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"Eu queria que fosse bem peluda", diz atriz de "Killer Joe" sobre peruca pubiana

Gina Gershon e Thomas Haden Church em cena de "Killer Joe - Matador de Aluguel", de William Friedkin - Divulgação / Califórnia Filmes
Gina Gershon e Thomas Haden Church em cena de "Killer Joe - Matador de Aluguel", de William Friedkin Imagem: Divulgação / Califórnia Filmes

Nancy Mills

Do Hollywood Watch, em Nova York (EUA)

09/03/2013 05h00

A impressão é a de que se uma atriz está destinada a interpretar um papel, ele vai lhe ser oferecido até que ela finalmente o aceite.

Gina Gershon poderia ter encarnado Sharla, a garçonete e madrasta calculista na peça de Tracy Letts, "Killer Joe", há dez anos, mas recusou a oferta; a trama, com suas mentiras, enganação, nudez parcial e atos de degradação, era demais para ela na época.

"Senti que não teria forças para fazer aquilo oito vezes por semana", admite, por telefone, de seu apartamento em Nova York. "Sempre me incomodou o fato de ter fraquejado, mas preferi ouvir a minha intuição. Sharla não é uma personagem que se interpreta superficialmente; para ser convincente é preciso ir fundo, ser honesta e se dar por inteiro."

TRAJETÓRIA

  • Dave Kotinsky/Getty Images

    Gina aprendeu a debochar da própria imagem, mesmo que às vezes se sinta limitada por isso; um bom exemplo é seu livro de memórias, "In Search of Cleo: How I Found My Pussy and Lost My Mind", publicado em outubro de 2012.
    "Eu poderia ter posto 'Xaninha', completa,"mas não teria o mesmo impacto porque, no fim das contas, só queria mesmo é fazer o povo rir".
    O livro é baseado na busca de dois meses e meio de Gina por sua gata perdida (a 'pussy' felina e não a palavra vulgar que descreve o órgão sexual feminino) em Los Angeles.
    "Falo das pessoas que conheci e das situações em que vi, as mais absurdas possíveis", diz ela."É uma história sobre relacionamentos e as barbaridades que as pessoas fazem para encontrar o amor verdadeiro."
    A frase parece, no mínimo, sentimental para alguém com a imagem"sou durona sim e vivo no limite"de Gina, mas a estrela insiste em dizer que nunca foi uma garota má --pelo menos não muito.
    "Fui parar na sala da diretoria", admite."Era meio rebelde, não gostava nem queria que me dissessem o que fazer. Gostava de ir à praia, mas detestava a escola e, como era a caçula, conseguia me safar muito mais."
    Seu interesse na interpretação se manifestou cedo, como Gina relembra, mas levou anos até se tornar uma opção efetiva de carreira.
    "Acho que tinha um talento natural para a interpretação", reconhece,"mas só me tornei boa de verdade depois de estudar. A faculdade era importante para mim como era para o meu pai; não queria ser mais uma dessas atrizes burras que tem por aí".
    Gershon entrou no Emerson College de Boston, mas pediu transferência para a Universidade de Nova York.
    "Eu era muito mais curiosa naquela época", ela diz."Hoje eu só quero me divertir. Aí me interessei pelas tragédias gregas e não via a hora de ser mais velha para poder fazer Eugene O'Neill. As peças dele são tão intensas! Os personagens não têm limites quando se trata de vingança."

Porém, quando teve a chance de estrelar a adaptação para o cinema, de William Friedkin, ela estava preparada.

"Como dizer 'não' a William Friedkin?", questiona a atriz. "As filmagens foram intensas, sim, mas não tive que viver o papel durante seis meses. Quando muito, fiz duas tomadas por cena."

A versão cinematográfica, que teve sua estreia no Brasil nesta sexta (8), se passa num estacionamento de trailers, onde um jovem (Emile Hirsch) contrata um mercenário (Matthew McConaughey) para matar a própria mãe, pois só assim terá acesso aos US$ 50 mil de seu seguro de vida e poderá pagar as dívidas de jogo. Entretanto, por não poder pagar adiantado pelo serviço, ele oferece a irmã (Juno Temple) como garantia sexual. Thomas Haden Church interpreta seu pai e Gina a madrasta, Sharla.

