Paulo Betti: Assisti ao filme "Chatô" e posso dizer que é muito bom
Assisti ao filme "Chatô, o Rei do Brasil" recentemente, em uma exibição fechada em um shopping no Rio de Janeiro, junto com Gabriel Braga Nunes e outras pessoas da produção. O longa, dirigido por Guilherme Fontes, está pronto e posso dizer: é muito bom.
A narrativa, muito curiosa e empolgante, começa na posse da rainha Elizabeth na Inglaterra, destino de Assis Chateaubriand, o Chatô, para adquirir obras de arte. Logo depois, o magnata da televisão brasileira sofre um AVC (acidente vascular cerebral) e passa a delirar sobre uma situação em que ele está em um tribunal, onde sua vida está em julgamento. Nesse julgamento --uma mistura de programa "Cassino do Chacrinha" com Silvio Santos--, pessoas acusam Chatô: amantes, conhecidos e o então presidente, Getúlio Vargas, vivido por mim.
Não é um filme realista, já que tudo acontece a partir desse delírio dele. O sotaque do Getúlio, por exemplo, é um gaúcho antigo. E, como o filme tem mais de 15 anos [a produção começou a ser rodada em 1999], você pode imaginar que esteja amarelecido. Mas não tem nada disso: é um filme absolutamente novo. O curioso é que a gente pode se ver mais novo. Andrea Beltrão está deslumbrante como a amante Vivi Sampaio, assim como Eliane Giardini no papel de Consuelo. Já Leandra Leal e Gabriel Braga Nunes aparecem muito novos, meninos, dando vida à Lola e Rosemberg, respectivamente.
Reflexão
Independentemente de ser bom ou ruim, eu gostaria que esse trabalho provocasse uma reflexão da imprensa, dos órgãos oficiais do governo, da Ancine [Agência Nacional do Cinema], para que parem de tratar os diretores de cinema como se fôssemos um bando de desonestos, querendo ganhar uma grana em cima de um orçamento de um filme.
Dificilmente você produz um filme para fazer uma falcatrua e sempre somos tratados como se fôssemos uns ladrões. Toda hora tem alguém querendo ver se tem um defeitinho de orçamento. O escândalo que existe no Brasil em relação ao cinema é não ter tela para passar nossos filmes. O longa do Guilherme custou R$ 8 milhões. Não é muito. Percebe-se que "Chatô" é um filme com custos altos e com uma grande produção: tem muitos figurinos, carros antigos, figurantes. Cinema é caro. O aluguel de uma câmera razoável, por exemplo, custa R$ 80 mil por mês.
Quando Guilherme trouxe para o Brasil o cineasta norte-americano Francis Ford Coppola, diretor de "Poderoso Chefão" e "Apocalipse Now", precisou desembolsar US$ 100 mil para que ele desse uma consultoria. Coppola ficou hospedado no Hotel Copacabana Palace, sendo badalado por todos. A imprensa adorou ver Coppola de calção no calçadão do Rio. Agora todo mundo acha uma m**** ter gastado US$ 100 mil, mas Coppola não vem de graça. Eu também não vou de graça em alguns lugares.
É preciso prestar atenção em uma certa demonização das pessoas. Naquela época, Guilherme era um garoto com uma carreira promissora na televisão. Por que ele ia querer roubar R$ 1 milhão, encobrindo nos custos de "Chatô"? O que é esse valor para um cara que é galã da Rede Globo? Ele foi crucificado e, agora, o cara ficou 15 anos com fama de bandido, de ladrão, de filho da p***.
Agora ele está mostrando que não foi nada disso. O trabalho está aí. Ninguém tem noção do grau de burocracia que envolve a feitura de um filme. Constantemente aparece um fiscal para questionar: "Onde estão aqueles R$ 500?".
Francamente, agora não tem mais nem jeito de analisar esse filme, depois de 15 anos. Acho que Guilherme deveria se colocar na porta do cinema como se fosse uma estátua de cera para ser visto como o próprio ladrão ou o assassino. "Chatô" está embolado com isso, vai estrear com essa marca ruim. São 15 anos na vida de uma pessoa, 15 anos como se estivesse preso e agora é libertado.
* Paulo Betti é ator, diretor e produtor. "Chatô" ainda não tem data de estreia definida.
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