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Christopher Nolan e Leonardo DiCaprio falam sobre "A Origem"

Em "A Origem" o espectador é convidado a entrar na mente humana - Divulgação
Em "A Origem" o espectador é convidado a entrar na mente humana Imagem: Divulgação

ANA MARIA BAHIANA

Especial para o UOL, de Los Angeles

09/07/2010 07h03

Em algum lugar do futuro (ou do presente) um grupo muito sofisticado e exclusivo de agentes secretos descobriu como penetrar a última fronteira: a mente humana. Liderados pelo experiente “extrator” Cobb (Leonardo DiCaprio), a equipe de “agentes oníricos” (Joseph Gordon-Levitt, o produtor Arthur; Tom Hardy, o falsário Eames; Dileep Rao, o químico Yusuf, e a novata Ariadne, Ellen Page, a arquiteta) aceita, por bom preço, a tarefa de invadir sonhos alheios e dali extrair segredos industriais ou políticos. Quando um magnata (Ken Watanabe) oferece ao grupo uma tarefa arriscadíssima mas muito bem compensada, Cobb é levado a confrontar o impacto de seu bizarro ofício em sua vida pessoal – dominada por um doloroso passado que inclui sua esposa, Mal (Marion Cotillard).

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O super-aguardado "A Origem", de Christopher Nolan, parte daí para criar um verdadeiro mundo à parte de experiências visuais, emocionais e psicológicas, um labirinto de ideias e imagens como há muito tempo o cinema não via. Realizado, ao custo de US$ 200 milhões, durante seis meses em seis locações ao redor do mundo – Tóquio, Inglaterra (incluindo os mega-estúdios Cardington, onde Christopher Nolan já filmara a maior parte de "Batman - O Cavaleiro das Trevas"), Paris, Canadá, Marrocos e Los Angeles –, "A Origem" é uma mistura arrebatadora de cinema tradicional e de vanguarda. Filmado em película – 35 e 65 mm – e em digital HD, com cenários reais e efeitos quase sempre mecânicos – que incluem sets rotativos e máquinas de suspensão de gravidade "A Origem" envolve o espectador porque seu mundo de sonho é tão real quanto nossas próprias experiencias quando estamos inconscientes. “Para um processo que é tão semelhante a sonhar, o cinema tem falhado miseravelmente ao tentar abordar essa experiencia tão humana”, diz Nolan. “A maioria das vezes, o resultado parece um especial ruim de TV. Quis fugir disso ao máximo.”

A seguir, as experiencias do diretor e o astro do filme que já está sendo visto como o grande lançamento de 2010. A estreia está prevista para dia 16 nos EUA e 6 de agosto no Brasil.

O SONHADOR

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    Christopher Nolan dirige Leonardo DiCaprio no set do filme "A Origem"

Christopher Nolan começou a trabalhar no que viria a ser "A Origem" dez anos atrás, jogando ideias no papel a partir de uma extensa pesquisa sobre a natureza e o processo dos sonhos. Um personagem – o ladrão Cobb, que ele havia criado para seu primeiro filme, "Following", de 1998 – serviu mais ou menos de guia, assumindo proporções cada vez maiores e mais ousadas. "Amnesia", seu filme de 2000, ajudou-o a explorar a possibilidade de uma narrativa a serviço de processos mentais, e não visuais, dando forma final ao projeto. Mas só depois de duas rodadas no comando de arrasa-quarteirões da franquia Batman Nolan teve cacife suficiente para fazer "A Origem" do modo como queria, com o elenco que desejava, e com a cara fusão de locações, efeitos mecânicos e digitais e sobretudo liberdade criativa que , para ele, eram essenciais.

UOL Cinema - De onde vem seu interesse em sonhos?
Christopher Nolan - 
Não sei. Mas é um interesse antigo. Como cineasta, vejo um paralelo claro entre os dois processos. O mais genial é que estes filmes tão reais e tão detalhados que criamos todas as noites são processos completamente universais, compartilhados por toda a humanidade independente de cultura, língua, etnia. Sempre fui fascinado por isso. Todos somos cineastas todas as noites. Quando sonhamos, criamos o mundo do sonho – cada cor, cada detalhe do cenário, os personagens, o que os personagens dizem. É uma demonstração fantástica do poder criativo da mente humana. Há, portanto, uma relação muito interessante entre sonhar e estar sentado num cinema deixando que um filme, um mundo que outra pessoa criou, tome conta de você, envolva você. Estes conceitos me interessaram muito, e queria explorar esta justaposição com este filme.

