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Distribuição e falta de profissionais são entraves para animação nacional

Natalia Engler

Do UOL, em São Paulo

26/07/2014 16h21

A animação brasileira está passando por um momento muito produtivo –com dois prêmios seguidos em Annecy, principal festival do gênero no mundo, e uma produção que saltou de um longa no circuito comercial entre 1995 e 2004 para 15 entre 2005 e 2014. Mas, apesar do reconhecimento internacional e da grande presença no circuito comercial, a produção nacional ainda sofre com problemas graves, como falta de profissionais, de escolas para formá-los e baixas bilheterias.

“Nós não podemos dar bobeira”, diz Luiz Bolognesi, que venceu o prêmio de melhor longa-metragem em Annecy em 2013 com “Uma História de Amor e Fúria” e participou do júri do festival este ano. “Não há uma política específica para a animação, os recursos são muito poucos, os espaços reservados nos editais ainda são muito pequenos, mas, sobretudo, o principal gargalo é que nós não temos escola, nem faculdades de animação, nem cursos técnicos. E é por isso que corremos o risco de perder a grande oportunidade do momento”, aponta.

Atualmente, o país conta com algumas iniciativas, especialmente de cursos técnicos e livres, em pequenas escolas particulares. Mais recentemente, algumas universidades vêm investindo em cursos sequenciais e graduação em animação, como é o caso da UFMG, Faap e UFSC.

Cesar Coelho, um dos fundadores do Anima Mundi –principal festival nacional de animação– explica que o evento sempre busca parcerias com grandes escolas internacionais, justamente para promover o ensino da animação no país, mas também acredita que ele ainda é insuficiente.

“Aprendemos por nós mesmos. Alguns estão estudando no exterior, voltam para cá. Mas a maioria, quando vai estudar no exterior, fica por lá. Isso também é uma comprovação de como o brasileiro é bom para a animação”, afirma Coelho.

Para ele, algumas iniciativas que estão sendo formadas enfrentam outro problema: a falta de professores. “A maioria dos grandes animadores estão trabalhando muito, não têm tempo para dar aulas”, diz. “Então, precisamos investir em formar professores”.

Alê Abreu, que venceu Annecy este ano com “O Menino e o Mundo”, também teve dificuldades em encontrar profissionais qualificados. “Não só pelo fato de faltarem profissionais, mas faltaram profissionais muito específicos. 'O Menino e o Mundo' teve uma produção muito diferente, uma técnica que a gente inventou para alcançar essa estética toda diferente. Não era um filme que qualquer um básico de animação podia vir para cá, a gente teve que formar os profissionais”, conta.

Mas, para ele, o sucesso atual da animação nacional pode ser positivo também para a formação de novos profissionais. “Mais do que nunca, tenho  tido retorno de muitos estudantes e pessoas mais jovens que me procuram. E percebo como é importante quando a gente pode se dar ao luxo de hoje ter modelos brasileiros, luzes que vão apontar um caminho para uma nova geração avançar”, acredita.

Para tentar melhorar a situação descrita pelos profissionais, a Ancine, Agência Nacional do Cinema, promete fortes investimentos na capacitação de profissionais. Segundo sua assessoria de imprensa, no momento a agência está mobilizando esforços junto aos ministérios da Educação e da Cultura para oferecer, ainda em 2014, cursos de capacitação para profissionais do setor audiovisual em 12 capitais, incluindo cursos para roteirista de animação, animador em stop motion, desenhista de animação e pós-produtor de animação.

Público
Outro setor em que a animação nacional precisa avançar é em conquistar um grande público, já que a maior parte da produção ainda é exibidas em salas mais voltadas para o cinema de arte e tem bilheterias tímidas. “O Menino e o Mundo” foi visto por cerca de 27 mil pessoas, e “Uma História de Amor e Fúria”, por cerca de 30 mil.

