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Brasil terá ano promissor no circuito de festivais internacionais de cinema

Cenas dos filmes "Sangue Azul" (esq.) e "Que Horas Ela Volta?", que foram selecionados para o Festival de Berlim - Aline Arruda/Divulgação
Cenas dos filmes "Sangue Azul" (esq.) e "Que Horas Ela Volta?", que foram selecionados para o Festival de Berlim Imagem: Aline Arruda/Divulgação

Flavia Guerra

Do UOL, em São Paulo

29/01/2015 06h00Atualizada em 04/02/2015 17h31

"Que horas Ela Volta?", de Anna Muylaert, foi aplaudido de pé esta semana após sua primeira sessão internacional no Festival de Sundance, nos Estados Unidos. Em fevereiro, a diretora leva seu filme também a Berlim, onde o diretor pernambucano Lírio Ferreira faz sua primeira incursão com "Sangue Azul". Os dois estão entre os 15 títulos nacionais que o evento alemão exibe --incluindo "Ausência", de Chico Teixeira, e "Jia Zhangke: Um Homem de Fenyang", de Walter Salles.

Ainda no circuito europeu, Felippe Barbosa também volta a Roterdã, na Holanda, um ano depois de ter mostrado "Casa Grande" no festival, para levar a encontros com produtores e distribuidores seu novo projeto, "Gabriel e a Montanha". Além disso, há mais 14 filmes brasileiros que integraram as seções competitivas do evento, como "O Touro", de Larissa Figueiredo e "O Fim de uma Era", de Bruno Safadi e Ricardo Pretti.

A julgar pela movimentação dos cineastas brasileiros pelos festivais que abrem o calendário 2015 dos grandes eventos de cinema do mundo, o ano começou bem para o cinema nacional.

Que Horas Ela Volta?

Estrelado por Regina Casé, "Que Horas ela Volta?" ganha destaque por ter pré-estreia internacional dupla neste início de ano, como único latino-americano em competição na seção World Première de Sundance, e com sua pré-estreia europeia na Berlinale, em sessão especial da Mostra Panorama.

“É um feito raro. Primeiramente porque é raro que filmes brasileiros integrem a competição internacional em Sundance. Segundo porque é raro que se consiga participar com o mesmo filme em Sundance e, em seguida, em Berlim. E também por isso estamos muito felizes”, afirmou o produtor do longa, Fabiano Gullane, que está nos EUA com a diretora e equipe.

Já Muylaert, que compete pela primeira vez no festival de Utah, acredita que o caráter universal do filme ganhou os corações dos selecionadores e espectadores. No longa, Regina Casé é Val, uma empregada doméstica que tem uma atitude servil na casa dos patrões em que vive, em São Paulo. Quando sua filha, que ficou em Pernambuco, decide ir para a metrópole para prestar vestibular, começa a questionar a ordem vigente da casa. "Este tipo de questão ocorre em todo lugar, com protagonistas diferentes, mas o sentimento é universal", comentou a diretora ao UOL.

Ela acredita que a participação e "Que Horas" no Festival de Locarno (Suíça), em agosto de 2014, foi decisiva para que os selecionadores de Sundance ficassem atentos a seu longa. “A gente mostrou o filme ainda em finalização em Locarno, e o selecionador de Sundance estava lá. Ele levou para a comissão do festival e isso despertou o interesse para o longa. Contávamos com Berlim. Mas Sundance se revelou uma ótima surpresa”, conta a diretora.

Trailer de "Que Horas Ela Volta?"

Berlim

Berlim terá 15 filmes brasileiros este ano, distribuídos em diversas seções, depois de uma participação tímida em 2014, com "Praia do Futuro", de Karim Aïnouz, na competição oficial. O número recorde, ainda que não inclua nenhum longa em competição, revela a boa safra de 2015.

“É uma vitrine muito interessante para que o mercado internacional conheça o filme”, acredita Lírio Ferreira, que apresentará "Sangue Azul" na abertura da mostra Panorama, seção paralela à oficial, que revela as novas produções do cinema independente mundial. Ele promete a estreia nacional do longa, que venceu o Festival do Rio 2014, para maio.

A grande participação de filmes nacionais em festivais não se deve ao acaso, acredita o produtor Fabiano Gullane, que salienta a importância de programas oficiais que apoiem a participação em competições e encontros internacionais. "Temos ainda o documentário sobre o Sebastião Salgado no Oscar ('O Sal da Terra', dirigido por Win Wenders e pelo filho do fotógrafo, Juliano Salgado), a seleção de filmes em Roterdã, Berlim... A presença do Brasil em festivais e no circuito internacional é fruto de muito trabalho e políticas públicas de incentivo são cruciais”, completa o produtor.