UOL Cinema - Que cineastas influenciam seus sonhos ?
Nolan -
Stanley Kubrick sempre foi uma grande referência para mim, e vários momentos de "A Origem" mencionam essa influencia. Mas este é, em sua essência, um thriller de ação existencial …(Nolan ri)… e eu sempre fui fã dos filmes de James Bond dos anos 60. Eu tinha que pôr uma cena de perseguição na neve, com esquis, como aquela de "007 A Serviço Secreto de Sua Majestade". Coisas assim, creio, enfatizam a natureza cinematográfica dos sonhos, a relação entre as duas experiências.

UOL Cinema - Quão importante foi a adesão de Leonardo Di Caprio ao projeto?
Nolan -
Faz tempo que eu queria trazer Leo para um projeto meu… e não me decepcionei. Além de ser um prazer trabalhar com ele, e dele ser um ator no auge de sua maturidade, ele tem o verdadeiro carisma de um astro. Ele é um movie star, plenamente, E isso faz com que as platéias imediatamente se conectem com seu personagem e invistam nele. Ele tem um dom, um talento extraordinario. Leo trabalha sempre a partir da verdade interior do personagem, e isso ele atinge depois de ler e reler e analisar o roteiro, buscando os elementos para compor seu desempenho. Mais que qualquer outra coisa, Leo é a razão pela qual quem vê meu filme vai se conectar com o mundo que criamos.

UOL Cinema - Você gostaria de compartilhar os sonhos de alguém?
Nolan -
É uma ideia apavorante, não é? Na verdade foi esse conceito, a noção desta quebra absoluta da privacidade, que deu a forma final ao que seria ser "A Origem". Então não, a noção de invadir os sonhos alheios é muito assustadora para sequer ser contemplada na realidade. É a violação mais absoluta do invíduo. Se bem que, se eu pudesse saber como Orson Welles sonhava…

O ASTRO

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    Em "A Origem", Leonardo DiCaprio faz o papel de Cobb, um "extrator" de sonhos

Recém-saído de um outro thriller psicológico, "Ilha do Medo", de Martin Scorsese, Leonardo di Caprio dedicou-se de corpo e alma à complexa filmagem de "A Origem", que exigiu não apenas treinamento físico mas sobretudo uma vasta exploração dos processos do sonho e sua importancia no equilibrio da mente humana. No papel de Cobb, o “extrator” e líder de uma equipe de “agentes oníricos”, Leo tem um dos desempenhos mais originais de sua já aclamada carreira.

UOL Cinema - O que fez você dizer “sim” a Christopher Nolan – que, pelo que ele disse, há tempos anda querendo fisgar você?
DiCaprio -
Chris é um diretor visionário e este é um filme altamente ambicioso, um filme que opera em pelo menos quatro níveis diferentes da mente humana. Como eu poderia não querer me envolver nisso? (DiCaprio ri). Mas além disso ele tem no seu centro um personagem profundamente humano, com uma jornada emocional poderosa – do meu ponto de vista, trabalhando sob o ângulo do meu personagem, Cobb, a história é sobre um homem tentando reconciliar-se com seu passado, curar suas feridas e voltar para casa. O fato de Chris ter montado uma estrutura narrativa maravilhosamente complexa em torno disso só faz tudo ficar muito mais interessante.

UOL Cinema - Como você se prepara para viver um personagem que invade sonhos?
DiCaprio -
Muita pesquisa e, é claro, buscando ter mais consciência dos meus próprios sonhos. Li "Análise dos Sonhos", de Freud, e outros livros sugeridos por Chris, procurando compreender o processo por todos os lados. Passamos dois meses conversando intensamente sobre sonhos e o mundo dos sonhos, tentando estabelecer regras que pudessem ser mostradas claramente, que possibilitassem o acesso do público a esse mundo. Meu trabalho não era dizer a Chris como criar esse mundo – isso ele estava extraindo do mais profundo da mente dele – mas como criar um personagem emocionalmente poderoso que pudesse ancorar o público nessa experiência.

UOL Cinema - Como Nolan se compara aos outros grandes diretores com quem você já trabalhou?
DiCaprio -
Chris é extremamente calmo e confiante em si mesmo. Fazer o que ele fez, um projeto dessa magnitude, com sete locações diferentes, sets complicadíssimos, sem jamais perder a calma, em pleno controle de tudo, é muito raro. Acredite no que eu digo: é muito, muito raro. Os sets de Chris são super tranquilos, íntimos, não parece que você está fazendo um filme gigantescco como este. Todo mundo se sente à vontade e por isso dá o melhor de si. Ele está sempre aberto para aceitar a sua visão do trabalho e também para deixar você acessar os processos e a visão dele. Só assim ele consegue colocar na tela mundos tão extraordinários e absolutamente controlados.

UOL Cinema - Se você pudesse, Você gostaria de invadir os sonhos de quem?
DiCaprio -
É uma violação tremenda mas… tem alguns líderes mundiais que precisam que uma boa dose de bom senso e respeito ao meio ambiente seja injetada na cabeça deles (DiCaprio ri).