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"Midas" das comédias, Steve Carell tenta reverter má fase com "Meu Malvado Favorito 2"

O ator Steve Carell durante a gravação das vozes da animação "Meu Malvado Favorito 2" - Divulgação / Universal
O ator Steve Carell durante a gravação das vozes da animação "Meu Malvado Favorito 2" Imagem: Divulgação / Universal

Eduardo Graça

Do UOL, em Los Angeles (EUA)

05/07/2013 05h00

Quando Steve Carell, 50 anos, vencedor do Globo de Ouro em 2006 pelo papel de Michael Scott na série televisiva “The Office”, troca a voz ligeiramente anasalada pelo som mais gutural, com ênfase nas consoantes, basta fechar os olhos por um instante e o interlocutor se vê, de imediato, na presença de Gru. O personagem "shrékico" criado pelos diretores franceses Pierre Coffin e Chris Renaud para a franquia de animação “Meu Malvado Favorito” (cuja voz, na versão dublada no Brasil da parte 2, fica a cargo de Leandro Hassum) é garantia de público: o primeiro filme fez US$ 251 milhões de bilheteria e o segundo já é um sucesso na Europa.

Curiosamente, o ator que explodiu nos cinemas há oito anos com o hilário “O Virgem de 40 Anos”, em que também assinava o roteiro, anda em má fase. Nariz longo, cabelo repartido ao meio, gestual de bom moço, dos mais simpáticos atores de Hollywood, Carell parecia ter o toque de Midas no passado. Além dos baús da felicidade “The Office” e “O Virgem de 40 Anos”, ele é o produtor de “Agente 86” e “Amor a Toda Prova”. Neste último, uma tentativa certeira de enfatizar a primeira parte do termo comédia romântica, dividiu a tela grande com um elenco de amigos queridos, incluindo Julianne Moore, Emma Stone e Ryan Gosling.

Mas aí vieram as bombas “Procura-se um Amigo para o Fim do Mundo” e “O Incrível Burt Wonderstone”, fracassos de público que doeram, especialmente no caso do primeiro título, no bolso do ator. Aliás, para bom entendedor, uma frase basta: “As chances de ‘The Office” virar filme, quero deixar bem claro, são próximas de zero”, diz, em entrevista dada ao UOL em um hotel de luxo de Beverly Hills, nos Estados Unidos.

“Meu Malvado Favorito 2” traz de volta o ex-vilão Gru, agora um pai dedicadíssimo das meninas adotadas na versão original do desenho, de 2010. A ação começa quando ele é recrutado pela Liga Anti-Vilões para participar da captura de um criminoso misterioso, devotado à tarefa de criar um exército de “minions” do mal a partir de um experimento científico. Mais uma vez os “minions”, seres criados pelos diretores -- algo como amendoins falantes -- que terão um filme dedicado exclusivamente a eles lançado no ano que vem, são as estrelas do show.

Nada que deixe Gru, ou Carell, enciumado. "Os 'minions' são irresistíveis, mas as crianças amam Gru porque ele tem um coração enorme. E as crianças adoram um pai presente, que faz tudo por seus filhos. Algumas semanas atrás fui ao programa da Ellen (DeGeneres), na tevê americana, vestido como o Gru. Não era apenas a voz, mas o corpo também", disse o ator. "A filha de uma das funcionárias do programa quis conhecer o Gru, era o sonho dela. Foi o máximo quando ela virou-se para a mãe. 'Viu, não disse? Ele é de verdade!' Quando usei minha voz de Gru -- 'Oi Sophie, como você está? É um prazer enooooorme te conhecer.' -- os olhos dela revelaram todo o fascínio, e claramente não havia medo ali. E Gru é um tanto assustador, né? Mas, não, para ela foi como conhecer o Papai Noel. É isso, o Gru é meio Papai Noel”, conta o ator.

