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"Por quê olhar para Marte quando tenho todas estas histórias na minha família?", diz autora de "Frango com Ameixas"

"Frango com Ameixas", de Marjane Satrapi e Vincent Paronnaud, é baseado em uma história em quadrinhos de Satrapi e repete a parceria de "Persépolis" (2007)  - Divulgação
"Frango com Ameixas", de Marjane Satrapi e Vincent Paronnaud, é baseado em uma história em quadrinhos de Satrapi e repete a parceria de "Persépolis" (2007) Imagem: Divulgação

Laura Serrano-Conde

06/02/2012 09h55

Após surpreender os amantes da história em quadrinhos com sua joia literária, "Persépolis", a iraniana Marjane Satrapi retorna ao cinema em "Frango Com ameixas", um romance sobre um homem que perdeu a vontade de viver.

A história também foi levada ao cinema pela escritora e por Vincent Paronnaud, num filme com personagens em carne e osso que foi apresentado no Festival de Cinema de Veneza em 2011.

Tal como em "Persépolis", em que Satrapi conta a história de uma menina imersa em plena revolução islâmica, a escritora utiliza suas lembranças familiares e viaja pelo Irã para contar uma fábula sobre um amor impossível.

"Tenho uma família enorme e quando era menina passei muito tempo com os mais velhos. Adorava quando me contavam histórias, e normalmente escrevo sobre coisas que me interessam", explica Satrapi em Veneza, durante uma entrevista a um reduzido grupo de jornalistas.

Histórias familiares "bastante extremas", reconhece a escritora que se pergunta: "Por quê olhar para Marte quando tenho todas estas histórias na minha família? São minha fonte de inspiração".

"Frango Com Ameixas" se situa na Teerã de 1958 e apresenta Nasser Ali Khan, um virtuoso alaudista e pai de família que, depois de sua mulher ter quebrado seu alaúde em uma briga, se esforça para encontrar outro igual.

Ao longo das páginas, o leitor descobre por que o instrumento se transformou em algo tão importante para ele e a razão que o levaria à morte caso não encontrasse outro que o preencha da mesma maneira.

Embora "Frango Com Ameixas" tenha certa carga política, as relações pessoais e os conflitos internos se sobressaem e convidam o leitor a refletir sobre o que acontece quando o ser humano se condena a viver no passado e não segue em frente.

Assim, a autora descreve com todos os detalhes a angústia, o desespero e a perda da esperança vividos nos oito últimos dias de um homem que se resignou a morrer.

Na realidade, é a história do tio-avô de Satrapi, que já apareceu em "Persépolis", mas que aqui é o protagonista.

Era um músico que morreu de tristeza, ou pelo menos isso é o que contam na família da autora, que adora as histórias "novelescas, que não são manchadas pelo cinismo de hoje", diz.

"É importante poder morrer de amor, crer que esse tipo de coisas possam acontecer. Isso não existe no mundo de hoje, no qual há menos poesia, menos amor pela arte e pela beleza. Pode ser que necessitemos de mais imaginação e menos de realidade", reflete a autora.

"Frango Com Ameixas" é um melodrama tingido de humor, porque "a vida está feita de momentos patéticos, mas nos piores momentos da vida sempre há hora para o riso. Nunca há absoluta tristeza nem absoluta alegria", assegura Satrapi.

A história em quadrinhos, dividida em nove capítulos, continue o modelo de narração linear, embora com diversas voltas ao passado que desvendam segredos da personalidade de Nasser, como, por exemplo, como era a relação com sua família ou por que "Frango Com ameixas" é o título do livro.

Quanto à técnica, os desenhos são integralmente em preto e branco, sem tonalidades intermediárias, nem sequer o cinza, e com uma estética muito esquemática, que fornece simplicidade à narração e, ao mesmo tempo, dá aos personagens uma grande expressividade e força.

Após o sucesso da adaptação de "Persépolis" em 2007, com indicação ao Oscar de melhor filme de animação, Marjane Satrapi voltou para trás das câmaras para dirigir, junto a Vincent Paronnaud, outro de seus romances.

"Frango Com Ameixas" é protagonizado por Mathieu Amalric, Golshifteh Farahani e Maria de Medeiros. Um filme que abandona a animação, mas para o qual os diretores optaram por uma estética de conto para conseguir uma imagem naïf e irreal.