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Cult, Wes Anderson apura perfeccionismo em novo filme, que abre o Cine PE

Estéfani Medeiros

Do UOL, em Berlim (Alemanha)

25/04/2014 05h30

A mistura de tons de rosa e personagens idiossincráticos, unidos ao cinema irônico do leste europeu, pode ter criado um dos filmes mais ambiciosos de Wes Anderson, cineasta cult mais bem-sucedido da atualidade. Oitavo longa da carreira do diretor americano, "O Grande Hotel Budapeste" é apresentada pela primeira vez no Brasil neste sábado (26), na abertura do 18ª Festival de Cinema de Pernambuco, o Cine PE, em Recife.

Inspirado pelos romances de Stefan Zweig (conhecido por aqui por cunhar o bordão "Brasil, país do futuro") e recheado de referências relacionadas ao Velho Continente, "O Grande Hotel Budapeste" fez sua estreia mundial no Festival de Berlim, em fevereiro, para logo depois, em março, quebrar um recorde em sua estreia norte-americana: com exibição em apenas quatro salas, arrecadou US

Inspirado pelos romances de Stefan Zweig (conhecido por aqui por cunhar o bordão "Brasil, país do futuro") e recheado de referências relacionadas ao Velho Continente, "O Grande Hotel Budapeste" fez sua estreia mundial no Festival de Berlim, em fevereiro, para logo depois, em março, quebrar um recorde em sua estreia norte-americana: com exibição em apenas quatro salas, arrecadou US$ 811 mil, uma média de US$ 202,8 mil por sala, tornando-se a melhor estreia limitada de todos os tempos nos Estados Unidos.

nbsp;811 mil, uma média de US$ 202,8 mil por sala, tornando-se a melhor estreia limitada de todos os tempos nos Estados Unidos.

Box "O Grande Hotel Budapeste" - Divulgação - Divulgação
Em "O Grande Hotel Budapeste", o público é apresentado à república fictícia da Zubrowka, onde, em um flash-back dentro de um flash-back, uma garota visita o busto de um autor já morto, apresentado com uma citação de Stefan Zweig. O escritor é Tom Wilkinson (Jude Law; na foto) e o filme começa com sua hospedagem no Grande Hotel Budapeste em 1968. No hotel vazio e já sem charme, ele conhece o proprietário Mustafa, dono do local que quer contar a sua vida.
Imagem: Divulgação

Reconstrução da Europa pré-guerras
No ano em que a Primeira Guerra Mundial faz 100 anos, a Europa dos 1900 é reconstruída com o preciosismo estético que consagrou Anderson como um dos cineastas mais autênticos de sua geração. A transição do estilo clássico, da arquitetura neo-barroca e rosa para os regimes políticos totalitários e seus prédios de concreto cinza, frios e robustos, é retratada com sutileza e ironia no filme. Das vidas perfeitas e elegantes às perseguições políticas. 

A equipe fez uma minuciosa pesquisa relacionada a vida no início do século 20 e boa parte do material foi reproduzido em maquetes e com filmagens em Görlitz, cidade no sudeste da Alemanha onde parte da arquitetura antiga foi mantida. Em Berlim, onde seu filme foi recebido com aplausos, Anderson explicou aos jornalistas presentes que a equipe chegou a visitar Budapeste para procurar locações, mas a referência no nome é a única ligação.

"Estivemos em Budapeste pensando que deveria existir um lugar em que pudéssemos filmar, mas precisávamos de uma cidade menor, não uma grande cidade, e optamos por misturar todas as referências que encontramos. Mantivemos o nome do hotel porque existem cafés chamado Nova York em Paris, e queríamos mostrar uma Budapeste que fica ali na esquina. Esse é um filme inspirado pela vida e cultura do leste europeu, queremos apresentá-lo assim", disse.  

O diretor também contou que, durante as filmagens, a produção promoveu uma sessão com referências do cinema local. "Na nossa biblioteca em Görlitz assistimos a 'Grand Hotel', de Edmund Goulding, 'To Be or Not to Be', de Ernst Lubitsch, 'Ama-me Esta Noite', de Rouben Mamoulian e 'Tempestades d'Alma', de Frank Borzage."

O rosa é o novo amarelo
Apesar de ser um tema com referências bem diferentes das crises familiares cômicas retratadas nos tons amarelados de "Os Excêntricos Tenenbaums" e "Viagem a Darjeeling", Anderson parece mais preocupado em aprimorar sua fórmula do que em criar uma nova. Isso significa que os fãs se apaixonarão ainda mais pelas cenas filmadas de cima, imagens milimetricamente centralizadas, atuações coreografadas, paletas de cores estranhamente harmônicas e infinitos detalhes nos cenários e transições de cenas. O que provavelmente desagradará quem não preza pela ostentação do perfeccionismo nas telonas.

A justificativa é de que a maior parte da equipe tem seguido o cineasta e criado seu próprio estilo de fazer cinema. O responsável pela direção de arte, Adam Stockhausen, também trabalhou em "Moonrise Kingdom", assim como o diretor de fotografia  Robert D. Yeoman, que deu vida aos Tenenbaums. Além dos atores Owen Wilson, amigo de longa data, e Bill Murray, que se consagrou um ícone da cultura pop e, mesmo nos eventos para a imprensa e no tapete vermelho, usa a touca que remete a seu personagem em "A Vida Marinha com Steve Zissou".

"Sinto que, para mim, a experiência de fazer cinema é a experiência com as pessoas com quem eu o faço. Essa é uma equipe que já me acompanha a muitos filmes e os atores são os grandes responsáveis por trazer o conto de fadas à realidade", diz Anderson.

Crítico do NYT fala sobre "O Grande Hotel Budapeste"

"Wes sempre tem uma visão diferente, às vezes ela sai diretamente do roteiro, com os detalhes do que ele tem na cabeça. Obviamente, fizemos filmes diferentes em diversas partes do mundo, eles seguem o caminho das histórias. Mas estamos aprendendo a fazer filmes do nosso próprio jeito, somos uma família que viaja junto e faz o que gosta", completa o produtor Jeremy Dawson. 

O filme transita na linha tênue entre o trágico, com a sensação de que a guerra está chegando, e o cômico, com surpresas inteligentes nos diálogos do concièrge Mister Gustave (interpretado por Ralph Fiennes). Entre os motivos para assistir a "O Grande Hotel Budapeste" estão a caracterização de Madame D. (que transformou Tilda Swinton em uma passional senhora de 80 anos) e a estreia do jovem Tony Revolori, que forma uma dupla desengonçada como assistente de Gustave.

Uma homenagem aos romances de Stefan Zweig
"O Grande Hotel Budapeste" é inspirado na obra do autor austríaco Stefan Zweig, considerado um dos últimos a retratar o estilo de vida do século passado. Judeu exilado no Brasil durante o nazismo, foi consagrado por seus romances escritos no pré-Segunda Guerra, entre eles "Amok" e "Confusão de Sentimentos", ambos mencionados por Anderson como influências.

"Esse filme tem muitas influências de Zweig. Ele não era muito famoso nos Estados Unidos, mas na Europa todo mundo conhece o trabalho dele. Li pela primeira vez há alguns anos, me apaixonei nas primeiras páginas e li todos os seus livros de ficção. O que achei mais incrível foi 'O Mundo de Ontem'. A intenção foi fazer a nossa própria versão de um romance de Zweig, inspirados pelo seu jeito único de contar histórias", finaliza.