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Astro das artes marciais, Jackie Chan mostra lado emotivo em ''Karate Kid''

Jackie Chan interpreta o sério Sr. Han no remake de ""Karate Kid"" - Divulgação
Jackie Chan interpreta o sério Sr. Han no remake de ''Karate Kid'' Imagem: Divulgação

THAÍS FONSECA

Enviada especial a Cancún, no México*

25/08/2010 07h00

A julgar pelo histórico de Jackie Chan no cinema dos EUA – que inclui títulos rentáveis como “Hora do Rush” e “Bater ou Correr” -, seu lado cômico pareceria pouco adequado à seriedade do Sr. Han, o Sr. Miyagi (Pat Morita) da vez na nova versão de “Karate Kid”. Mas a boa notícia é que, no filme que chega às telas do Brasil nesta sexta (27), Chan aproveitou a chance de se superar como o mestre oriental: além de lutar excepcionalmente bem, Mr. Han consegue emocionar em seus momentos dramáticos e fazer uma boa dupla com o aprendiz Dre (Jaden Smith).

O papel no filme poderia levar Chan a sonhar com uma indicação ao Oscar, a exemplo do que aconteceu com Pat Morita no “Karate Kid” de 1984 (na categoria ator coadjuvante). Entretanto, o ator nascido em Hong Kong garante não ter prêmios em seus planos. “Já recebo bastante reconhecimento. Quando as pessoas me dizem: ‘Jackie, você é bom!’, fico satisfeito”, disse em coletiva recente à imprensa internacional concedida em Cancún, no México.

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    Em "Karatê Kid", Sr. Han (Jackie Chan) ensina kung fu a Dree (Jaden Smith), com um método que envolve uma jaqueta

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    Jaden Smith (à direita) luta do novo ''Karate Kid''

Em boa parte, este reconhecimento vem de uma carreira extensa no mercado cinematográfico asiático, onde trabalha como ator desde os anos 1960, dirige e é tido como grande astro. Ainda assim, quis ampliar o público nos EUA, atuando em comédias de ação que exigiam mais habilidades físicas do que em diálogos – algo conveniente ao inglês de sotaque carregado. “Sou um astro na Ásia, mas meus filmes não chegam na América”, disse.

Com "Karate Kid", mostra um lado mais sério nas telas, no papel emotivo de um especialista em kung fu que procura preservar as raízes pacíficas da arte marcial ensinando o jovem Dre Parker, norte-americano, a se defender de adolescentes chineses que usam a luta para brigar.

A seguir, leia trechos da entrevista de Chan em que fala sobre seu novo papel e faz comparações com a forma de fazer cinema em Hong Kong e nos EUA, sem poupar brincadeiras e críticas aos dois lados.

UOL CINEMA - Como foi exercitar o drama no papel do Mr. Han?
JACKIE CHAN -
Foi muito difícil para mim por causa da língua. Tinha que pensar no inglês primeiro. Eu treinava e, no set, às vezes mudávamos. Eu tive que entender antes de fazer, o que é um processo mais difícil do que lutar. E aí o diretor diz: “Corta! Podemos fazer de um outro ângulo agora?”. E você pensa: “Ah!” (risos). Se eu me dirigisse, como nas cenas de choro dos meus filmes de Hong Kong, usaria mais câmeras, para ser mais rápido. Você atua uma vez e acabou. Mas durante as cenas de ação, ele [o diretor] me ouvia.

UOL CINEMA -Você se vê indicado ao Oscar, como foi Pat Morita?
JACKIE CHAN -
Não. Tenho feito filmes por mais de quarenta anos, não estou à procura de um prêmio. O mais importante é que o espectador goste. Já recebo bastante reconhecimento. Quando as pessoas me dizem: “Jackie, você é bom!”, fico satisfeito. Se houvesse um Oscar ou um Globo de Ouro, isto seria um bônus, mas está muito distante de mim.

UOL CINEMA -Seu personagem, Mr. Han, ensina Dre (Jaden Smith) a tirar e colocar a jaqueta, para aprender o kung fu. Como escolheram este método?
JACKIE CHAN -
Na verdade, havia mais do que isso. Um dos métodos [do filme] era o da porta, disse a Jaden que deveria abri-la e fecha-la. Quando faço meus filmes é diferente, você consegue mudar as coisas com mais facilidade. Nos EUA, nas filmagens, se você diz: “Quero mudar estes óculos de lugar”, eles ficam desesperados (risos). Nós [em Hong Kong] não temos um roteiro. [No set] Eu sento lá, olho ao redor, e vou decidindo.