Quando o filme foi exibido no Festival de Veneza em 2011, o Hollywood Reporter o rotulou como "uma agradável surpresa considerando-se a sordidez de um filme noir para adultos que se passa no Texas e consegue ser tão engraçado quanto agressivo".

Nos EUA --e também no Brasil--, foi classificado como proibido para menores, decisão com a qual Gina concorda, apesar do desconforto gerado pelo processo de classificação etária.

"Essas decisões são totalmente arbitrárias", reconhece ela. "Se você arrancar o seio de alguém, o filme é restrito, ou seja, menores só podem ver acompanhados de um adulto, mas se você beija alguém nesse mesmo seio, aí o filme vira impróprio para menores!"

Ela classifica o longa como uma "comédia de buraco negro", ou seja, não só de humor negro, mas realmente sombrio.

"Não é para os fracos", a atriz avisa. "É muito corajosa e explícita. Nunca vivi nada parecido antes na minha carreira. Foi um trabalho que me confundiu emocionalmente, não sabia se ria ou se me horrorizava."

"Quem curte Quentin Tarantino, os irmãos Coen e os filmes noir clássicos vai adorar", arrisca ela. "Há também uns elementos românticos legais, mas rola um conto de fadas meio às avessas."

Sharla faz uma entrada memorável, caminhando seminua na frente do enteado. Na verdade, estava usando uma peruca tapa-sexo, acessório muito usado no teatro e que faz as vezes de "peruca pubiana".

"Eu queria que fosse bem peluda, enorme mesmo", explica Gina, "para definir a personalidade animalesca que ela tem. É uma mulher que não está aí para noções de propriedade; o negócio dela é sobrevivência."

Poucas são as atrizes para quem o papel de Sharla cairia como uma luva; Gina talvez esteja no topo da lista por causa de suas atuações desinibidas em "Showgirls" (1995) e "Ligadas Pelo Desejo" (1996).

"As pessoas gostam de rotular os outros", afirma ela, entre irritada e divertida. "Nem faço tantos papéis de mulheres fortes, ousadas e sexuais."

E toma como exemplo seus trabalhos recentes na Broadway, "Cabaré" (2001), "Boeing Boeing" (2008) e "Adeus Amor" (2009), e menciona a tintureira hassídica que interpretou em alguns episódios da série "Curb Your Enthusiasm" (2004-2007).

"Todo mundo espera que eu seja durona", acrescenta ela com um suspiro, "mas não sou, não, sou uma garota bem boazinha. Minha mãe não entende por que não faço mais comédias. Ela me conhece a fundo."

Mas não foi à toa que Gina reagiu a "Killer Joe" e se atirou de cabeça no papel.

"Se confio no diretor, faço absolutamente de tudo", ela resume. "E mesmo que não confie, tenho o compromisso com o papel e sei o que quero conseguir dele. Só não cometo exageros sem uma razão legítima."

TRAILER DO FILME "KILLER JOE - MATADOR DE ALUGUEL"

Gina estreou no cinema em "Beatlemania" (1981), mas só veio a se destacar ao interpretar a garota má em "A Garota de Rosa Shocking" (1986). Deu o seu primeiro beijo cinematográfico em Tom Cruise em "Cocktail" (1988). Além de ousar nas cenas de "Showgirls" e "Ligadas pelo Desejo", também interpretou papéis convencionais em filmes como "Inferno Vermelho" (1988), "A Outra Face" (1997) e "O Informante" (1999). Mais recentemente encarnou uma prostituta em "Rancho do Amor" (2010) e estrelou o seriado cômico "How to Make It in America" (2010-2011).

Para ter mais controle sobre sua carreira, Gina está trabalhando em parceria com o canal a cabo Starz para realizar "Harem", um embrião de minissérie que se passa durante o Império Otomano. Ela também fez o curta "Sarah Palin Media Addict" (2011) para o funnyordie.com.

"O que me atrai são projetos intensos", Gian conclui, "mas adoraria fazer uma comédia romântica. Só não vale ser melada. Melada não dá para engolir".

(Nancy Mills é redatora freelancer de Manhattan Beach, Califórnia)