"O que me ajudou foi o fato de eu ser um capira", diz John Malkovich sobre papel em "Secretariat"

Na lista dos 50 maiores atletas do século 20 compilada pela ESPN existe apenas um não-humano: Secretariat, um cavalo alazão puro sangue. Entre 1972 e sua aposentaria em 1975, venceu 16 de suas 21 corridas, quebrou dois dos três recordes nas principais disputas norte-americanas e foi o primeiro animal em um quarto de século a atingir vitórias nas três grandes corridas do país, a chamada Tríplice Coroa do turfe - Kentucky Derby, Preakness Stakes e Belmont Stakes.

"Cavalos são um tremendo símbolo de coragem e integridade", diz Randall Wallace, diretor de "Secretariat", o filme que acompanha a trajetória do alazão do nascimento no haras Meadow Stables, no estado de Virginia, até a glória da Tríplice Coroa. "Eles não podem ser comprados. Não podem ser corrompidos. Eles são o que são, e seguem apenas sua natureza e seu instinto."

Trabalhando com um roteiro de Mike Rich - fã de turfe e admirador de Secretariat - Wallace focaliza tanto a trajetória do alazão quanto dos dois humanos que compartilham sua glória: sua proprietária Penny Chenery Tweedy e seu treinador Lucien Laurin, interpretados respectivamente por Diane Lane e John Malkovich. "A história é tanto a de Secretariat quanto a de Penny", diz Wallace. "Os dois encontraram seus destinos juntos, um por causa do outro. E Lucien foi, em grande parte, o instrumento dessa trajetória."

Penny, uma dona de casa com um diploma universitário sem experiência de negócios, assume o haras da família para substituir o pai gravemente doente - e tem que aprender na prática as manhas e atalhos da complicada (e machista) cultura do turfe nos anos 70. "O desafio de Peggy, para mim, é que ela vem de uma outra geração, para quem o nascente feminismo dos anos 70 é um enigma", diz Lane.

"Ela não vê sua escolha de vida como uma opção de liberação, mas puramente como dever familiar. Ela não tem segundas intenções - talvez por isso sua relação com a criação e o treino do cavalo sejam tão puras e tão diretas", relata a atriz. "Que modo maravilhoso de ser!"

O franco-canadense Lucien Laurin era um ex-jóquei com grande reputação como treinador de campeões no Canadá quando seu filho, Rogerm, funcionário do Meadow Stables, sugeriu seu nome como o consultor capaz de levar o haras a vitórias e dias melhores. Malkovich - que acompanhou as glórias de Secretariat na adolescência e é amigo de longa data de Randal Wallace - interpreta Lucien com todos os detalhes que fizeram a fama do treinador : seu estilo dândi, seu temperamento explosivo, o hábito de xingar em francês sempre que perde o controle.

"Como todo personagem, há um tanto de mim em Lucien", diz Malkovich. "Infelizmente não pude ter contato direto com ele, já que ele faleceu há algum tempo. Nesse caso você trabalha com sua energia e o que a pesquisa e a direção de arte fornecem. O que me ajudou foi o fato de eu ser um capira. Cresci na roça , cercado por cavalos, tive alguns, meus amigos, tambem. Isso não quer dizer que eu saiba como treinar um puro sangue. Com toda pesquisa que fiz, certamente ninguém me contrataria para treinar um cavalo de corrida."

O grande trunfo de "Secretariat" são as empolgantes sequências de corrida, que Wallace e seu oscarizado diretor de fotografia Dean Semler ("Dança com Lobos") orquestraram com múliplas câmeras - inclusive uma pequena câmera digital acoplada aos próprios cavalos - de forma a imergir o espectador em toda emoção da disputa.

"Não queria que as corridas fossem vistas de fora, do ponto de vista do público, como acontece na maioria dos filmes sobre turfe", Wallace explica. "Queria mostrar o ponto de vista dos atletas, ou seja, dos cavalos. Afinal, nossa estrela era um dos atletas do século!"

E para viver esse atleta Wallace teve que recorrer não a um, mas a cinco diferentes cavalos, cada qual especializado num aspecto da personalidade de Secretariat. "O que só confirma o quanto ele foi único", Wallace diz. "Nem para o filme de sua vida ele pode ser substituído.’