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Pai e filho, Kirk e Michael Douglas são astros com pouco em comum

07.ABR.2016 - Kirk Douglas ao lado do filho Michael Douglas - Adam Hunger/AP
07.ABR.2016 - Kirk Douglas ao lado do filho Michael Douglas Imagem: Adam Hunger/AP

Nova York

09/12/2016 06h30

 Kirk Douglas nasceu como "o filho de um trapeiro", e Michael Douglas sempre foi o filho de uma estrela de cinema. Dois mitos unidos por um famoso furo no queixo e separados pela mudança de geração da era dourada de Hollywood dos grandes estúdios para o cinema explícito e globalizado.

"Sempre disse a meus filhos que eles não tiveram a vantagem que eu tive de nascer em uma pobreza miserável", afirmou em várias ocasiões Kirk Douglas, que completa nesta sexta-feira 100 anos.

Nascido como Issur Danielovitch Demsky em Nova York, filho de imigrantes russos, o patriarca dos Douglas teve que suar sangue para ser um destaque do cinema, lutar em uma guerra e, mesmo assim, ficar sem um Oscar após três indicações por interpretações lendárias.


Seu famoso filho, por outro lado, nasceu em Nova Jersey como Michael Kirk Douglas, cercado de atenções e com o caminho livre para iniciar sua carreira em Hollywood, que lhe rendeu dois Oscars em duas indicações.

Uma delas como produtor por "Um Estranho no Ninho", pelos direitos de adaptação que lhe foram cedidos por seu pai (que, além disso, recusou o papel de protagonista), e outro como ator no personagem de sua vida, o tubarão de "Wall Street: Poder e Cobiça" Gordon Gekko.

Seus problemas chegaram depois da fama, quando sua condição de mito do "thriller" erótico de filmes como "Atração Fatal" e "Instinto Selvagem" - em cuja estreia foi acompanhado por seu pai - passou também a fazer parte de sua vida real e o ator teve que entrar em uma clínica de desintoxicação por sua dependência de sexo, drogas e álcool.

Por esses e outros motivos, Kirk Douglas era contrário, a princípio, que seu filho Michael desenvolvesse uma carreira de ator, alegando que era uma vida muito instável.

"Quando você se transforma em uma estrela, você não muda, mas todos os demais sim", disse Kirk uma vez. Afinal de contas, um de seus melhores filmes, "Assim Estava Escrito", de Vincent Minnelli, era uma crítica ácida aos magnatas de Hollywood, e ele mesmo manifestou arrependimento por não ter prestado atenção a sua família.

"Durante muitos anos, ele foi consumido pela culpa e passou muito tempo até que pudesse aceitar. Mas agora nos damos muito bem", garantiu Michael Douglas, que conseguiu estabilidade, limitada a algumas crises, ao lado de outra estrela, a atriz Catherine Zeta-Jones.

No entanto, no momento em que seu filho insistia em ser ator e acabou sendo dispensado da obra de teatro "Árvore da Solidão", Kirk comprou os direitos da mesma para o cinema e o fraquíssimo filme foi protagonizado por Michael Douglas, arruinando a reputação de seu pai como produtor, conseguida através de títulos como "Spartacus".

O mimado, mas bem-sucedido Michael Douglas, representa o rosto bonito da passagem de geração: seus irmãos Eric, Joel e Peter também seguiram sua genética cineasta, mas sem sair do anonimato, algo que no caso de Eric (que estreou ao lado de seu pai em "O Duelo" em 1971) terminou em morte por overdose em 6 de julho de 2004.

"As pessoas pensam que sendo filho de Kirk Douglas você não precisa fazer nada. Se você tem sucesso, é o normal. Se não, você é um idiota como o resto", resumiu Michael.

Kirk teve durante décadas uma dependência, os cigarros que consumia de maneira ininterrupta, mas chega aos 100 anos após superar um derrame e, inclusive, protagonizando no século XXI uma comédia ao lado de seu filho intitulada "Acontece nas Melhores Famílias" (2003). Nesta, Michael também tinha acabado de superar problema de saúde, um câncer de língua, uma problema que viria a superar uma segunda vez.

Com sua atuação exagerada que deu vida ao mesquinho jornalista de "A Montanha dos 7 Abutres", de Billy Wilder, e à vulnerabilidade artística de Vincent Van Gogh em "Sede de Viver", de novo com Minnelli, Kirk criou escola e construiu sua lenda.

Depois explorou a malícia às ordens de Joseph L. Mankiewicz em "Ninho de Cobras" junto a Henry Fonda (outro que diria "como vou gostar de Hollywood se ela dá Oscars a seus filhos antes de você") e o gênero de aventura com "20.000 Léguas Submarinas".

O filho adaptou-se aos tempos de interpretações menos exageradas, mas com uma versatilidade similar, tanto em suas comédias com Kathleen Turner, seus personagens irados em "Um Dia de Fúria" e "Vidas em Jogo", sua mencionada faceta erótica e sua premiadíssima interpretação de Liberace em "Minha Vida com Liberace".

No entanto, sua tentativa de voltar à época dourada de Hollywood com "Um Crime Perfeito", a nova versão de "Disque M para Matar" de Alfred Hithcock, mudando Grace Kelly por Gwyneth Paltrow, não se saiu muito bem.

Também não teve o reconhecimento esperado com seu último grande esforço no cinema até o momento, "Garotos Incríveis", de Curtis Hanson, cujo fracasso superou graças à ajuda de seu pai.

"Meu pai me ajudou a superar esse fracasso. Seu filme favorito é 'Sua Última Façanha' e ninguém o viu na época, nem agora. Sua decepção me ajudou a lidar com a minha", afirmou Michael.