A singularíssima voz do personagem surgiu depois de alguns testes na Illumination Entertainment, mas tomou forma de fato quando o ator voltou do estúdio para jantar com a mulher, Nancy, com quem se casou há nove anos, e os dois filhos, Elisabeth, 12, e Johnny, 9. “O que buscava na voz de Gru era um sotaque de mentira, algo que não existe, que não é de país algum, ou seja, que jamais poderia soar errado. A voz final foi a que fez meus filhos rirem mais alto. Experimentei com Elisabeth e Johnny. Cheguei em casa e falei para eles, acho que o Gru vai soar assim, o que acham? E eles choraram de rir. E não foi difícil reencontrar a voz do Gru para o segundo filme, pois começamos a gravar logo depois do primeiro entrar em cartaz e explodir nas bilheterias. Passei os últimos dois anos e meio na companhia dele, entrando e saindo das salas de gravação do estúdio”, diz.

“Meu Malvado Favorito 2” conta com um auxílio luxuoso de última hora, a voz de Johnny Carell, fã ardoroso dos “minions”. É dele um dos sons estranhíssimos -- e hilários -- traduzidos no filme como o dialeto das criaturazinhas. “Olha, Johnny não tem nada de ator-mirim. Não tem interesse algum em atuar. Ele ama os minions e pronto. Ama tanto que se ofereceu para fazer a voz de um deles. Quando vi, ele já estava sentado na frente do microfone e criou, seriíssimo, a voz. Confesso que achei hilário testemunhar aquele momento, os diretores falando para ele: Johnny, agora uma voz mais malvada. E ele lá, todo compenetrado. Pena eu não ter gravado. Foram quatro ou cinco minutos apenas, mas tinha uma equipe toda lá. E na saída ele ainda me disse: 'Pai, a equipe técnica era muito boa, você não acha?'. E, depois de concordar, fiquei pensando: 'Mas quem é esta pessoa? Agora vai passar a usar óculos escuros e falar olhando para o céu?'”, brinca.

TRAILER DUBLADO DE "MEU MALVADO FAVORITO 2"

Depois de soltar uma gargalhada gostosa ao falar com carinho do filho, Carell pensa no cerne da nova animação, a aparição do amor na vida de Gru. Uma das cenas mais divertidas é justamente quando ele toma coragem e convida uma agente da Liga Anti-Vilões (voz da comediante Kristen Wiig) para um jantar.

“Minha mulher e eu ficamos ruminando a ideia de sairmos para um encontro por um tempão. Ela trabalhava do outro lado da rua do teatro Second City em Chicago, como bartender. E eu lá, estudando e dando aulas de comédia. Arrumava motivos para atravessava a rua o tempo todo e batia longos papos com ela. Até que um dia acabei dizendo: 'Sabe que se eu tiver de convidar uma mulher para sair, ela seria exatamente como você?'. E ela: 'Sabe que se um cara como você me convidasse, não pensaria duas vezes?'. E repetíamos isso por semanas! Até que finalmente tomei coragem e disse: 'Você quer sair comigo?'. Ela olhou de volta e disse apenas: 'Sim'. Estamos casados até hoje. Parece cena de filme, eu sei, mas foi assim que aconteceu comigo”, jura.

No ano passado, quando completou meio século de vida, Carell saboreou sua primeira festa-surpresa. A mulher convocou 120 amigos e os filhos fizeram um vídeo caprichado. O ator não disfarça a emoção e diz que, para ele, a celebração inesperada se traduziu como um “ato de afirmação de que a vida, até agora, deu muito certo”. O barulho e a comunhão da reunião em casa não poderiam ser mais distantes da solidão no estúdio de gravação, em que personagens como Gru nascem da cabeça do ator versátil, que volta à tela grande este ano como o Brick Tamland de “O Âncora: A Lenda de Ron Burgundy”.

“São duas experiências completamente diferentes, a de atuar com seus colegas e a de imaginar uma voz para uma animação. Mas não é chato ficar sozinho no estúdio não. Tem uma coisa libertadora, você pode fazer o que quiser. Mesmo. Qualquer coisa", disse. "Se não for bom, eles simplesmente não colocam no filme. Não há limites para nada, para improviso, para o exagero, para o que é ou não apropriado. E até a solidão é relativa, pois há um monte de gente da parte técnica te vendo, do lado de fora do seu casulo. Confesso que tento fazer eles rirem o tempo todo. Você não pode ouvi-los, mas pode ver as risadas acontecendo em tempo real. É algo muito especial.”