UOL CINEMA -Você é bem sucedido em seu país como ator e diretor. Qual o seu interesse em fazer filmes americanos? Gosta de perder o controle às vezes?
JACKIE CHAN -
Às vezes, os filmes norte-americanos são o lugar certo. Sou um astro na Ásia, mas meus filmes não chegam na América. São coisas diferentes. “Hora do Rush”, por exemplo, foi bem nas bilheterias dos EUA. Na Ásia, não faz muito sucesso, eles não gostam muito. Por outro lado, na Ásia eles gostam dos filmes [dirigidos por] do Jackie Chan, mas nos EUA, não. Na Ásia, as pessoas não entendiam as piadas do Chris Tucker [ator de ''Hora do Rush''].

TRAILER LEGENDADO DE "KARATE KID"

UOL CINEMA -Você acha que os diretores e atores com quem você já trabalhou sabiam pouco sobre seus filmes asiáticos?
JACKIE CHAN -
Não que não saibam. Eles sabem, me escutam bastante. Também acho que eles sabem que eu sei mais sobre filmes do que eles. Mas eles não podem fazer diferente, por que é o produtor que controla. Eu gostaria que muitos produtores fossem como Will Smith. Eu já fiz vários filmes norte-americanos, quase todos eles me deixam bravos. Os diretores dizem: “Jackie, temos que terminar hoje”. Eu digo: “Me dê dois dias, ou mesmo duas horas, eu termino as cenas de ação, não vai ter perda de dinheiro”. Eles dizem que não. Eu peço para ligarem para o produtor, os produtores dizem que é preciso terminar hoje. Eu digo: “Então, tudo bem”. Três meses depois eles se reúnem para filmar de novo. Aos poucos, eu fui percebendo que é o trabalho deles, eles definem o dinheiro, o tempo, quantos dias. O diretor tem que terminar. Já o produtor está lá fumando um cigarro e tomando vinho (risos). Mas estar no set, como Will Smith ficava, é diferente. Ele sabe que criança pode se machucar, câmera pode dar problema, pode chover...

UOL CINEMA -O que te agrada na maneira de fazer filmes dos EUA?
JACKIE CHAN
- O cronograma e o roteiro bem organizados. Eu, por exemplo, nunca tive roteiro nos meus filmes [asiáticos]. [Em Hong Kong] não temos hora do lanche, trabalhamos 24 horas (risos). Não ligamos para a vida humana (risos). Não ligo para mim mesmo, corro, pulo, quebro o tornozelo (risos). Eu aprendi nos EUA a ter hora do lanche e cuidar da segurança [no set].

UOL CINEMA -Você se considera um perfeccionista?
JACKIE CHAN -
Sou, muito. No estúdio, quando dirijo, digo: “Faça isso, faça aquilo! Me ajude! Empurre!”. Estou acostumado a ter o controle do set.

UOL CINEMA - Jaden está aprendendo artes marciais e no cinema. Você começou cedo na carreira também. Como você compara as duas trajetórias?
JACKIE CHAN -
Ah, são muito diferentes. Ele tem os pais juntos, tem guardas-costas, maquiadores...nós não tínhamos nada disso. Era tudo nós mesmos que fazíamos.

UOL CINEMA - Acha que Jaden pode ficar tão bom quanto você nas artes marciais?
JACKIE CHAN -
Acho que sim. Consigo ver por que, quando não estamos brincando, ele realmente me respeita. Quando brincamos, brincamos. Por que ele é muito bem educado em casa. Os pais lhes ensinaram como respeitar as pessoas.

UOL CINEMA - Você aprendeu a não sentir medo quando era criança?
JACKIE CHAN -
Não sei. Na escola, tínhamos punições frequentes. Se você fazia algo errado, o professor brigava com todo mundo. Com isto aprendemos disciplina. Lembro-me de um amigo de escola que roubou cigarro da professora. Logo de manhã, a professora fez todo mundo levantar. Ela perguntou: “Quem roubou o cigarro?”. Ninguém respondeu. Disse então: “Quem fuma?”. Todo mundo apontou para mim. E acabei assumindo a culpa. Nós fazíamos tudo para proteger uns aos outros. Por isso, na escola, aprendíamos muitas coisas importantes, não só artes marciais.

*(A repórter viajou para o México a convite da Sony)