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"Argo" e o drama da Academia em premiar ou não um filme que não teve o diretor indicado

Chico Fireman

Do UOL, em São Paulo

03/02/2013 08h58

Se um filme é eleito como o melhor do ano, o diretor desse longa-metragem também é o melhor cineasta. Certo? Em se tratando do Oscar, a resposta pode ser não. A lista de premiados na categoria principal divergiu muitas vezes dos resultados em “melhor direção”.  “Chicago” e “Crash” são exemplos recentes. Neste ano, pode acontecer algo semelhante. Steven Spielberg parece não ter grandes adversários no quesito dos diretores com seu “Lincoln”, enquanto “Argo”, de Ben Affleck, tem faturado praticamente todos os principais prêmios pré-Oscar.

No entanto, enquanto Rob Marshall e Paul Haggis tiveram seus diretores pelo menos indicados, Ben Affleck não é um dos finalistas ao Oscar neste ano. Na história do Oscar, apenas três filmes ganharam na categoria principal sem que seus cineastas tivessem sido indicados: “Asas”, “Grande Hotel” e “Conduzindo Miss Daisy”. Mas esta é a primeira vez em que um filme se torna favorito ao Oscar nestas condições.

Quando a Academia anunciou seus indicados neste ano, a esnobada em Ben Affleck parecia ter diminuído as chances de “Argo” na categoria principal, mas logo em seguida o longa iniciou uma carreira de prêmio importantes. Ganhou o Globo de Ouro de melhor filme dramático, foi escolhido como filme do ano pelo Sindicato dos Produtores (PGA) e ganhou o prêmio de melhor elenco (o equivalente a melhor filme) do Sindicato dos Atores (SAG). Isso sem falar na vitória no Critics Choice, o prêmio dos críticos de TV, que foi divulgado antes das indicações ao Oscar.

Os resultados do PGA anteciparam os vencedores do Oscar nos últimos seis anos. “Crash” ganhou um surpreendente Oscar de melhor filme depois de levar o prêmio de elenco do SAG. O mesmo aconteceu com o “O Discurso do Rei”, o que pode ter ajudado a definir a disputa com “A Rede Social” no Oscar. E o Globo de Ouro, mesmo que tenha se tornado um precursor menos eficiente, já foi muitas vezes eficiente em indicar as preferências da Academia. Isoladamente, estes prêmios ajudam na campanha de um candidato. Somados, transformam um filme numa força quase imbatível. Uma situação que nunca se viu.

O negócio ficou ainda mais sui generis na noite de deste sábado (2), quando Ben Affleck ganhou o prêmio anual do Sindicato dos Diretores, o DGA, considerado uma das maiores prévias para o Oscar. O cineasta se tornou apenas o terceiro na história a ser escolhido como melhor do ano por sua categoria sem pelo menos concorrer ao prêmio da Academia. E nenhum dos dois anteriores viram seus filmes levar o Oscar principal. "Argo" seria o primeiro desde que as duas premiações coexistem, desde 1949.   

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“Asas” foi o vencedor do primeiro Oscar de melhor filme, em 1929, mas a superprodução bélica não viu seu maestro, o cineasta William Wellman, como um dos finalistas na categoria de melhor diretor. “Grande Hotel”,  em 1933, repetiu o feito. Edmund Goulding também não foi lembrado pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas. Mas os tempos eram outros.  Àquela época, ainda não existiam os prêmios da crítica e dos sindicatos de categorias. As campanhas de marketing ainda eram tímidas, nada parecido com o que existe nos dias de hoje. O desencontro não assustava tanto. 

Em 1990, “Conduzindo Miss Daisy” foi o único filme da “era contemporânea do Oscar” -com prêmios de crítica e sindicatos estabelecidos e com um marketing já bem próximo do que existe hoje- a ganhar o prêmio de melhor filme sem ter seu diretor, Bruce Beresford, entre os finalistas. Mas o filme estrelado por Jessica Tandy não era o favorito. A vitória foi uma surpresa. Quase todo mundo apostava que “Nascido em Quatro de Julho”, drama de guerra de Oliver Stone, levasse o prêmio principal, o que deixa a disputa deste ano ainda mais particular.

A Academia tem duas opções bem claras neste ano: ou assume que não ter indicado Ben Affleck foi um lapso e segue a corrente, premiando “Argo”, ou ignora a polêmica, renega sua própria decisão de não indicar Affleck e elege um outro filme, que pode ser “Lincoln”, “O Lado Bom da Vida” ou “As Aventuras de Pi”, com Spielberg levando vantagem.

Embora, na prática, não tenha que dar satisfações a ninguém, a Academia pode se ver acuada no meio do atual contexto. Optar por um filme em detrimento de um franco favorito pode ser visto como uma opção menos “nobre” ou até entrar pros erros históricos da Academia. As próximas semanas serão fundamentais para a decisão dos integrantes da Academia. Cada capítulo será saboroso para quem acompanha a corrida do Oscar.