Topo

Em 1976, Kubrick, Fellini, Altman e Lumet perdiam o mesmo Oscar

Os vencedores do Oscar 1976 por "Um Estranho no Ninho" (da esq. para dir.): o produtor Michael Douglas, o diretor Milos Forman, a atriz Louise Fletcher, o ator Jack Nicholson e o produtor Saul Zaentz - Michael Montfort/Michael Ochs Archives/Getty Images
Os vencedores do Oscar 1976 por "Um Estranho no Ninho" (da esq. para dir.): o produtor Michael Douglas, o diretor Milos Forman, a atriz Louise Fletcher, o ator Jack Nicholson e o produtor Saul Zaentz
Imagem: Michael Montfort/Michael Ochs Archives/Getty Images

Guilherme Bryan

Colaboração para o UOL

20/12/2016 12h07

Já pensou em Federico Fellini, Stanley Kubrick, Robert Altman e Sidney Lumet disputando o mesmo Oscar de direção e perdendo para Milos Forman? E “Um Estranho no Ninho” ganhando o prêmio principal, numa disputa com “Barry Lyndon”, “Tubarão”, “Nashville” e “Um Dia de Cão”? E Jack Nicholson sendo premiado pela primeira vez como melhor ator, depois de já ter sido indicado outras três vezes na categoria? Parece inacreditável, mas tudo isso aconteceu na mesma noite de 29 de março de 1976, em Los Angeles, nos Estados Unidos, na 48ª edição do Oscar.

Mas se à primeira vista essa parece uma das edições mais concorridas de todos os tempos, o crítico de cinema e comentarista do Oscar Rubens Ewald Filho esclarece: “Foi disputado em termos, porque era uma época que esnobava Steven Spielberg e Robert Altman. Até o fim, Sidney Lumet, indicado cinco vezes, foi ignorado. Só ganhou um Oscar especial já idoso e perto do fim da carreira. Kubrick, então, não ganhou nunca nada para valer. Só efeitos especiais para ‘2001’. Quer vergonha maior? Forman ainda teve seu momento. Há casos piores do que o dele”.

Dirigido justamente por Milos Forman, “Um Estranho no Ninho” se tornou naquela noite o segundo filme a conquistar todas as estatuetas mais importantes – melhor filme, direção, ator (Jack Nicholson), atriz (Louise Fletcher) e roteiro adaptado. Isso só havia acontecido antes com “Aconteceu Naquela Noite”, em 1935, e só se repetiu mais uma vez em 1992, com “O Silêncio dos Inocentes”.

Rubens Ewald Filho garante que havia boas razões para tal feito: “O importante para as pessoas da época é que o filme era fora do estúdio e inovador, ousado, atrevido, e representava a 'nova Hollywood'. Ir tão em cheio na América de então não era fácil... O Donald Trump, mesmo hoje, ficaria puto”.

“Um Estranho no Ninho” conta a história de Randall Patrick McMurphy (Jack Nicholson), que, depois de ser preso, se finge de louco para ser envido para um hospital psiquiátrico e, assim, escapar de trabalhos forçados na prisão. Lá, ele passa a influenciar os outros internos, a entrar em choque com a cruel e sádica enfermeira Mildred Ratched (Louise Fletcher) e estabelece uma verdadeira revolução.

O primeiro sucesso comercial de Steven Spielberg é "Tubarão", de 1975, filme considerado um dos primeiros blockbusters hollywoodianos. A trama transformou o tubarão em uma das criaturas mais temidas do planeta - Divulgação - Divulgação
"Tubarão", de Steven Spielberg, foi o grande injustiçado do Oscar 1976
Imagem: Divulgação

Spielberg injustiçado

“Premiações, o Oscar em especial, não têm nada a ver com justiça. São impulsionados por sentimentos do momento, muitas vezes pessoais. Não sei quais os que motivaram Hollywood a votar daquele jeito, mas não foi nada indigno. Me parece que eram bons filmes. Acho que ‘Barry Lyndon’ e ‘Tubarão’ permanecem mais que ‘Um Estranho no Ninho’, que fica meio empatado com ‘Um Dia de Cão’”, avalia o crítico de cinema Inácio Araújo. Se Stanley Kubrick concorreu, mas foi sumariamente ignorado, o filme dele, “Barry Lyndon”, ficou com as estatuetas de fotografia, direção de arte, trilha sonora adaptada e figurino.

