Topo

Cao Hamburger promete polêmica em filme sobre os irmãos Villas Boas

Cao Hamburger (de frente) discute com o diretor de arte Cássio Amarante, o diretor de fotografia Adriano Goldman e o ator Caio Blat detalhes de "Xingu" - Divulgação
Cao Hamburger (de frente) discute com o diretor de arte Cássio Amarante, o diretor de fotografia Adriano Goldman e o ator Caio Blat detalhes de "Xingu" Imagem: Divulgação

NEUSA BARBOSA

Especial para o UOL, do Cineweb

01/07/2010 07h02

Constantemente celebrados como parâmetros da antropologia indígena no Brasil, os irmãos paulistas Orlando, Cláudio e Leonardo Villas Boas serão objeto de uma cinebiografia, “Xingu”, assinada pelo diretor Cao Hamburger (“O Ano em Que Meus Pais Saíram de Férias”), cujas filmagens começam no próximo dia 20 de julho, na Amazônia. Os intérpretes do trio serão Felipe Camargo (Orlando), João Miguel (Cláudio) e Caio Blat (Leonardo).

Falando ao UOL Cinema por telefone, de um barco, a partir da cidade de São Félix (TO), uma das locações da produção, Hamburger lembra que seu engajamento no processo decorreu de um convite de Fernando Meirelles, o cineasta e dono da produtora O2, que aqui funciona como produtor.

A semente inicial do filme, no entanto, foi uma queixa de Noel Villas Boas, filho de Orlando, a Meirelles. “Ele procurou o Fernando, argumentando que a história de seu pai e tios renderia um ótimo filme. E que estava esquecida”, conta Cao. Aceita a ideia, foi dado início a um longo processo de pesquisa. Só após esta etapa, o diretor aceitou o convite. “Eu sabia por alto quem eles tinham sido, claro, mas isto não bastava. Quando mergulhei no assunto, me apaixonei muito por eles, suas histórias e os personagens que era possível descobrir nesta saga”. Sua parceira nesta fase preliminar foi a antropóloga Maíra Bühler, uma das diretoras do documentário “Elevado 3.5”, vencedor do Festival É Tudo Verdade em 2007.

Uma precondição para a entrada do diretor no filme foi a livre disposição do roteiro, já que se trata de uma ficção. “Só topei depois que a família concordou com esta liberdade. Afinal, o roteiro é baseado em fatos reais, mas bastante ficcionado em termos de juntar personagens, eventos e mexer com a cronologia”, observa Hamburger. O roteiro, que custou três anos de desenvolvimento, é assinado pelo próprio diretor, Anna Muylaert (diretora de “É Proibido Fumar”) e Elena Soárez.

Sintonias históricas

  • Antonio Pirozzelli/Folha Imagem

    Cláudio (esq.) e Orlando Villas Boas no posto avançado de Serra do Cachimbo da Expedição Roncador/Xingu, no Rio das Mortes (9/04/1951)

Mesmo sem perder de vista a imagem heroica dos sertanistas, que foram pioneiros no contato com indígenas isolados e idealizadores da criação do Parque do Xingu, em 1961, Hamburger admite que “Xingu” conterá potencial para controvérsias. “Certamente, eles foram herois no meio de uma guerra entre o avanço da cultura dita ‘civilizada’ e a cultura tida como ‘selvagem’. Mas a gente não pode ignorar diversos aspectos, inclusive que vários conceitos mudaram”.

Uma das formas de dar conta desta complexidade será dar destaque a personagens indígenas. O diretor conta que há pelo menos sete que “tem falas”, fora um elenco de apoio que inclui cerca de 100 índios. Os atores indígenas foram selecionados nas aldeias do Parque do Xingu e também fora dele – como em Palmas (TO), por exemplo – e estão participando de oficinas de interpretação, coordenadas pelo próprio Cao e por Christian Duurvoort, que já trabalhou como preparador de elenco com o diretor na série de TV “Filhos do Carnaval”.

A história cobre um período que vai de meados da década de 1940 aos anos 1970, o que representa a maior parte da vida ativa dos sertanistas (exceto Leonardo, que morreu em 1961). Como explica o diretor, “os anos 40 foi quando eles se lançaram, sem saber o que procuravam, na expedição Roncador-Xingu, no governo Getúlio Vargas, para explorar e povoar o Centro-Oeste. Era um Brasil desconhecido onde eles, que eram jovens, foram procurar aventura, pois não queriam viver na cidade. À medida que têm essa experiência, no entanto, eles se apaixonam pela causa indígena”.

A história se fecha nos anos 70, um pouco antes da aposentadoria de Cláudio e Orlando e pouco depois da criação do parque do Xingu que, como lembra o diretor, “foi a primeira reserva indígena de grandes dimensões no Brasil”. Cláudio morreu em 1998 e Orlando, em 2002.

Estão previstas dez semanas de filmagem em locações no parque do Xingu e cidades do Tocantins. O diretor observa que a produção tomou o cuidado de limitar os dias de filmagem previstos no parque – estimados em no máximo dez dias – para “evitar perturbar demais os índios”, aproveitando que Tocantins “uma pré-Amazônia, uma transição para o cerrado, é bastante semelhante”. Haverá também uma pequena parte de filmagens em São Paulo.

O plano é que “Xingu” esteja pronto no ano que vem, quando se completam 50 anos da fundação do parque. Para o diretor, o filme “terá drama, aventura e até romance. Será uma combinação de entretenimento e lançador de questões polêmicas”. Por todas as questões sociais, filosóficas e culturais que pretende levantar, Hamburger acredita que “mesmo sendo um filme de época, será muito contemporâneo”.