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Ator de "Cordel Encantado" e do filme "Cinema, Aspirinas e Urubus", João Miguel diz que está "em fase de experimentar"

O ator João Miguel como o personagem Belarmino, em "Cordel Encantado" - Divulgação/TV Globo
O ator João Miguel como o personagem Belarmino, em "Cordel Encantado" Imagem: Divulgação/TV Globo

ALYSSON OLIVEIRA

Do Cineweb

01/08/2011 07h00

Atualmente, João Miguel é dos rostos mais marcantes do cinema brasileiro. Já se transformou numa espécie de ator-assinatura das produções nacionais independentes. Em seu currículo estão “Cinema, Aspirinas e Urubus” (que lhe rendeu prêmio de melhor ator na Mostra Internacional de Cinema de SP em 2005), “Estômago” (pelo qual foi premiado no Festival do Rio de 2007), “O céu de Suely” e “Se nada mais der certo”, entre outros. O ator, que nasceu em Salvador em 1970, confessa que está numa fase de “querer experimentar”.

Parte dessas novas experiências podem ser vistas todos os dias na novela “Cordel encantado”, na qual João interpreta o cangaceiro Belarmino. Outra parte entra em cartaz no país a partir do próximo dia 12, com o filme “Ex isto”, do documentarista e videoartista Cao Guimarães, no qual o ator encarna o filósofo racionalista francês René Descartes (1596-1650). “Estou numa tendência de lidar com possibilidades no meu trabalho”, disse o ator ao UOL Cinema por telefone, num intervalo das gravações da novela.

João conta que mergulhou – ao lado de Cao – na obra de Descartes e Paulo Leminski, autor do livro “Catatau”, que serviu de base para o longa, parte do projeto Iconoclássicos, do Itaú Cultural. “Eu me impregnei da obra dos dois, que tinham olhares sofisticados e, sem medo, encaravam suas realidades, seus momentos”.

Fazer “Ex isto”, para João foi uma experiência bastante diferente. “Trabalhamos sem roteiro. Fui construindo o personagem enquanto o filme era feito. Foi um quebra-cabeças interessante”. Para entrar no papel, o ator confessa que a roupa de época que usa, com direito a chapéu com plumas, foi bastante importante, especialmente nos momentos em que contracena com populares na rua e num mercado em Recife. “Foi um processo de criação bem próximo àquele que usei quando filmei o monólogo sobre o [artista plástico] Bispo do Rosário”.

João explica que o que o move é “a necessidade humana de se surpreender com o que está fazendo”. Por isso, neste momento, além de “Ex isto”, “Cordel Encantado” é um campo de descobertas, depois de ter feito algumas participações em televisão. “Eu sabia que, em algum momento,  minha carreira iria dialogar com a televisão. Essa, porém, é uma novela diferente, que busca novas possibilidades da dramaturgia, é menos viciada na massificação. E o público está dando uma boa resposta, que prova que o sofisticado tem um grande apelo popular”.

Cara de pensamento

Experiente videoartista e cineasta (“Andarilho”), o mineiro Cao Guimarães chegava a um momento diferente em sua carreira quando foi convidado a fazer um documentário sobre o poeta paranaense Paulo Leminski (1944-1989).  “O desafio era transformar a prosa experimental do ‘Catatau’ em cinema. Num primeiro momento foi difícil, porque há muitas referências literárias e culturais. Mas o que mais me fascinou foi a melodia daquele texto, que é muito sonoro e repleto de imagens”.

No livro, Leminski faz a pergunta: e se Descartes tivesse vindo para o Brasil? A resposta de Cao está no filme, que foi sendo descoberto enquanto era feito. “Não fizemos pesquisa de locações, ou algo parecido. Apenas mergulhei nas obras de Leminski e Descartes com o João Miguel. Procurei potencializar o que havia de mais cinematográfico no livro”.

O diretor conta que foi realmente descobrindo o filme na montagem, na qual contou com ajuda de seu amigo Marcelo Gomes (“Cinema, Aspirinas e Urubus”). “Eu já trabalhava na edição há algum tempo e precisava de olhar de fora, com mais frescor, e ele entrou para me ajudar”. Ao todo, Cao tinha 15 horas gravadas durante 13 dias.

Segundo o diretor, num primeiro momento João ficou meio preocupado em trabalhar num filme sem roteiro, mas quando conversaram, o ator se convenceu de que esse era o tipo de filme que queria fazer.  “É um personagem de época interagindo com a natureza, os lugares e as pessoas. O protagonista atravessa o filme todo sem abrir a boca, sem falar com ninguém. Seu discurso está apenas na narração, mas, mais do que isso, na interpretação do João”.

Este é o primeiro filme de Cao a escalar um ator profissional. Até então, ele fez documentários em que, segundo ele, seus entrevistados e personagens reais são “atores de si mesmos”.  “A diferença é que o João, por exemplo, tem uma percepção de câmera maior que as outras pessoas  que ‘atuaram’ nos meus filmes. Ele cria uma coreografia, sabe se posicionar em relação ao equipamento”.

Segundo o diretor, o que mais o impressionou foi como João “segura o filme no olhar”. “No começo, ele me pediu instruções, como fazer numa cena, num momento, e eu disse que ia filmá-lo pensando. E ele faz uma cara de pensamento o tempo todo, faz um olhar de quem está pensando. É isso que dá força ao personagem”.