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Caso de estupro do diretor de "Birth of a Nation" abala trajetória do filme

David Villafranca

Los Angeles (EUA)

29/08/2016 15h12

Tudo indicava que seria um dos filmes do ano, mas terminou provocando polêmica por motivos nada cinematográficos: um antigo caso de estupro que envolveu o diretor e a estrela de "The Birth of a Nation" causou uma grande controvérsia em Hollywood e ameaça a, até agora, a meteórica carreira da produção.

Nas últimas semanas, os veículos de comunicação americanos recuperaram o caso de estupro de uma jovem que aconteceu há 17 anos e pelo qual foram acusados o diretor e protagonista do filme, Nate Parker, e seu roteirista, Jean Celestin.

Embora Parker tenha sido absolvido das acusações, novas revelações do caso eclipsaram o lançamento do filme, que estreará no dia 7 de outubro nos Estados Unidos após ser a sensação absoluta da última edição do Festival de Cinema independente de Sundance e já como firme candidato ao Oscar, especialmente por seu importante conteúdo racial.

Os fatos remontam a 1999, quando uma jovem, de entre 17 e 18 anos e cuja identidade é mantida em segredo, acusou Parker e Celestin, então estudantes universitários em Penn State, de a terem violentado quando estava inconsciente após ter bebido.

Os dois negaram as acusações de estupro e argumentaram que a relação sexual foi consentida.

O diretor Nate Parker posa durante o Festival de Sundance - Getty Images - Getty Images
O diretor Nate Parker posa durante o Festival de Sundance
Imagem: Getty Images
Parker, que previamente tinha mantido relações sexuais com a garota que ambas as partes definiram como pactuadas, foi absolvido no julgamento, enquanto Celestin foi condenado inicialmente, mas ganhou a apelação uma vez que a vítima se negou a testemunhar em uma nova audiência.

O site especializado "Variety" revelou agora, após falar com o irmão da jovem, que esta se suicidou em 2012 com uma overdose de soníferos.

O "Variety" afirmou que não há provas que relacionem diretamente o suicídio da mulher com o caso, enquanto o irmão declarou que a jovem sofreu de uma grave depressão após o incidente.

Durante o julgamento, a jovem afirmou que tinha tentado se suicidar duas vezes após o estupro.

O tempo todo, e em qualquer declaração sobre este tema, Parker disse que é inocente e, em mensagem publicada em seu perfil no Facebook depois que o caso voltou à tona, ressaltou de novo que oa relação sexual foi "inequivocamente pactuada".

"Não posso nem quero ignorar a dor que ela sofreu durante e depois do julgamento", disse Parker, afirmando que tinha sabido recentemente da morte da mulher e que se sentia "profundamente triste" com isso.

A controvérsia já alterou os planos comerciais de "The Birth of a Nation", um filme que recebeu elogios quase unânimes da crítica e que narra a história da sublevação negra e o movimento de libertação protagonizado pelo escravo Nat Turner em 1831.

O estúdio Fox Searchlight, que adquiriu os direitos de distribuição por uma quantia recorde em Sundance de US$ 17,5 milhões, cancelou a entrevista coletiva do filme no Festival Internacional de Cinema de Toronto (TIFF) e ainda analisa como fará uma campanha de promoção que incluía encontros sobre os direitos civis por todo o país.

Outro golpe chegou por parte do Instituto de Cinema Americano (AFI, na sigla em inglês), que decidiu suspender nesta semana uma exibição do filme em Los Angeles.

A força da discussão chegou até a Academia de Hollywood, onde sua presidente, Cheryl Boone Isaacs, disse ao portal "TMZ" que, à margem da polêmica do caso, "The Birth of a Nation" é um filme que "as pessoas deveriam ver".

O certo é que o filme de Nate Parker, com sua potente mensagem sobre o racismo e a escravidão, aparece em um momento ideal no qual a situação da população negra nos Estados Unidos volta a soar com força no debate público.

A última edição do Oscar, que pelo segundo ano seguido não teve atores negros indicados, e a vigência de movimentos como "Black Lives Matter" ("As vidas dos negros importam") pareciam beneficiar "The Birth of a Nation", que não por acaso tomou o título do filme homônimo de 1915 de D.W. Griffith, um clássico do cinema mudo e, ao mesmo tempo, uma produção abertamente racista.