Felippe Barbosa também acredita na importância de manter esse canal aberto. "Meu novo projeto já tem verba para as filmagens, que ocorrem este ano em setembro, na África, mas é importante vir [a Roterdã] e encontrar compradores e distribuidores internacionais, que já vão estar atentos quando o longa ficar pronto. Cultivar esta relação é crucial para que a gente possa ocupar cada vez mais nosso espaço nos festivais e nos cinemas", declara o cineasta.

Incentivos e políticas

É justamente para manter o ritmo e emplacar filmes nacionais nos próximos festivais de 2015 que a Ancine (Agência Nacional do Cinema) e o Programa Cinema do Brasil (que trabalha a promoção de filmes brasileiros no exterior em parceria com a APEX-Brasil) pretendem intensificar as ações de apoio aos cineastas em eventos no exterior, além de trazer ao Brasil os selecionadores, distribuidores e curadores dos principais eventos mundiais para assistirem a filmes em fase de finalização, que poderão integrar no futuro as seleções dos festivais.

A nona edição do Encontros com o Cinema Brasileiro, promovido pela Ancine, ocorre entre 18 e 22 de fevereiro. Desta vez, o programa trará curadores do Festival de Cannes (Anne Delseth, da Quinzena dos Realizadores, e Julien Welter, que faz parte do comitê da Seleção Oficial), que vão escolher dez produções para exibições no MIS-SP (Museu da Imagem e do Som).

"Os jovens diretores hoje são conscientes de que a internacionalização de seus filmes começa muito cedo, antes mesmo de ter sido rodado", analisa Eduardo Valente, assessor internacional da Ancine. "Nosso papel também é este, de criar um ambiente, incentivar que as relações sejam mais próximas e que estejamos sempre nas discussões de cinema internacionais".

Apostas

Acorda Brasil - Divulgação - Divulgação
Lázaro Ramos em cena de "Acorda Brasil", de Sérgio Machado; o longa do diretor de "Cidade Baixa" é uma das apostas para a mostra Um Certo Olhar do Festival de Cannes deste ano
Imagem: Divulgação

Além das seleções já confirmadas, há ainda muitos filmes inéditos ou em finalização que podem conquistar uma vaga nos próximos grandes festivais. Em competição na Mostra de Cinema de Tiradentes, que ocorre até sábado (31) na cidade mineira, "As Fábulas Negras" revela o vigor do novo terror brasileiros e é um dos vários filmes do gênero que devem invadir as salas brasileiras em 2015. O filme de episódios, tem direção do paulista Joel Caetano, do capixaba Rodrigo Aragão, do catarinense Petter Baisestorf , além de contar com José Mojica Marins (o Zé do Caixão) na direção de uma das fábulas macabras e na atuação em outra. Gênero que vem reconquistando o espaço no circuito de arte, o terror de fábulas pode surpreender e ganhar um lugar na Semana da Crítica em Cannes ou até mesmo em Locarno.

Já o aguardado "Acorda Brasil", novo longa de Sérgio Machado ("Cidade Baixa"), também tem chance de seduzir os selecionadores de Cannes, principalmente os da seção Um Certo Olhar. Estrelado por Lázaro Ramos, Taís Araújo, Fernanda de Freitas e Sandra Corveloni, o filme  narra a saga de Laerte (Lázaro), um talentoso violinista que, após frustradas tentativas de integrar a Osesp (Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo), passa a dar aulas de música para jovens em uma comunidade carente da capital paulista. O projeto é inspirado no livro "Acorda Brasil", de Antonio Ermírio de Moraes, sobre o Instituto Baccarelli, que oferece formação musical e artística para adolescentes da favela paulistana de Heliópolis,.

Outra boa surpresa em 2015 pode ser "Mãos de Cavalo", o novo longa de Roberto Gervitz ("Feliz Ano Velho"). Estrelado por Mariana Ximenes e Armando Babaioff, foi rodado em  em Porto Alegre e Farroupilha e é baseado no romance homônimo de Daniel Galera.

Jorge Durán (" Não Se Pode Viver sem Amor") é outro veterano que lança nova produção este ano. Co-produção com o Chile, "Romance Policial" tem Daniel de Oliveira, Alavaro Rudolphy e Daniela Ramirez em um drama sobre um funcionário público e escritor nas horas vagas que decide viajar até o seserto do Atacama, no Chile, onde pensa encontrar a inspiração que lhe falta.

 Veja abaixo como está o panorama do cinema nacional nos festivais de 2015: