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Benedict Cumberbatch, novo herói da Marvel, preferia Asterix a super-heróis

Doutor Estranho - Divulgação - Divulgação
O Doutor Estranho apareceu pela primeira vez nas HQs em 1963 e foi influenciado pela contracultura, a psicodelia e o misticismo da época
Imagem: Divulgação

Pedro Caiado

Colaboração para o UOL, em Surrey (Inglaterra)

01/11/2016 06h00

Por muitos anos antes do anúncio do filme do Doutor Estranho, personagem dos quadrinhos da Marvel, o nome de Benedict Cumberbatch aparecia pela internet ligado ao projeto como uma promessa. Quando virou realidade, o ator admitiu que ficou intimidado. "É um papel fisicamente difícil, mas é divertido. Eu nunca fui protagonista de um filme tão grande", contou ele, durante as filmagens na Inglaterra.

"Doutor Estranho", que estreia nesta quinta-feira (3) no Brasil, é o 14º filme do universo Marvel e o menos super-herói de todos. Stephen Strange é um neurocirurgião bem-sucedido, porém egocêntrico, que vive em Nova York e apareceu nas HQs pela primeira vez em 1963. Ele tem sua vida transformada após um trágico acidente de carro, que o faz perder o movimento das mãos e põe sua carreira em pausa. Strange inicia, então, uma viagem pelo mundo e começa um processo de descobertas.

O personagem é novo entre os heróis do cinema e também era novidade para o próprio Cumberbatch, que confessa nunca ter sido exatamente um grande leitor de quadrinhos. "Eu não conhecia nada do Doutor Estranho", confessa. "Eu não lia quadrinhos de super-heróis. Eu gostava mais de Asterix e outros que me pareciam mais baseados na realidade. Mas eu lembro de ler Batman e Superman. Batman talvez tenha me marcado mais como criança. E lembro do seriado na TV e do filme do Tim Burton. Mas eu nunca tive obsessão com quadrinhos, na realidade", conta Cumberbatch.

Nascido em Londres, o ator de 40 anos se tornou conhecido por sua atuação na série de TV "Sherlock". No cinema, atuou em filmes de fantasia como as franquias "Hobbit" (como um dragão, com captura de movimentos) e "Star Trek", e foi indicado ao Oscar pela história do matemático Alan Turing em "O Jogo da Imitação". Ele também interpretou Shakespeare no teatro com "Hamlet", em 2015, e há dois anos entrou na lista da revista "Time" como uma das cem pessoas mais influentes do mundo.

Não parece propriamente um intérprete típico de super-herói, mas o Doutor Estranho também não é exatamente um super-herói comum: ele foi inspirado na contracultura, na psicodelia e no misticismo dos anos 1960, e talvez suas peculiaridades ajudem a explicar porque Cumberbatch se interessou por interpretá-lo.

“Quando eu sentei com o Kevin Feige [produtor do filme e CEO da Marvel] e o Scott [Derrickson, diretor] e li a história, eu entendi que esse personagem seria uma evolução para o mundo da Marvel, porque é um herói muito diferente do que o que vimos até agora", diz o ator. "Ele não é uma pessoa ruim, ele somente perdeu a maneira de amar. Ele se fechou. É respeitado como um neurocirurgião no início e é até bem severo com os colegas, mas não taxado de arrogante, como o Tony Stark", acredita ele, fazendo uma comparação com o empresário bilionário que se transforma em Homem de Ferro.

Oriente e artes marciais

O UOL visitou o set do filme nos estúdios de Longcross em Surrey, a 50 quilômetros de Londres (o mesmo de "Thor 2" e" Guardiões da Galáxia"). Encontramos Cumberbatch no set da cidade fictícia de Kamar-Taj, que reproduz uma colônia escondida no Nepal onde, no universo Marvel, estudantes aprendem artes místicas. É lá que Stephen Strange desenvolve seus poderes mágicos.

Cumberbatch repete uma cena que envolve complexos movimentos de artes marciais, enquanto é observado pelo ator Chiwetel Ejiofor, o Baron Mordo, tutor do Doutor no filme. E, ao contrário dos quadrinhos, aqui ele não é seu rival. Após varias tentativas, Cumberbatch parece estar no controle dos movimentos, no melhor estilo Jackie Chan, fazendo até brincadeiras entre as cenas.

"Doutor Estranho" foi filmado no Nepal, na cidade de Catmandu, e em sets montados em Londres e Nova York. A real experiência prévia do ator como professor de inglês no Nepal, em seus anos pré-fama, ajudou-o a entender melhor o mundo de Strange. "Eu lembro que escolhi aquele lugar na época porque era muito longe da minha zona de conforto. Eu estava interessado nas lições do budismo e na maneira como eles percebem a vida", conta, com fascínio. "A experiência que eu tive na época foi parte do apelo que me atraiu a fazer esse filme. O Doutor Estranho tem essa mente lógica e fechada que muda ao se deparar com uma sabedoria tão diferente".

Parte dessa sabedoria que o personagem absorve tem uma forma bem concreta: as artes marciais. E, nesse caso, Cumberbatch não tinha experiências do passado que pudesse ajudá-lo. "A não ser que você conte o judô, que eu pratiquei por cinco vezes quando era criança, eu não tenho experiência com artes marciais. Eu lembro que machucava muito e nunca gostei de lutar".

O ator conta que os ângulos das filmagens o ajudaram a parecer mais experiente do que realmente é. "É difícil ensaiar tudo certo, porque eu tenho que fazer tantas coisas para esse papel; cenas de ação, truques, treinamento, além de estar 12 horas no set. É difícil ter tempo suficiente". Mas as dificuldades enfrentadas por ele podem ter ajudado o personagem, acredita Cumberbatch. "Essa é uma história sobre as origens, e eu acredito que eu e ele melhoramos com o passar da história. É um processo de crescimento proposital e acidental".

E nem tudo foi sacrifício para ele no set. "Há algo prazeroso em relação às artes marciais. É um ótimo exercício. Essa repetição é quase que uma meditação", diz ele, interrompendo para perguntar ao seu assessor: "Eu posso falar sobre o que estamos filmando nesse momento?". Com a resposta afirmativa, ele segue: "Nessa cena, o Doutor está fisicamente abalado, então ele não tem poder algum. Fazer essa cena perfeitamente é um pouco como atuar bêbado, você tem que estar bem sóbrio para atuar como bêbado, sabe? Eu sou fascinado pela disciplina e como as artes marciais são criadas também para os filmes. É uma dança, é pura coreografia".

Medicina

E não foi apenas no universo dos quadrinhos e na cultura oriental que o ator foi buscar inspiração e ajuda para compor este personagem. "Eu conversei com alguns cirurgiões que me confessaram um nível de incerteza na profissão e também os problemas que têm para aceitar o fracasso quando uma cirurgia dá errado. É fascinante a disciplina que eles têm que ter", diz.

Para se preparar, ele leu o livro de Henry Marsh, chamado "Sem Causar Mal - Histórias de Vida, Morte e Neurocirurgia". "É uma história dolorosa de um neurocirurgião. E no set tivemos um fantástico neurocirurgião que me deu conselhos para não fazer nada errado. Eu adoro esse aspecto do meu trabalho, me sinto privilegiado".

Cumberbatch retornará ao papel do Doutor Estranho na próxima sequência de "Os Vingadores", programada para estrear em 2018.