Mostra de São Paulo traz obras-primas e tesouros escondidos de Almódovar
Pedro Almodóvar tira sarro há quarenta anos. Seus filmes se tornaram simbólicos porque sua anarquia colorida, ao mesmo tempo que celebra a intensidade do espírito latino e guarda um discurso político que já não precisa mais ser verbalizado, é naturalmente sarcástica. Por isso, parece ironia que justamente quando é o principal homenageado de uma edição da quase quarentona Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, o cineasta espanhol mais influente dos últimos trinta anos não possa vir à festa.
Almodóvar passou recentemente por uma cirurgia nas costas e está impedido de fazer longas viagens de avião. “O convite ainda está lá, quem sabe ele não aparece?”, brinca a diretora da Mostra, Renata de Almeida. Mesmo assim, o diretor assinou o cartaz do evento, que tem a tradição de convidar cineastas para a função, e vai ter 15 dos 20 longa-metragens que dirigiu exibidos na Mostra. Apenas “Matador”, e os mais recentes “Má Educação”, “Volver” e “Abraços Partidos” não serão apresentados nas duas semanas do festival, que começa nesta quarta-feira (15).
A homenagem ao espanhol segue a linha que a Mostra adotou nos últimos anos: escolher diretores mais conhecidos para ganhar retrospectivas dentro do evento, como aconteceu com Stanley Kubrick no ano passado. E Almodóvar é um dos diretores estrangeiros mais adorados no Brasil, desde que seus filmes começaram a ganhar prestígio internacional. Nestes quarenta anos, é possível perceber a evolução de sua maneira de filmar, que ficou mais elegante e segura e menos desbocada, mas sem perder a ousadia, as temáticas e as características cromáticas de seu cinema.
O deboche e os parceiros de longa data Carmen Maura e Antonio Banderas --estrelas de seus primeiros trabalhos, como “Pepi, Luci e Bom e Outras Garotas de Montão” e “Labirinto do Paixões”-- continuaram nos filmes feitos numa segunda etapa, em que seu nome já era conhecido mundo afora. Filmes como “Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos” e “Ata-me!” ilustram essa época. Com “A Flor do Meu Segredo”, com outra companheira das antigas, Marisa Paredes, inicia o que muita gente chama de sua fase mais madura, que se cristaliza com “Tudo Sobre Minha Mãe” e “Fale com Ela”.
Nos últimos anos, entre altos e baixos, mantém sua popularidade e seu prestígio, e encontra seu ápice em “A Pele que Habito”, em que retoma a parceria com Banderas. Há pelo menos duas décadas, seu nome é quase uma unanimidade no circuito de filmes de arte do Brasil. “Vamos ver o novo Almodóvar” possivelmente só encontra par com “vamos ver o novo Woody Allen”. Embora tenha engolido alguns sapos nos últimos tempos, o espectador sabe bem o que vai encontrar num filme do espanhol: latinidade, sarcasmo, uma paleta de cores bem marcada e uma tentativa quase sempre válida de dar voz ao underground.
Selecionamos a seguir três obras-primas para rever e outros três tesouros escondidos para conhecer na Mostra.
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