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"O filme me colocou na pele da minha irmã trans", diz ator de Mãe Só Há Uma

Mariane Zendron

Do UOL, em São Paulo

20/07/2016 12h43

O garoto que chamou a atenção no teste de elenco para "Mãe Só Há Uma" não foi o que demonstrou mais talento para dançar, mas o que deixava o corpo ser conduzido pela música. Foi assim que Naomi Nero foi escolhido para protagonizar o novo filme de Anna Muylaert, que estreia nesta quinta-feira (21).

O estreante encarou a missão de viver Pierre no longa inspirado livremente no caso Pedrinho, de 2002. No vida real, o jovem de 17 anos descobriu que não foi adotado, mas roubado de outra família. No filme de Anna, no entanto, o sequestro é pano de fundo e o foco está no processo de transição de gênero enfrentado pelo garoto. 

O sobrenome do ator entrega que a arte está no sangue. Naomi é sobrinho do ator Alexandre Nero, mas ele explica que o exemplo não vem só do tio. "Minha mãe é atriz (Ana Nero), minha tia é produtora de cinema (Andrea Nero), meu tio é ator (Alexandre). Meu pai dirige filmes publicitários. Meus primos também são atores. Todo mundo é artista na família. Era uma coisa meio inevitável", conta.

Cartaz do filme "Mãe Só Há Uma", de Anna Muylaert - Divulgação - Divulgação
Naomi Nero no cartaz do filme "Mãe Só Há Uma", de Anna Muylaert
Imagem: Divulgação


No entanto, o que o aproximou do filme não foi o talento artístico da família, mas algo mais íntimo. "Minha irmã é trans e esse filme fez com que eu me colocasse na pele dela. Não sabemos se o personagem é trans, ele está se descobrindo, mas essa fuga do padrão de gênero me ajudou a me colocar no lugar dela", explica.

Mesmo ainda pouco acostumado com entrevistas, Naomi não demonstra nenhuma resistência ao falar de sexualidade em geral e até da sua própria. "Minha família sempre foi muito aberta, mas há a preocupação porque existe o preconceito com qualquer coisa que fuja da cis-hetero normalidade. Eu me descobri bissexual na pré-adolescência, mas foi difícil aceitar porque as pessoas não aceitam. E olha que eu tenho um lado aceito pela sociedade, mas isso nunca me afetou a ponto de eu não querer revelar".

Outro desafio de Naomi foi contracenar com a mesma atriz no papel das duas mães. Dani Nefussi vive Aracy e Glória, a sequestradora e a mãe biológica que reencontra o filho roubado anos depois.

Também diretora de atores, Nefussi diz que seu trabalho foi criar uma paixão entre a mãe sequestradora e Pierre. "No caso Pedrinho, a mãe não-biológica e o filho tinham uma relação passional. Criado isso, depois foi fácil estabelecer a rejeição com ele e a outra mãe, a Glória", explica Dani.

"Dani me ajudou muito na construção do personagem. Eu tive que senti-lo, achá-lo dentro de mim. A experiência do cinema é diferente da que eu tive no teatro. Eu gosto de pensar que o teatro é uma representação da vida e o cinema é uma simulação da vida", diz Naomi.

O sorriso relaxado só aparece no final da entrevista, quando surge a pergunta sobre se ele gosta do resultado do filme. "Se eu gosto? Eu adoro. Tenho vontade de estudar cinema. Não sei ainda se quero ficar na frente ou atrás das câmeras, mas quero ficar nessa área".