“Estamos em um momento ultrafértil, vai acontecer muita coisa nos próximos anos. A gente conquistou a coisa mais difícil, que é o reconhecimento da qualidade. O desafio é que nós não conquistamos o nosso público aqui no Brasil. Meu filme e o do Alê estão rodando o mundo, mas tiveram uma bilheteria muito pequena aqui”, aponta Bolognesi.

“A gente vê o cinema brasileiro fazendo os grandes sucessos de bilheteria com alguns gêneros, que são o que o público realmente vai assistir. Se alguém fizer um ‘Shrek’ brasileiro, com certeza vai ter público”, aponta Caio Gullane, sócio da produtora Gullane, responsável por “Uma História de Amor e Fúria” e já trabalhando em um projeto para adaptar “A Arca de Noé”, de Vinicius de Moraes.

Segundo ele, no entanto, é difícil competir com as grandes produções, que chegam a custar US$ 200 milhões, enquanto “Uma História de Amor e Fúria”, por exemplo, custou cerca de US$ 2 milhões.. “Nesse início da pesquisa com animação por aqui, não adianta querer competir e querer fazer orçamentos semelhantes aos das grande animações dos estúdios”, acredita Gullane.

Para ele, o problema de publico também afeta animações mais autorais de outros países, com mais tradição, que não chegam a alcançar grandes bilheterias no Brasil. “O público está acostumado a assistir a um tipo de filme, e é difícil quebrar isso. Acho que é como o que está acontecendo com o nosso cinema: a constante produção nacional vai acabar ampliando o público para os nossos próprios filmes”, afirma Gullane.

Bolognesi tem uma visão semelhante. “Será que a gente vai conseguir conquistar público e bilheteria? Eu não sei, é um desafio muito grande. Nós não temos as condições de fazer, porque você não faz filme de público com os orçamentos que nós temos. Acho que somos capazes e que temos aprendido que não é para imitar a Pixar e a Disney, porque fica sempre no meio do caminho. Temos que tentar encontrar um caminho autoral, mas que fale com mais gente e chegue em um público maior”, acredita.

Para Alê Abreu, a animação sofre das mesmas dificuldades que o cinema nacional em geral. “A gente tem salas de cinema de grandes conglomerados que só exibem os filmes blockbusters, e o que eles põem lá não é necessariamente o que o público quer”, acredita. “Se você colocar o cinema brasileiro nas salas dos blockbusters, as pessoas vão ver, porque estão acostumadas a ir ao cinema não para ver um filme, mas ir àquele shopping, ir àquela sala. É como se fosse um canal de TV. A questão é o canal. Não tem a ver com o filme, tem a ver com o que está passando na sala onde as pessoas vão”.

Distribuição
Para Cesar Coelho, o problema também não está em conquistar o público, mas na cadeia distribuidora. “O Anima Mundi é uma prova concreta de que existe um público enorme para animação no Brasil. Recebemos cerca de 100 mil pessoas por ano”, aponta.

“O que a gente precisa conquistar não é o público, é a cadeia distribuidora”, explica Coelho. “Eles não sabem trabalhar com animação, não têm costume, é muito recente. É diferente um lançamento para animação. Ela te oferece muito mais recursos: tem licenciamento de produtos, personagens que não cobram cachê para fazer comercial, que podem virar bonecos e muitas outras coisas. São poucos os profissionais que sabem trabalhar com isso em animação. O Mauricio de Sousa usa para caramba. Essa cadeia de distribuição e de licenciamento é outra grande arma para a animação”, acredita.

Caio Gullane concorda, e afirma que sua empresa vê a animação como um bom negócio. “Do ponto de vista de negócio, a gente entende como ótima oportunidade, porque a animação também proporciona, além de um público que já é cativo desse tipo de filme, outros tipos de negócio, como licenciamentos. Realmente é uma atividade que merece uma atenção, e a Gullane tem uma atenção voltada para isso”, conclui.

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