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Destaque no Anima Mundi, stop-motion pode ficar mais rico com "sujeira", dizem animadores

Granada com "recheio" de abacate, ideal para fazer guacamole, na visão do animador PES - PES / Reprodução
Granada com "recheio" de abacate, ideal para fazer guacamole, na visão do animador PES Imagem: PES / Reprodução

Mário Barra

Do UOL, em São Paulo

26/07/2012 07h00

A sujeira pode ser uma virtude para os animadores, especialmente aqueles que trabalham com stop-motion, técnica de animação em que o diretor precisa fotografar quadro por quadro as cenas da produção. Experts na área, reunidos em São Paulo durante a 20ª edição do festival Anima Mundi, garantem que tanto os objetos que as pessoas normalmente consideram descartáveis como as imperfeições do trabalho manual podem ser enriquecedoras na hora de gravar.

Famoso por filmes como "O Estranho Mundo de Jack" e "Fuga das Galinhas", o mundo do stop-motion tem como um de seus principais expoentes o norte-americano Adam Pesapane, que usa materiais do cotidiano em filmes com até dois minutos. Conhecido mundialmente como PES, o animador é capaz de enxergar um abacate dentro de uma granada -- com direito a uma bola de bilhar servindo como a semente da fruta (confira o trabalho dele aqui).

  • Anima Mundi / Divulgação

    O norte-americano Adam Pesapane, conhecido como PES, esteve presente no Anima Mundi 2012

"Uso muitas coisas que as pessoas consideram lixo em meus trabalhos: papel-bolha para imitar a água fervendo em uma panela, post-its para fingr de manteiga, elástico como espaguete", diz o artista, que iniciou no ramo em 2002 com a animação "Roof Sex" -- clipe de um minuto sobre duas poltronas fazendo "sexo". "Há uma certa alegria no rosto das pessoas ao identificar os objetos do cotidiano retratados de maneira diferente."

Avesso a desenhos, PES prefere reproduzir suas ideias com as próprias bugigangas do mundo a reproduzi-las com as mãos em uma folha de papel. Mas para chegar ao nível do animador não basta simplesmente amontoar tralhas em casa e filmá-las.

"Há muitos jovens apaixonados por stop-motion hoje, mas as ideais deles não aparecem", diz. "O cara pode receber uma série de cliques ao publicar um único vídeo na internet, mas é esquecido depois. É preciso pensar primeiro na ideia e ver se o stop-motion é adequado para ela."

PES dá tanto valor aos objetos que chega a colocá-los em pé de igualdade com os próprios personagens dos filmes. É o oposto do que faz Tim Burton -- diretor do longa "Frankenweenie", sobre um garoto que tenta ressuscitar seu cão, previsto para estrear nos cinemas brasileiros em 2 de novembro -- em longas que consagraram o gênero como "Noiva Cadáver" e "Vincent, focados em seus protagonistas.

"Filmes, no futuro, poderão ter apenas objetos para contar as histórias", afirma PES, que atualmente trabalha em seu primeiro longa-metragem. "É isso que me fascina nos meus trabalhos. Descobrir quais objetos podem ser usados para mostrar as situações da vida."

Stop-motion no Anima Mundi
O festival, voltado principalmente para curtas de animação, vai celebrar o stop-motion nesta quinta-feira (26), com a visita do diretor de arte Jay Grace, responsável por "Piratas Pirados" (veja trailer dublado abaixo), que irá comentar o desenvolvimento do longa com vozes de Hugh Grant e Salma Hayek. Serão exibidos também comerciais de TV feitos pelo estúdio Aardman, que produziu o filme.

VEJA TRAILER DUBLADO DE "PIRATAS PIRADOS", DOS ESTÚDIOS AARDMAN

Na quarta-feira (25), o animador Mark Shapiro conversou com o público do evento sobre "ParaNorman", filme concebido pelos estúdios Laika, responsável por lançar a animação "Coraline", em 2009. O novo longa, que deve chegar aos cinemas nacionais em 7 de setembro, fala sobre um garoto introvertido, mal-tratado e isolado na escola, que tem o dom de enxergar e conversar com mortos.

César Coelho, um dos quatro produtores do festival, acha que a graça do stop-motion está em outro tipo de terror. "O stop-motion é a técnica de animação mais hardcore, é o lado selvagem da coisa. Não dá para prever muitos detalhes, fazer testes antes", diz o animador brasileiro, que também defende a "sujeira" nas produções que fotografam objetos quadro a quadro.

"As imperfeições são vantagens das técnicas de animação manuais. Se aproveitadas, elas podem ser algo a mais no filme. Tentar imitar essa 'poluição acidental' com computação gráfica fica falso."

O uso de recursos baratos, presente no trabalho de PES, é destacado por Coelho, que lembra como produções em stop-motion podem ser feitas até mesmo com uma câmera e um laptop. "Tanto o 'Piratas Pirados' como o 'ParaNorman' foram feitos com apenas uma câmera fotográfica, algo que custa cerca de R$ 6 mil aqui", afirma.

Mas um obstáculo pode ser o acúmulo de funções, já que animadores de stop-motion podem trabalhar muitas vezes sozinhos. "É um tipo de produção demorado, feito normalmente por uma só pessoa. Nas outras técnicas é possível dividir mais o trabalho, até em 3D as tarefas podem ser repartidas", conta.

No Brasil, o crescimento do stop-motion pode ser testemunhado pela criação dos dois primeiros longas com a técnica do país: "Minhocas", previsto para lançamento em setembro pelo estúdio Animaking, e "Teca e Tuti em Uma Noite na Biblioteca", em pré-produção pela Rocambole. Coelho ainda destaca o trabalho de artistas como César Cabral e Pedro Iuá como expoentes do stop-motion nacional.