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Filme de filho de Glauber Rocha gera polêmica em festival francês

Cena do documentário "Transeunte", de Eryk Rocha (2010) - Divulgação
Cena do documentário "Transeunte", de Eryk Rocha (2010) Imagem: Divulgação

30/09/2011 13h59

BIARRITZ, França, 30 Set 2011 (AFP) - O filme "Transeunte", de Eryk Rocha, filho de Glauber Rocha, provocou polêmica no Festival de Biarritz, onde algumas pessoas criticaram sua maneira de filmar e outros consideraram que anuncia um grande cineasta.

O primeiro longa-metragem de ficção do filho do símbolo do Cinema Novo, que disputa o grande prêmio do festival, retrata, em grandes planos e em preto e branco, o renascer de um homem, Expedito, um aposentado solitário que vaga pelo Rio de Janeiro.

"Não gostei, é muito lento. Rocha filma muito de perto, dá para ver os poros da pele do protagonista, as bolsas sob os olhos", criticou a espectadora Lucille Arthaud, para quem as imagens "lembraram demais o que vejo no espelho a cada manhã".

"Não acontece nada, não há uma história, não há diálogos", reclamou uma aluna de uma escola secundária de Biarritz, balneário do País Basco francês.

Mas para o crítico Thierry Garrel, a proposta de Rocha é "inovadora, poética, com uma estética muito original".

"Gostei muito de 'Transeunte', e acredito que anuncia o nascimento de um grande cineasta", disse Garrel.

"No total, 15 a 20% do público deixou a sala, mas isto não importa. Não é um cinema de ação igual a tantos outros, mas que tem uma grande audácia narrativa, e isto representa um verdadeiro desafio para o espectador", completou.

Ao ser questionado pela AFP sobre as críticas após a exibição de seu filme, Rocha afirmou ter consciência de que seu filme "não é fácil".

"Minha maneira de filmar reflete minha maneira de sentir o mundo. Não me interessa reproduzir uma gramática de cinema já estabelecida, esta não é a forma como eu sinto o mundo", explicou o diretor de 33 anos.

"Eu busco um afastamento da narrativa convencional, da linguagem convencional. Se filmo tão de perto é porque quero colocar o espectador na pele do protagonista, quero que sinta sua respiração, que entre em suas sensações".

"Não é um filme sobre um homem, é com um homem, acompanhando-o em seu percurso, sentindo suas sensações, vivendo sua paulatina transformação, ajudado pela música, que o ajuda a renascer", completou.

O jovem cineasta, que tinha apenas três anos quando o pai faleceu, disse que a mãe, a artista plástica colombiana Paula Gaitán, é sua grande influência na visão estética.

"Meu pai é um prazer, um orgulho, uma inspiração através de seus filmes, mas ele não pesa na minha decisão de fazer este tipo de cinema", disse Eryk Rocha.

"Foi minha mãe quem me influenciou, que me formou esteticamente".

"Para mim, o cinema é uma materialização de como você sente o mundo, e eu o sinto em imagens e sons", declarou, antes de enfatizar que considera que "a arte tem a obrigação de criar, e de criar polêmica".

"Mas no Brasil, o cinema agora está muito influenciado pela televisão, praticamente só há espaço para o cinema comercial", criticou.

"Mas existe uma nova geração de cineastas brasileiros, com entre 25 a 35 anos, que está emergindo com muita força, com filmes muito pessoais, com uma busca estética muito forte, alimentada pela relação com o mundo e pela realidade brasileira", concluiu Rocha, com um tom mais otimista.

O Festival de Biarritz, que celebra o cinema da América Latina, termina no sábado com o anúncio da premiação.