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Verdadeira estrela de novo "Piratas", Javier Bardem rejeita título de galã

Javier Bardem em cena de "Piratas do Caribe: A Vingança de Salazar" - Divulgação
Javier Bardem em cena de "Piratas do Caribe: A Vingança de Salazar"
Imagem: Divulgação

Eduardo Graça

Colaboração para o UOL, em Los Angeles (EUA)

27/05/2017 04h00

O protagonista Johnny Depp que nos perdoe, mas não é exagero dizer que o melhor de “Piratas do Caribe - A Vingança de Salazar”, o quinto tomo da franquia, já nos cinemas é o ator espanhol Javier Bardem, 48. Bardem vive o capitão Salazar do título, mais morto do que vivo, mas nem por isso menos impactante, e rouba, uma vez mais, a cena.

E não apenas pelo vozeirão e a dramaticidade tão conhecidas dos cinéfilos. É que efeitos especiais e maquiagem escolhida a dedo pelo próprio vencedor do Oscar de melhor ator coadjuvante por “Onde Os Fracos Não Têm Vez” (2007), deram uma senhora enfeiada no marido de dona Penélope Cruz.

"Mas não podia ser diferente, né? Não sei de onde tiraram esta mania de achar que eu sou galã de alguma coisa", diz Javier, que segue: "Bonito é o Brad Pitt, gente. Ou o Al Pacino, que tem uma coisa mais masculina. E não tenho nenhum problema em dizer que às vezes esquecia a fala em 'Piratas' para ficar prestando atenção no rosto perfeito do Johnny (Depp). Parece uma pintura! Aí, sim!", diz.

Javier diz que nos anos pré-Hollywood de sua carreira “tive de fazer meus galãs latinos”, mas “meu rosto é de um ex-jogador de rúgby, de alguém que teve de fazer cirurgias e não exatamente por motivos estéticos”.

"Até fui convidado algumas vezes, como no caso do Woody (Allen) em “Vicky Cristina Barcelona”, para fazer o mocinho pelo qual as mulheres se atraem, mas aí eu preciso de muito mais tempo na sala de maquiagem do que para fazer um personagem como o Salazar (risos)".

2008 - "Vicky Cristina Barcelona" - Divulgação - Divulgação
Penélope Cruz, Javier Bardem e Scarlett Johansson em cena de "Vicky Cristina Barcelona" (2008)
Imagem: Divulgação

Javier gosta de repetir um aforismo que, ele crê, foi cunhado por Meryl Streep. O de que “você e sua carreira são definidos mais pelos nãos que diz do que pelos sins”. Ele recusou, sem (“muito”) medo, várias propostas para repetir papeis mais parecidos com o Juan Antonio do filme de Allen.

"Para seguir repetindo frases de estrelas, meu ídolo maior Marcello Mastroiani dizia que 'se você for um grande ator, conseguirá fazer três personagens em uma longa carreira, e se for um gênio, cinco'. É bem isso, os arquétipos se parecem. Meu desafio é tentar fazer cada vez mais coisas diferentes, fugindo da mesmice, e sim, do latin lover, mas isso está ficando cada vez mais fácil com a chegada ao meio século de vida", brinca o ator.

Oscarizados

Fãs espalhadas pelos quatro cantos do planeta têm, como o próprio Bardem ressalva, todo o direito de discordar da opinião do ator de 1,81 metro, e que chamou a atenção do grande público em 2001, ao ser indicado ao Oscar pela primeira vez, como o escritor cubano Reinaldo Arenas, no trágico “Antes do Anoitecer”.

Na ocasião, o diretor Julian Schnabel afirmou que simplesmente não havia outro ator capaz de encarnar com a intensidade necessária, sem cair na caricatura, o premiado poeta, romancista e dramaturgo homossexual, que sofreu com o preconceito do regime cubano e acabou se suicidando no exílio, em Nova York, três anos após descobrir estar com AIDS, em 1990.

"Aquela interpretação foi impressionante, e nos encontramos nos circuitos de premiação, imediatamente quis saber mais sobre ele, embora já o tivesse notado em 'Jamon Jamon', de Bigas Luna, em 1992, ele ainda muito menino", diz Geoffrey Rush, 65, cujo personagem, em “A Vingança de Salazar”, acaba tendo seu destino ligado ao do de Bardem.

O ator segue: "Javier é um ‘ator de atores', você fica embasbacado com o que ele faz com um personagem, seja em um filme dramático como o de Julian (Schnabel), ou em uma aventura divertida como 'Piratas'. Minha decisão de voltar a fazer o Barbosa foi, em certa medida, resultante de saber que iria contracenar com ele", diz o igualmente oscarizado Rush.

Sozinhas, as cenas dos dois, recheadas de ameaças, tinturas bem mais escuras de terror do que as demais, e duelos de espadas e diálogos afiados, já valem o ingresso.

"Ele não ficava no personagem no set e não sabia que com os efeitos iria ficar ainda mais tenebroso na tela, especialmente as mudanças em seu cabelo, assustadoras, mas já vinha com silicone no rosto e ninguém me avisou da tinta negra que ele soltaria pela boca quando falasse", conta Rush, que segue: "Fora da câmera, em nossa primeira cena, estou limpando o rosto, reclamando o tempo todo e pensando no fedor que vinha dele (risos). Ele tinha de atuar, por causa dos efeitos, com pernas de pau, e eu, com a muleta do Barbosa. Parecíamos dois estranhíssimos caranguejos dançando na frente da câmera".

Javier pensa bastante antes de afirmar que este é o primeiro ser do além que ele faz na vida, um homem do mar preso a uma maldição aparentemente impossível de se quebrar. "Este é o primeiro morto que faço na vida. Mas me sinto ótimo, porque é um defunto da Disney, né? Se fosse um filme mais dramático, mais sério, mais pesado, não sei não. Aí seria mais difícil".

