira fora do Brasil. "’Lope’ é o meu filme mais recente, pelo qual tenho muito amor e carinho. Quanto ao futuro, tenho alguns projetos em desenvolvimento, mas nunca pensei em termos de carreira, mas no filme seguinte", avisa.