Topo

"O Último Romance de Balzac" leva à Gramado obra supostamente psicografada

NEUSA BARBOSA

Especial para o UOL, do Cineweb, de Gramado

09/08/2010 13h39

  • Divulgação

    Cena do filme ''O Último Romance de Balzac'', exibido em Gramado

A atual onda espiritualista do cinema brasileiro chegou ao Festival de Gramado nesta noite de domingo (8), através do concorrente “O Último Romance de Balzac”, de Geraldo Sarno. Misto de documentário e ficção, o filme baseia-se em estudos sobre uma suposta obra psicografada do romancista francês Honoré de Balzac (1799-1850), o celebrado autor de “A Comédia Humana” e “As Ilusões Perdidas”.

Dois personagens principais ocupam a parte documental: o médico e médium Waldo Vieira, que psicografou em 1965 um suposto romance inédito de Balzac, intitulado “Cristo espera por ti”; e o psicólogo Osmar Ramos Filho, que analisa outro romance, este escrito em vida por Balzac, “A pele de Onagro” (1831), encontrando pontos de contato entre seu estilo e temas com a obra psicografada que, segundo ele, comprovariam a autoria do escritor nesta última.

A parte ficcional encena justamente trechos de “A pele de Onagro”, que são filmados dentro da estética do cinema mudo, em preto-e-branco, com intertítulos. Neste segmento, o protagonista, Raphael de Valentin, um artista obcecado pelo suicídio, é vivido pelo músico e cantor José Paes Lira, o Lirinha do extinto grupo Cordel do Fogo Encantado.

No debate desta tarde de segunda, o diretor Geraldo Sarno (de “Viramundo” e “Tudo isto me parece um sonho”), rejeitou a classificação de seu filme como religioso. “Não sou espírita. A visão religiosa que há no filme é de Waldo Vieira, que respeito imensamente”. Indagado porque não mencionou que Vieira deixou o espiritismo pouco depois de ter lançado a obra psicografada “Cristo espera por ti”, Sarno afirmou que isto “ está fora do universo do filme”.

Outra questão sobre a ausência de especialistas não-espíritas, especialmente literários, em “O Último Romance de Balzac”, foi respondida pelo próprio Osmar Ramos Filho. Ele contou ter procurado o linguista Paulo Rónai, grande estudioso de Balzac, e este rejeitou a origem da obra psicografada. Rónai, de acordo com Ramos, teria dito: “Eu estaria louco se admitisse que Balzac escreveu qualquer coisa depois de 1850, ano de sua morte”.

Despojamento argentino

O concorrente da competição latina de ontem, “La vieja de atrás”, trouxe novamente a Gramado o diretor argentino Pablo José Meza, que aqui concorreu em 2005 com seu filme de estreia, “Buenos Aires 100 km” – que, segundo o coprodutor brasileiro de “La vieja atrás”, Beto Rodrigues, ao ser lançado no Brasil foi visto por 25.000 espectadores.

Em “La Vieja Atrás”, Meza retorna a uma dramaturgia seca e despojada, como em seu primeiro filme, e que lembra o estilo de sua compatriota, Lucrecia Martel (“O pântano”). Em cena, estão basicamente apenas dois personagens, a idosa Rosa (Adriana Aizenberg, de “O Abraço Partido”), de 81 anos, e um jovem estudante de medicina (Martin Piroyansky) que, em determinado momento, passarão a dividir o mesmo teto. A crise econômica, o desemprego, a falta de perspectivas existenciais, tudo isso perpassa este relacionamento em que o diálogo é muito difícil.

O cineasta argentino defendeu as parcerias de produção, como ocorreu, em seu filme, entre Argentina e Brasil: “Geralmente, os produtores argentinos procuram coproduções na Europa. Eu acho fundamental, no entanto, nos unirmos na América Latina. Vamos fazer filmes mais nossos. Neste sentido, sou mais latino-americano do que argentino”.

Mostra panorâmica

Fora de competição, duas comédias foram sucesso de público no Palácio dos Festivais no final de semana. Uma delas, a argentina “Dois irmãos”, de Daniel Burman (“O Abraço Partido”), que retrata uma relação de amor e ódio, temperado por enorme sentido de humor, entre Marcos (Antonio Gasalla) e Susana (Graciela Borges, de “O pântano”). A outra, a brasileira “Elvis e Madona”, de Marcelo Laffitte, apresenta o inusitado romance entre a lésbica Elvis (Simone Spoladore) e a travesti Madona (Igor Cotrim). O filme brasileiro já circulou diversos festivais, inclusive internacionais, como Tribeca, e Natal em 2009, onde levou seis prêmios, inclusive melhor filme e direção.