Veja o trailer de "A Vingança de Salazar"

UOL Entretenimento

Penélope

Bardem se casou em 2010 com a musa do diretor espanhol Pedro Almodóvar, Penélope Cruz, 43, com quem tem dois filhos, um menino de seis anos e uma menina de quatro. Os dois, que haviam atuado juntos no início de suas carreiras, no já mencionado “Jamon Jamon”, começaram a namorar sob a batuta de Woody Allen, no set de “Vicky Cristina Barcelona”, em 2008.

Bardem conta que não recebeu, no entanto, dicas piratas da mulher, a Angélica do capítulo anterior da franquia, “Piratas do Caribe - Navegando em Águas Misteriosas”, lançado em 2011.

Penélope - AKM-GSI  - AKM-GSI
Penélope Cruz e Javier Bardem são flagrados trocando beijos
Imagem: AKM-GSI

"Foi bem mais do que isso: fui às filmagens visitar minha mulher em 2010 e observei tudo com muita atenção. Pedi ao (produtor) Jerry (Bruckheimer) na ocasião, assim, meio como quem não quer nada, um papel, se possível, em uma eventual sequência, quem sabe um dia, porque achei tudo muito impressionante. Eis que cinco anos depois recebo uma ligação dele e o Salazar de presente", conta.

Assustador

Bruckheimer diz que simplesmente não haveria a quinta edição da franquia criada a partir da atração homônima da Disneilândia sem Javier Bardem. E que a ideia, desde o início, era fugir dos clichês do 'latin lover' e apostar na capacidade de Javier de “nos arrepiar de medo”.

"Queria trabalhar com um ator que pensasse 24 horas por dia no personagem, exatamente como o Geoffrey (Rush) faz, levando muitíssimo a sério esta nossa brincadeira. Foi do próprio Javier, por exemplo, a ideia de colocar a tinta preta na boca, de que o Geofffey fala. O resultado é que ele ficou ainda mais assustador," diz o produtor.

Os diretores de “A Vingança de Salazar”, os noruegueses Joachim Ronning e Espen Sandberg, cujo “Expedição Kon Tiki” foi indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro em 2013, se impressionaram com a compreensão de Javier de Salazar, um capitão espanhol que acaba sendo fundamental para se entender as origens, finalmente, do próprio Jack Sparrow de Johnny Depp.

"Ele explicou que iria interpretar o Salazar, na primeira parte, como um touro ferido. E na segunda, como um toureiro matador. Ele acaba dando, assim, o tom do filme", diz Sandberg.

Piratas - Divulgação - Divulgação
Javier Bardem na versão não assustadora de seu personagem em "Piratas do Caribe: A Vingança de Salazar"
Imagem: Divulgação

Brasil

Antes da fama, Javier Bardem viveu, na virada dos anos 1990, em Búzios, onde trabalhou em um bar.

"E, no Brasil, tenha certeza, disse muito mais 'sim' do que 'não'. Você não vai viver no Brasil para dizer 'não', e sim 'por favor, siiiiim'", conta, rindo muito, para continuar: "Não vou a Búzios desde 1995 e ouvi histórias de que mudou muito. Quero levar um dia Penélope e os meninos e mostrar tudo para eles. Mas fui abençoado de ir a Fernando de Noronha duas vezes e espero que siga protegido do jeitinho que é. Os dois lugares, o Búzios da minha memória e Fernando de Noranha, são paraísos, mas mais sensacional ainda são as pessoas. Tenho saudade de meu amigo Lizardo, que é um mix de instrutor de mergulho e guia turístico em Búzios, preciso parar de trabalhar e me jogar uns dias lá".

Javier também revela ter saudade de um amigo em comum, o diretor Andrucha Waddington, e sua mulher, a atriz Fernanda Torres.

"E eu trabalhei com a Fernandona em 'Amor nos Tempos do Cólera', que não foi um grande filme, mas me deu a chance de admirá-la de perto, ela fazia minha mãe. E sabe que ela lembra muito a minha mãe de verdade (a também atriz Pilar Bardem, 78)? E que mamãe dublou a personagem dela em “Central do Brasil” em espanhol, sendo que dona Pilar jamais havia dublado antes? Temos esta história em comum, que eu adoro!", conta.

Próximos projetos

Javier já tem três projetos engatilhados para os próximos meses, dois já filmados. São eles os novos filmes de Darren Aronofsky, de “Cisne Negro” (“Mother!”, ainda sem título em português, com lançamento previsto nos cinemas americanos para outubro) e a cine-biografia “Escobar”, dirigida pelo também espanhol Fernando León de Aranoa. Neste último, ele vive o protagonista e contracena com Penélope, com quem também irá dividir a cena na aguardada próxima produção do iraniano Asghar Farhadi, de “O Apartamento”, ainda sem título.

"O primeiro é um thriller psicológico que adorei filmar. O segundo é um olhar diferente do da série do José Padilha, e eu evitei ver o Wagner Moura, que é um senhor ator, para não me influenciar. E sobre o terceiro ainda não posso dar os detalhes, porque está sendo escrito pelo Asghar", diz Javier, que segue: "Foi engraçado porque Penélope recebeu primeiro o convite e pulei de alegria por ela. Que sonho, gente, trabalhar com este homem! Não havia nenhuma dica de que ele iria me convidar também, só sabia que as filmagens seriam na Espanha. Até que um belo dia recebo um telefonema e fui correndo contar pra ela, fazendo a linha, adivinha só o que aconteceu", diz, abrindo um enorme sorriso daqueles de, vá lá, galã de Hollywood.