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No ousado cinema de Andre Klotzel, liquidificador fala, diverte e faz pensar

MAURICIO STYCER

Crítico do UOL

03/08/2010 16h04

A sinopse oficial de “Reflexões de um Liquidificador”, que contrariando os padrões do mercado local estréia na próxima segunda (9), em São Paulo, informa: “Elvira, dona de casa de aparência pacata e simpática, ouve uma voz estranha na cozinha: é o liquidificador, que começa a falar com ela. Um belo dia, Onofre, o marido de Elvira, desaparece sem deixar vestígios”.

O espectador não precisa saber de muito mais para embarcar nesta bem-sucedida ousadia de Andre Klotzel, uma comédia de sabor agridoce, com toque surreal no argumento, sem muitos atores do primeiro escalão da Globo, capaz de divertir e fazer pensar – duas qualidades incompatíveis na maioria da produção contemporânea brasileira.

TRAILER DE "REFLEXÕES DE UM LIQUIDIFICADOR"

Num ambiente de classe média baixa, em São Paulo, os personagens de Klotzel transitam por cenários e situações sem glamour algum – a cozinha de Elvira, a lanchonete de Onofre, as areias do litoral santista, a delegacia do bairro. Pouca coisa perturba a rotina da dona de casa, além dos sonhos eróticos da vizinha e da gula do carteiro do bairro.

Parece natural, assim, que o liquidificador se torne interlocutor de Elvira. É uma piada absurda, mas Klotzel, tentando nos convencer que não é, mantém seu filme no prumo. Sem comiseração, mas longe de querer ser paternalista, recorre a um humor negro quase infantil, numa homenagem, talvez, ao cinema mudo, para narrar o cotidiano de sua dona de casa e descrever o mundinho que a cerca.

Klotzel extrai grandes interpretações de Ana Lucia Torre, a protagonista, Germano Haiut (Onofre), Fabiula Nascimento (a vizinha Milena), Aramis Trindade (o investigador policial Fuinha) e Marcos Cesana (o carteiro). Até Selton Mello, como a voz do liquidificador, alcança o tom certo da comédia, diferente do habitual.

Na apresentação para convidados de “Reflexões de um Liquidificador”, Klotzel falou do longo percurso, em busca de recursos, para realizar o filme. Foram cinco anos. Este é apenas o quarto longa-metragem do cineasta, que estreou em 1986 com o excelente “Marvada Carne” e realizou ainda os elogiados “Capitalismo Selvagem” (1994) e “Memórias Póstumas” (2001).

No esforço para que “Reflexões de um Liquidificador” não seja mais um cometa no mercado exibidor brasileiro, Klotzel vem com várias novidades. Além da estreia numa segunda-feira (dia 9 de agosto em São Paulo, dia 23 no Rio), o filme ficará em cartaz numa única sala, por dois meses. Cada sessão tem um preço – de R$ 2 às 14h até R$ 10 às 22h. A cada semana será exibido um curta-metragem diferente antes das sessões. E nas duas sessões noturnas também haverá sempre um número de stand-up comedy antes da exibição do filme.