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Itamar não foi absorvido pela indústria como os Mutantes ou Tropicalistas, diz diretor de "Daquele Instante em Diante"

ESTEFANI MEDEIROS <br>Da Redação

08/07/2011 15h10

De óculos escuros com armação branca futurista, camisa básica e a língua afiada, Itamar Assumpção dá entrevista para um extinto programa musical da TV. "Daqui a 50 anos eu sou história? Ou Não? Ou é mais um que passou?".

A inquietação que permeou a carreira do sambista é um dos vários traços de sua personalidade abordados no documentário “Daquele Instante em Diante’, dirigido por Rogério Velloso e que estreia na noite desta sexta-feira (8), nas salas de cinema brasileiras.

"O documentário foi um processo que começou com o Itaú Cultural, era um material reunido por eles, mas que não tinha destino certo. Foi quando me chamaram para transformar as imagens em filme", conta o diretor em entrevista ao UOL. 

Costurado por cerca de 170 horas de gravações, o projeto remonta a trajetória de Assumpção com apoio no depoimento das filhas Anelis e Serena, de sua mulher Zena Brigo, colegas de banda e amigos do cantor como Alice Ruiz, Luiz Chagas e Suzana Salles. "A participação da família dele foi muito importante. Foi uma relação muito sincera e cumplíce. Ficamos muito amigos", disse Velloso. "Quis evitar um aval, ou pessoas famosas falando sobre ele. A ideia era mostrar sua poesia", completa. 

Seguindo a trilha da carreira de Assumpção, o documentário mostra  as diversas faces do músico. Mostra como no palco, Itamar era intenso a ponto de ganhar a fama de "maldito", rótulo que repudiava, e ao mesmo tempo como era cuidadoso com a família e apaixonado por suas orquídeas. "A grande busca é onde está a primeira pessoa do Itamar. E percebi que a primeira pessoa está no que ele fez. O jeito dele trabalhar as coisas de uma forma tão intensa acabou soando como ele mesmo. Por isso ele foi tão arrebatador em cena e é o que faz as pessoas se apaixonarem por ele", diz o diretor.

"O Itamar não foi absorvido pela indústria. Não foi como outros artistas que revolucionaram sua época como os Mutantes ou os Tropicalistas. É  quase uma obra de guerrilha, de resistência mesmo", comenta. Assumpção lançou todos os seus álbuns, inclusive discos, que eram caros para o padrão da época, de forma independente, decisão que no documentário os colegas de banda dizem que era difícil de lidar.

Questionado se o "sucesso" de Assumpção estaria chegando póstumo (o cantor morreu vítima de um câncer em 2003), Velloso acredita que "a morte do Itamar embalou a obra dele. Deu um fechamento e tornou o conjunto muito coeso. O que ele fez foi muito forte. O fato dele ter morrido, de certa forma, colocou um ponto final na sua obra". 

Para Velloso, começar e terminar o projeto foram as partes mais difíceis do documentário. "Não conseguia comprar discos em BH, mas meus amigos de São Paulo traziam álbuns do Assumpção. Nunca imaginei que faria um filme sobre ele", diz. "Tinha que me preocupar mais com o conjunto do que com o formato. Minha assistente dizia que ia puxar a tomada da ilha da edição porque eu não conseguia parar. Mas o resultado foi bom, percebi pela reação das pessoas, que de alguma forma o Itamar se fez presente".

Se Itamar gostaria do documentário? "Não sei o que poderia ter acontecido", diz Velloso. "Poderíamos ter sido amigos, e ainda assim ele não gostar". 

Veloso ainda conta que mais material sobre o filme estará disponível no blog do artista e que existe a chance do filme ser lançado em DVD, mas não há nada confirmado. 

Sobre a série

Ao todo "Iconoclássicos" reúne cinco documentários sobre ícones da cultura brasileira em diversas áreas. Além de Itamar Assumpção, são eles o diretor de teatro José Celso Martinez Correa, o poeta Paulo Leminski, o artista plástico Nelson Leirner e o cineasta Rogério Sganzerla. Veja abaixo a programação completa da série. Todos os filmes são exibidos nas salas do Unibanco Arteplex com entrada gratuita. 

PROGRAMAÇÃO DA SÉRIE ICONOCLÁSSICOS

8 a 29 de julho"Daquele Instante em Diante", Itamar Assumpção por Rogério Velloso
5 a 8 de agosto"Existo", Paulo Leminski por Cao Guimarães
2 a 30 de setembro"Assim É, Se Lhe Parece", Nelson Leirner por Carla Gallo
4 a 25 de novembro"EVOÉ, Retrato de um Antropófago", Zé Celso por Tadeu Jungle e Elaine César
2 a 30 de dezembro"Mr. Sganzerla - Os Signos da Luz", Rogério Sganzerla por Joel Pizzini