“A grande vergonha do ano foi ignorarem ‘Tubarão’ e, principalmente, Steve Spielberg, que, aliás, durante anos, foi ignorado e sequer indicado para nada muito importante”, garante Rubens Ewald Filho. O longa ganhou em três categorias técnicas – montagem, som e trilha sonora original. Spielberg, que naquele ano sequer concorreu a melhor direção, só ganhou o Oscar de melhor filme por “A Lista de Schindler”, que lhe deu também o prêmio de melhor diretor, assim como, anos depois, aconteceria com “O Resgate do Soldado Ryan”.

Outras curiosidades daquela noite foram a indicação da francesa Isabelle Adjani, então com 20 anos, a melhor atriz por “A História de Adele H”, o que a fez a ser a mais jovem a concorrer na categoria – recorde somente batido em 2004, por Keisha Castle-Hughers, de 13 anos, e, em 2013, por Quvenzhane Wallis, de nove; e do vencedor mais idoso, o coadjuvante George Burns, 80, feito suplantado por Jessica Tandy em 1990, com a mesma idade, e por Christopher Plummer, aos 82 anos, em 2012.

Astros da Disney

Essa edição também foi a primeira a ter a festa transmitida pela rede de televisão ABC – antes esse papel cabia à NBC. Ela fazia parte do conglomerado de Walt Disney, que tratou de colocar como mestre de cerimônias vários nomes ligados aos estúdios, como Walter Matthau, Robert Shaw, George Segal, Goldie Hawn e Gene Kelly.

No Brasil, a Rede Globo cobria a festa que Rubens Ewald Filho realizava na casa dele e o fazia tentar adivinhar os vencedores, com entrevistas antes e depois. “E eu acertava sempre (risos). Por isso me chamaram depois para fazer a cobertura do Oscar no próprio estúdio”, comemora. Ele exerceu a função na emissora durante vários anos e hoje ocupa no canal pago TNT.

Oscar 2017

“Naquele tempo estávamos num momento forte do cinema. Não é que hoje não tenhamos cineastas à altura dos daquela época. Mas em quantidade, pelo menos, não temos mesmo. Hollywood mudou, assim como o público de cinema e o espetáculo. O Oscar de 2017 deve ser como tem sido nos últimos anos, não a busca dos melhores filmes, mas a busca de alguns filmes que, se não fosse pelo Oscar, nem mesmo teriam sido produzidos. É o que chamo de ‘filmes estilo Oscar’”, analisa Inácio Araújo.

Rubens Ewald Filho, ao ser questionado sobre a possibilidade de termos um Oscar tão estrelado quanto o de 1976, tem opinião parecida: “Nem pensar. Este ano, então, tentam lançar gente nova, fazer justiça aos negros e forçar a diversidade. Nisso estão até certos. Só assim mesmo deram um Oscar especial para Jackie Chan”. E acrescenta: “Não se sabe o que vai rolar. Armaram uma festa para celebrar os esquecidos e ao menos parece que estão aparecendo os novos talentos, o que já é bom. Mas será que alguém vai superar ‘La La Land’, que é mais Hollywood e com cara de Oscar?”.

“La La Land - Cantando Emoções” é um musical norte-americano escrito e dirigido por Damien Chazelle, e que conta a história de um pianista de jazz, Sebastian (Ryan Gosling), que chega em Los Angeles, onde conhece a atriz iniciante Mia (Emma Stone), por quem se apaixona. Só que o amor dos dois, em meio à luta para vencer numa cidade tão competitiva, passará por várias provações. O filme estreou nos Estados Unidos em 2 de dezembro e tem estreia prevista no Brasil para 12 de janeiro de 2017.